LITERATURA MEDIEVAL PORTUGUÊS
( Séculos XII a XIV)
Trovadorismo ou LITERATURA PROVENÇAL
Prof. Landisvalth Lima
I - INTRODUÇÃO
1. As invasões bárbaras na Europa
Retrato presumível de D. Isabel de Portugal chamado “Sibyla Persica”. |
A Queda do Império Romano tem
pelo menos uma conseqüência negativa : a Europa torna-se um continente
militarmente desprotegido, ou seja, propício às invasões bárbaras por ele
sofridas a partir de então ( a arquitetura
da época confirma isso).
A difusão da filosofia cristã foi
tão intensa na Europa após a morte de Jesus Cristo que, já no início da Idade
Média, o Cristianismo é a religião oficial do continente europeu; ao contrário
do que aconteceu na Antigüidade, aquele que não é cristão é BÁRBARO e é inimigo
religioso e político dos europeus.
Assim, desde o início da Idade
Média (476-1453), os europeus ocupam-se com a GUERRAS DE RECONQUISTA, expulsão dos povos bárbaros -
principalmente dos MOUROS (muçulmanos,
adoradores de Maomé) que instalam-se em grande número na PENÍNSULA IBÉRICA
(Portugal e Espanha).
Nessa época, a Europa é um conjunto de
REINOS.Por exemplo: no século XI, o território que atualmente faz parte de
Portugal, do Rio Mondego para o Sul, ainda estava ocupado pelos sarracenos, e
desse rio para o Norte havia o reino de Leão. Ainda não existia a nação
portuguesa.
2. A feudal, teocêntrica, convencional e
patriarcal Idade Média
2.1. O Feudalismo
O sistema sócio-econômico-político
predominante na Idade Média chama-se FEUDALISMO.
Com a Queda do Império Romano, como já
citado anteriormente, o continente europeu fica militar e politicamente
propenso às invasões . Para evitar o caos e para facilitar a expulsão dos
invasores bárbaros, a Europa é dividida em reinos e cada reino em grandes lotes de terras ou FEUDOS.
Cada feudo possui um administrador com
plenos poderes: o SENHOR FEUDAL. Assim, no sistema feudal, o poder do rei é
descentralizado para os feudos, para os senhores feudais.
A atividade econômica principal na
Europa medieval é a AGRICULTURA: o senhor feudal ARRENDA as terras do feudo aos
agricultores - seus SERVOS ou VASSALOS - que pagam o arrendamento com produtos nela cultivados e colhidos; quase
toda a produção agrícola, assim, é de propriedade do senhor feudal, ficando
apenas uma pequena parte dessa produção ao servo ( o suficiente para sua
subsistência e da sua família ). O
senhor feudal, por sua vez, "presta contas" ao rei de "tudo"
que diz respeito ao feudo que administra, além de ser seu cavaleiro, seu companheiro e defensor nas
guerras: ele é vassalo do rei.
Além dos servos, os feudos contam ainda
com os cavaleiros do senhor feudal e com os artesãos, aqueles que elaboram
manualmente as roupas, os calçados, os
utensílios e todos os objetos consumidos pela sociedade.
No sistema feudal, as mercadorias são
TROCADAS entre si, conforme o valor de uso (a necessidade dos envolvidos na
troca), ou seja, o valor material das mercadorias praticamente fica em segundo
plano ou, às vezes, nem é levado em conta.
Além das classes sociais já citadas (
servos/ artesãos/ cavaleiros/ senhores feudais e outros nobres/ reis) a
sociedade feudal tem uma outra - a mais poderosa das classes - que é o CLERO.
No próximo item veremos de onde vem todo o poder do clero medieval.
2.2. O TEOCENTRISMO
O Cristianismo, como vimos, é a religião
oficial da Europa na Idade Média, tanto que aquele que não é cristão é inimigo
político e religioso. A religião, assim, é algo de extrema importância para o
homem medieval: agradar e obedecer a Deus é seu objetivo de vida, ou seja, Deus
é o centro da vida humana nessa época. O TEOCENTRISMO, portanto , é um dos
traços essenciais da cultura medieval.
