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terça-feira, 27 de novembro de 2012

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

¨¨¨Landisvalth Blog: O veneno letal

¨¨¨Landisvalth Blog: O veneno letal:                             Landisvalth Lima Todos nós sabemos que a qualidade dos nossos políticos não é nada boa. E só enumerar as ...

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

O Boca do inferno


                                 Romance de Ana Miranda

       Resumo analítico: Professor Landisvalth Lima

A cidade

Gregório de Matos
Descrição da cidade de Salvador no século XVII. Gregório de Matos lamenta a condição da cidade e pensa em Gôngora, poeta espanhol de sua preferência. Por que havia retornado? Via passar diante dos olhos uma cidade tomada por pessoas de todas as espécies. Muitos chegavam pobres e enricavam. Todos furtavam. Logo cedo, o Governador Antônio de Sousa Menezes, o Braço de Prata, vai se confessar aos Jesuítas, ao Padre Antônio Vieira. Nem tudo pode ser revelado. Por exemplo, os 24 anos recolhidos na quinta, em Olivas. Após ser reverenciado na igreja e nas ruas, O Braço de Prata chega à repartição para despachos.

O crime

Francisco Teles de Menezes, Alcaide-mor, levanta-se cedo e vai, acompanhado por escravos desarmados, para a casa da barregã Cipriana. Depois dali vai ao encontro do governador e sabe que haverá problemas. Uma carta revela uma trama contra o seu amigo, o Braço de Prata. Lá fora, há inimigos à espreita. Antonio Brito, encapuzado, lidera uma conspiração e atenta contra a vida de Teles de Menezes. Depois foram refugiar-se no Colégio dos Jesuítas. A notícia chega ao governador pelas palavras do arcebispo João da Madre de Deus. O governador jura vingança.
Maria Berco, dama de companhia de Bernadina Ravasco, filha de Bernardo Ravasco, leva a notícia de que Gonçalo Ravasco, irmão, é acusado como um dos conspiradores contra s vida de Francisco Teles. Gonçalo também está refugiado no Colégio dos Jesuítas. Bernardo Ravasco era irmão de Padre Antonio Vieira e Secretário de Estado. Ao saber do atentado ao alcaide, refugia-se na quinta dos padres e manda a filha e Maria Berco para o Recôncavo. No Colégio dos Jesuítas, Gonçalo, o pai, Gregório de Matos, Antonio Brito, João de Couros e o vereador Luiz Bonicho analisam os prós e contras da empreitada. Todos decidem pela entrega das armas e Bernardo Ravasco entrega a mão do alcaide para Maria Berco dar um fim. Depois, Bernardo foi ao encontro do irmão Antonio Vieira.
Enquanto isso, o governador comandava buscas na tentativa de encontrar culpados. Quem tinha alguma ligação com os Ravascos tinha sua casa invadida. Muitos fugiam. Ninguém sabia de nada. Ninguém viu nada. Os sinos anunciavam a morte do alcaide. Depois de missas e orações, o governador se encontra com o desembargador Palma e diz que vai invadir o Colégio dos jesuítas e prender os Ravascos, principalmente o cabeça: Padre Antonio Vieira. Palma acha a empreitada arriscada. Era o dia 5 de junho de 1683.
Maria Berco tenta livrar-se da mão do alcaide. Joga-a no lixo, mas acha desumano e pede a um marinheiro para dar uma volta de barco. Desconfiado, o marinheiro descobre a mão e rouba o anel. A mão é jogada no mar. No retorno á praia, são interpelados por soldados. Maria, que guarda o anel entregue pelo marinheiro, é presa como prostituta. No palácio da Secretaria, o governador prende Bernardo Ravasco como assassino do alcaide, mesmo sem provas. Vieira protesta e é também ameaçado de prisão. Dali, Vieira segue com o padre Soares para a quinta dos padres.
Maria Berco penhorou a anel do alcaide e recuperou a moeda que perdeu para os soldados. Comprou algumas coisas e foi ver João Berco, o marido. Luiz Bonicho e Donato Serotino, mestre de esgrima, temem O Braço de Prata e tramam contra sua morte. Após as aulas de esgrima, Donato Serotino ataca Antonio Souza e