A instituição social que se diz "porta-voz de Deus na
Terra" é a IGREJA CATÓLICA; assim,
aquele que deseja servir plenamente a Deus (não importa a que classe social
pertença), deve ficar atento ao que prega a Igreja e seguir fielmente os seus preceitos: o que é
pecado, o que é virtude, como se caracteriza o verdadeiro cristão, etc... Com
tal ideologia, plenamente aceita por todas as classes sociais, o poder
"divino" da Igreja determina o modo de vida, os valores mais
importantes, a maneira de ser de toda a sociedade: o CLERO é, por isso, a classe
dominante - a mais poderosa economica-política-socialmente
falando, dentro da sociedade medieval.
Não é à toa que quando nos reportamos à
Idade Média, as imagens que imediatamente ocupam nossa mente são, além dos
castelos: os mosteiros, os religiosos, a Inquisição...
2.3. O CONVENCIONALISMO
A sociedade medieval é convencional, ou
seja, nela as pessoas se tratam com extremo respeito e formalidade, mesmo as
mais íntimas ou as mais zangadas. É por isso que nessa época é muito comum, no
dia a dia de todas as classes sociais, o uso de palavras e expressões de
tratamento como : vós, vos, vosso(a)(s), senhor, senhora, dom/dona (para
reis/rainhas/nobres em geral), amigo (namorado), etc, e os verbos na 2a. pessoa
do plural. O tratamento cortês
(convencionalismo social) é outro traço da cultura medieval.
2.4. O PATRIARCALISMO
A sociedade medieval é patriarcal: a
mulher leva uma vida segregada, não tem qualquer participação social e depende
totalmente do homem. Trancada e vigiada em casa - primeiro pelo pai, depois
pelo marido - a mulher é educada para ser mãe e esposa, ocupando-se dos
afazeres domésticos, de trabalhos manuais como tecer, bordar, costurar, etc.
Raramente a mulher tem alguma instrução.
Todos esses traços da cultura medieval
aparecem marcados (presentes) na obra literária européia, da qual a
Literatura Portuguesa é nosso exemplo e
objeto de estudo. A Literatura
Portuguesa surge no século XII, simultaneamente ao surgimento de Portugal como
nação.
II - COMO SE FORMOU A NAÇÃO
PORTUGUESA
O século XII é o de luta mais intensa
entre cristãos e mouros, que vão cedendo terreno pouco a pouco ante a vigorosa
ofensiva dos leoneses. Afonso VI é o rei de Leão e chega para reforçar a luta
contra os mouros o nobre francês Henrique de Borgonha. Tal foi sua contribuição
que o rei lhe deu a mão da filha - Dona Teresa - em casamento e o governo de um
dos seus melhores condados: o de Porto-Cale; pouco tempo depois, o Conde
Henrique anexa ao seu domínio o condado de Coimbra e tem um herdeiro: o futuro
rei Dom Afonso Henriques.
Em 1114, Henrique de Borgonha morre e sua
viúva assume o governo como regente, pois Afonso Henriques tem apenas 3 anos.
Ao completar 18 anos, D. Afonso Henriques assume o governo e entra em guerra
contra os mouros e contra o então rei de Leão - Afonso VII - sagrando-se sempre
vencedor; aos Condados de Porto Cale e Coimbra é anexado todo o reino de
Leão: todo esse território forma a nação
portuguesa, cujo fundador, D. Afonso Henriques, é reconhecido como seu rei
inclusive pelo derrotado e ex-rei de Leão - Afonso VII.
Como resultado de suas vitórias sobre os
mouros que ocupavam muitas cidades portuguesas, D. Afonso Henriques recebe a
alcunha de "o Conquistador". A expulsão dos mouros também torna-se
preocupação dos reis portugueses que sucedem D. Afonso Henriques, como: D.
Sancho I, D. Afonso II, D. Sancho II, D. Afonso
III , D. Dinis ( o REI-TROVADOR), etc.
III- A LITERATURA MEDIEVAL PORTUGUESA :
As CANTIGAS
1. Denominações e origem da Literatura
Medieval Portuguesa
A Literatura Portuguesa surge no século
XII: na Idade Média, portanto. Tudo que vimos até aqui a respeito da Idade
Média vale para Portugal: o que ocorre na sociedade, na Arte e na Literatura
portuguesas é exemplo do que ocorre em toda a Europa.
As primeiras obras literárias portuguesas
são elaboradas em versos: são poemas. Como ainda não há imprensa nessa época,
os poemas medievais são orais e com acompanhamento musical, recebendo, por
isso, o nome de CANTIGAS ou TROVAS.
As cantigas são divulgadas nas ruas, nas praças, nas festas, nos
palácios; para facilitar sua memorização e divulgação, as cantigas são
elaboradas com versos curtos que não seguem necessariamente as normas da
Versificação e que se repetem pelo poema; além disso, a linguagem das cantiga é
extremamente fácil, pois, a língua falada em Portugal é o GALEGO-PORTUGUÊS, uma
língua simples e ingênua.
A primeira obra literária
portuguesa de que se tem notícia data de 1189: a cantiga "A RIBEIRINHA",
de autoria de Paio Soares de Taveirós, uma cantiga de amor em homenagem a Maria
Paes Ribeiro; como os poetas não podiam revelar o nome das suas amadas nas
cantigas de amor e como a homenageada era casada, o autor dessa cantiga se
inspirou no sobrenome da amada para nomear sua obra.
Cantiga da Ribeirinha
No mundo non me sei parelha,
mentre me for' como me vai,
ca ja moiro por vós - e ai!
mia senhor branca e vermelha,
Queredes que vos retraia
quando vos eu vi em saia!
Mao dia me levantei,
que vos enton non vi fea!
E, mia senhor, des aquel di', ai!
me foi a mi muin mal,
e vós, filha de don Paai
Moniz, e ben vos semelha
d'haver eu por vós guarvaia,
pois eu, mia senhor, d'alfaia
Nunca de vós ouve nem ei
valía d'ũa correa. (Paio
Soares de Taveirós)
Tradução:
No mundo ninguém se assemelha a mim
enquanto a vida continuar como vai,
porque morro por vós, e ai!
minha senhora alva de pele rosadas,
quereis que vos retrate
quando eu vos vi sem manto.
Maldito dia que me levantei
E não vos vi feia
E minha senhora, desde aquele dia, ai!
tudo me foi muito mal
e vós, filha de Don Paio
Moniz, e bem vos parece
de ter eu por vós guarvaia
pois eu, minha senhora, como presente
Nunca de vós recebera algo
Mesmo que de ínfimo valor.
É das palavras TROVA e TROVADOR (
poeta nobre que faz trovas) que deriva o nome mais comum que se dá a toda
Literatura Portuguesa elaborada na Idade Média: TROVADORISMO.
As primeiras cantigas ou trovas medievais
portuguesas são inspiradas nas cantigas que há muito tempo já eram feitas em
Provença, no sul da França; por isso, a Literatura Medieval Portuguesa também é
chamada de LITERATURA PROVENÇAL.
Apesar de oito séculos terem se
passado, as cantigas continuam existindo: basta ligarmos o rádio e ouviremos
POEMAS ORAIS (cantados) ACOMPANHADOS DE MÚSICA...
2. Tipos de cantigas
2.1. CANTIGA DE AMOR: o eu-lírico é
masculino; o conteúdo dessas cantigas
consiste numa declaração de amor a uma mulher. Nessa declaração:
- o homem revela seu amor
platônico, pois tal amor não pode ser correspondido pela amada, já que ela é
casada, ou mais rica que ele, etc, ou seja, existe pelo menos um obstáculo
impossível de ser superado para que o amor entre ambos se concretize;
- diante da impossibilidade de
que seu amor seja correspondido pela amada, o eu-lírico diz se contentar pelo
menos em ver a amada e, caso nem isso seja possível, ele prefere morrer;
- a amada é sempre idealizada,
divinizada e cultuada;
- a amada é tratada pelo pronome
SENHORA. Para compensar a mulher das desvantagens por ela sofridas na sociedade
patriarcal, no relacionamento amoroso o homem finge-se inferior a ela e, numa
atitude de VASSALAGEM, passa a tratá-la com a mesma cortesia, respeito e submissão com que trata seu senhor feudal nas relações sociais ( no seu dia a dia): em
suma, no relacionamento amoroso, a mulher aparece como SUPERIOR ao homem. Há
alguns estudiosos que levantam a possibilidade de que o homem trata a mulher
por SENHORA, no relacionamento amoroso,
visto que ela adquire um caráter divino e é cultuada por ele como se
cultua uma deusa, uma santa ( como se ela fosse Nossa SENHORA, mãe de Jesus);
de qualquer forma, essas duas possibilidades mostram que o homem transfere para
o relacionamento amoroso as práticas mais importantes de seu dia a dia: a de
vassalagem e a de religiosidade extrema;
- o nome da amada não é revelado;
As cantigas de amor, portanto,
apresentam um conteúdo que expressa
tristeza, solidão, amor platônico, desejos não realizados, etc, ou seja,
possui "tom" triste: pertencem ao GÊNERO LÍRICO e , pelo conteúdo melancólico, são ELEGIAS.
Exemplo de cantiga de amor (de
Bernal de Bonaval):
"A dona que eu am'e tenho por Senhor
amostrade-me-a Deus, se vos en prazer for,
se non dade-me-a morte.
A que tenh'eu por lume d'estes olhos meus
e porque choran sempr(e) amostrade-me-a Deus,
se non dade-me-a morte.
Essa que Vós fezestes melhor parecer
de quantas sei, a Deus, fazede-me-a veer,
se non dade-me-a morte.
A Deus, que me-a fizestes mais amar,
mostrade-me-a algo possa con ela falar,
se non dade-me-a morte."
2.2.
CANTIGA DE AMIGO : o eu-lírico é feminino. Consiste num desabafo da
mulher acerca da vida (terrível) que leva numa sociedade patriarcal e/ou na
declaração de amor pelo seu amigo (seu namorado) e da saudade e do ciúme que
sente dele, já que lhes falta liberdade para seus encontros. Tal desabafo normalmente é
dirigido a outra mulher ( sua mãe, irmã, amiga, etc, que a entende, pois passa
pelos mesmos dissabores), a Deus ou a algum elemento da natureza ( mar,
árvores, céu, etc).
Assim como as cantigas de amor, as cantigas de amigo
também possuem conteúdo melancólico: são do Gênero Lírico - elegias.
A informação mais curiosa que se tem a
respeito das cantigas de amigo, porém, é a de que elas são elaboradas por
homens . Ao que parece, eles penetram e entendem a alma feminina tanto quanto
ou, às vezes, até mais que certas
mulheres.
Exemplo de cantiga de amigo (de
D. Dinis – o Rei Trovador)
"Ai flores, ai flores do verde pino,
se sabedes novas do meu amigo!
ai Deus, e u é?
Ai flores, ai flores do verde ramo,
se sabedes novas do meu amado!
ai Deus, e u é?
Se sabedes novas do meu amigo,
aquel que mentiu do que pôs comigo!
ai Deus, e u é?
Se sabedes novas do meu amado,
aquel que mentiu do que mi há jurado!
ai Deus, e u é?"
Obs.
e u é? (onde ele está?)
2.3. CANTIGA DE ESCÁRNIO: é uma sátira
que critica indiretamente o sistema ou alguém ; a crítica irônica é tão bem
elaborada que, por parecer um elogio, tal tipo de cantiga é a preferida dos senhores feudais.
Exemplo de cantiga de escárnio
(de Joan Garcia de Guilhade)
"Ai dona fea! Foste-vos queixar
Que vos nunca louv'en meu trobar
Mais ora quero fazer un cantar
En que vos loarei toda via;
E vedes como vos quero loar:
Dona fea, velha e sandia!
Ai dona fea! Se Deus mi pardon!
E pois havedes tan gran coraçon
Que vos eu loe en esta razon,
Vos quero já loar toda via;
E vedes qual será a loaçon:
Dona fea, velha e sandia!
Dona fea, nunca vos eu loei
En meu trobar, pero muito trobei;
Mais ora já en bom cantar farei
En que vos loarei toda via;
E direi-vos como vos loarei:
Dona fea, velha e sandia!"
2.4. CANTIGA DE MALDIZER: é uma sátira
que critica direta e violentamente o sistema
ou alguém: as corrupções, os roubos, os adultérios, as explorações , etc
, e seus envolvidos são citados nominalmente.
Os: alguns autores consideram a sátira como
uma modalidade do Gênero Lírico; outros, como um Gênero à parte (Gênero
Satírico).
Exemplo de cantiga de maldizer
(de Afonso Eanes de Coton)
Marinha, o teu folgar
tenho eu por desacertado,
e ando maravilhado
de te não ver rebentar;
pois tapo com esta minha
boca, a tua boca, Marinha;
e com este nariz meu,
tapo eu, Marinha, o teu;
com as mãos tapo as orelhas,
os olhos e as sobrancelhas,
tapo-te ao primeiro sono;
com a minha piça o teu cono;
e como o não faz nenhum,
com os colhões te tapo o .
E não rebentas, Marinha?
São trovadores
desta época:
Afonso Sanches
Aires Corpancho
Aires Nunes
Bernardo Bonaval
Dom Dinis I de
Portugal
D. Pedro, Conde
de Barcelos
João Garcia de
Guilhade
João Soares de
Paiva ou João Soares de Pávia
João Zorro
Paio Gomes
Charinho
Paio Soares de
Taveirós (Cantiga da Garvaia)
Meendinho
Martim Codax
Nuno Fernandes
Torneol
Guilherme IX,
Duque da Aquitânia
Pedro III de
Aragão
3. Os "Cancioneiros"
CANCIONEIROS são "arquivos"
onde são encontradas algumas das cantigas medievais portuguesas (as que foram
compiladas e guardadas). Conhecem-se 3 Cancioneiros de poemas em
galego-português:
3.1."CANCIONEIRO DA AJUDA",
encontrado no Convento da Ajuda, é o mais antigo dos Cancioneiros;
provavelmente copiado em fins do séc. XIII, possui 310 cantigas, sendo que 304
delas são cantigas de amor. É
considerado o mais incompleto dos 3 Cancioneiros, pois não contém os poemas do
rei-trovador D. Dinis, mas é um documento valioso, pela grafia e partituras originais.
3.2. "CANCIONEIRO DA BIBLIOTECA
NACIONAL DE LISBOA" ou "CANCIONEIRO COLOCCI-
BRANCUTI" , é o mais completo dos Cancioneiros galego-portugueses: possui
1647 cantigas de todos os tipos; encontrado primeiramente na biblioteca do
Conde italiano Brancuti, no século XVI o Cancioneiro passou a pertencer ao
humanista italiano Angelo Colocci ; em
1880, o Cancioneiro foi vendido à Biblioteca Nacional de Lisboa, onde se
encontra até hoje.
3.3. "CANCIONEIRO DA
VATICANA". Pesquisando a biblioteca papal, Fernando Wolf descobriu esse
Cancioneiro de 1205 cantigas, dentre elas as de D. Dinis , que aparecem também
no "Cancioneiro da Biblioteca Nacional de Lisboa".
Graças à existência desses Cancioneiros
que temos hoje exemplos de cantigas medievais portuguesas, mesmo que a maioria
delas sejam de autoria de poetas nobres e que as mais populares (e, por isso,
bem interessantes) perderam-se no tempo.
4. Pessoas envolvidas na
elaboração/apresentação das cantigas portuguesas
Há denominações diferentes para o poeta
nobre e para o poeta plebeu:
. Poeta nobre: é o TROVADOR / .
Poeta plebeu: é o JOGRAL
Caso o poeta não tenha conhecimentos
musicais para o acompanhamento do poema,
ele pede a colaboração de alguém que é apenas COMPOSITOR: o MENESTREL. O poeta
também deve ter boa voz para apresentação da cantiga, já que ela é um poema
ORAL; mas caso o poeta não possui tais dotes fônicos, ele pede a colaboração de
um CANTOR: o SEGREL.
5. Características gerais da Literatura
Medieval Portuguesa:
5.1.
SUBJETIVIDADE: a poesia medieval portuguesa é lírica, predominando a função
emotiva da linguagem, ou seja, seu conteúdo expressa as emoções, os
sentimentos, a visão de mundo do emissor (do eu-lírico), marcadas no texto
através de palavras na 1a. pessoa (verbos, pronomes), das interjeições, das
exclamações;
5.2. TEOCENTRISMO: o eu-lírico expressa
sua religiosidade extrema através da palavra Deus - sempre presente nas
cantigas- dos nomes de santos, de elementos do Cristianismo, festas e lugares
santos, etc.
5.3.
CONVENCIONALISMO: todo o convencionalismo social está marcado nas cantigas
medievais através da presença de pronomes e verbos na 2a. pessoa do plural e
dos pronomes de tratamento : senhora, dom, dona, amigo, etc.
5.4. SUPERIORIDADE FEMININA NO AMOR: como
já foi visto, nas cantigas de amor (às vezes até em outras), ao declarar-se à
amada, o homem finge-se inferior, submisso a ela (VASSALAGEM): ela é cultuada
como um ser superior, divino, ao contrário do que acontece na realidade;
5.5. PATRIARCALISMO: marcado nas cantigas
medievais através do desabafo que o eu-lírico feminino faz nas cantigas de amigo
a outra mulher, à natureza ou a Deus.
Como se pode notar, as cantigas medievais
portuguesas contém marcas do tipo de cultura, do momento em que elas foram
elaboradas: elas são, portanto, verdadeiros documentos de época (documentos
históricos).
IV- A PROSA MEDIEVAL PORTUGUESA
A obra medieval em prosa é composta por NARRATIVAS de 4 tipos:
1. CRONICÕES (Crônicas Historiográficas):
narrativas de fatos históricos importantes colocados em ordem cronológica,
entremeados de fatos fictícios;
2. HAGIOGRAFIAS: narrativas que contam a vida
de santos (biografias) ;
3. NOBILIÁRIOS: ou livros de linhagens, são
relatórios a respeito da vida de um nobre: sua árvore genealógica
(antepassados), relação das riquezas e dos títulos de nobreza que possui, etc;
4.
NOVELAS DE CAVALARIA: narrativas literárias em capítulos que contam os grandes
feitos de um herói (acompanhado de seus cavaleiros), entremeados de célebres
histórias de amor. Tais histórias de amor não são melancólicas e platônicas
como o que aparece nas cantigas: o herói cultua a amada, mas não se contenta
apenas em vê-la; ele quer e é correspondido pela amada, que por ser casada (ou
religiosa: "casada com Cristo"), torna-se adúltera para concretizar o
seu amor; os obstáculos incentivam o herói na fase de conquista (o que é
proibido é mais gostoso), ao invés de torná-lo impotente como acontece nas
cantigas; a esse amor físico, adúltero, presente nas novelas e xácaras
medievais, dá-se o nome de AMOR CORTÊS, em que o casal central não tem final
feliz e é severamente punido pelo pecado cometido. Nesses episódios eróticos
são revelados até relacionamentos homossexuais (rei Artur e Lancelot, rei
Ricardo Coração de Leão...)
Amadis de Gaula é uma obra marcante do ciclo de novelas de
cavalaria da Península Ibérica do século XVI. Apesar de se saber que a obra
existe desde, pelo menos, o século XIV, a versão definitiva mais antiga,
actualmente conhecida, é a de Garci Rodríguez de Montalvo, impressa em língua
castelhana em 1508 e denominada Los quatro libros de Amadís de Gaula. Tudo
indica, contudo que a versão original era portuguesa, e muito anterior. O
próprio Montalvo reconhece ter emendado os três primeiros livros e ser apenas
autor do quarto.
A versão original de Amadis de Gaula tem sido atribuída a vários
autores portugueses. A crónica de Gomes Eanes de Azurara, escrita em 1454
menciona como seu autor um tal de Vasco de Lobeira, que tinha sido armado
cavaleiro na batalha de Aljubarrota. No entanto, outras fontes indicam que o
autor foi sim João de Lobeira e não o anterior.
Seja como for, a única versão completa é a de Montalvo, que constituiu
um enorme êxito em toda a Europa, sendo traduzida para as principais línguas da
Europa ocidental, além dos originais castelhano e português. Vários autores, de
vários países, escreveram sequelas de Amadis, inclusive o próprio Montalvo, com
o quinto livro do ciclo, Las sergas de Esplandián. Em Portugal foram escritos
vários romances do tipo de Amadis, sendo o mais famoso Palmeirim de Inglaterra
de Francisco de Morais.
5. HISTÓRIAS DE TRANCOSO – Ainda
sem um estudo mais detalhado, não se sabe o tempo certo do surgimento. Sabe-se
que eram histórias exageradamente fantasiosas.
Os heróis medievais não têm a força física
exagerada dos heróis da Antiguidade, mas são sempre jovens, belos e elegantes.
Suas amadas são sempre "as mais belas do reino". A maioria das
novelas de cavalaria portuguesas são traduções ou adaptações de novelas
francesas ou inglesas. Dependendo de quem é o herói principal da novela, ela
faz parte de um dos seguintes CICLOS:
a) CICLO GRECO-ROMANO OU
CLÁSSICO: conjunto de novelas de cavalaria que narram as façanhas de heróis da antiguidade;
b) CICLO CAROLÍNGEO OU FRANCÊS:
novelas cujo herói é Carlos Magno;
c) CICLO ARTURIANO OU BRETÃO: as
novelas deste ciclo são as mais famosas, adaptadas e traduzidas; o herói dessas
novelas é o Rei Artur, sempre acompanhado de seus célebres cavaleiros da távola
redonda.
Essa "MATÉRIA DA
BRETANHA" é uma das fontes que dão origem às novelas de cavalaria
portuguesas: tanto que as novelas portuguesas mais importantes pertencem ao
Ciclo Arturiano ou Bretão, como "José de Arimatéia", "História
de Merlin", etc. As novelas mais
marcantes porém são:
a)"A DEMANDA DO SANTO
GRAAL" : narra a busca do cálice sagrado pelo rei Artur e os cavaleiros da
távola redonda;
b)"AMADIS DE GAULA", de
autoria de Vasco ou João da Lobeira.
As novelas de cavalaria
portuguesas também são inspiradas nas CANÇÕES DE GESTA francesas (cantigas que homenageavam os
heróis e seus feitos). A prosa medieval portuguesa, como se pode concluir, é
predominantemente do GÊNERO ÉPICO.
A Literatura Medieval Portuguesa expressa a
simplicidade, a ingenuidade e a passividade do homem medieval e contém marcas do contexto em que foi
produzida. Completamente dominado pelo medo do pecado e com o objetivo de
agradar sempre a Deus, o homem medieval
ainda consegue fazer uma literatura que em determinados momentos rompe com esse domínio: é o caso das
novelas de cavalaria, dos romances ou xácaras.
O segundo período medieval vai mostrar que esse "rompimento"
vai aumentando com o passar do tempo,
até que o homem consegue sair das TREVAS MEDIEVAIS definitivamente.
(Informações básicas do portal http://rosabe.sites.uol.com.br)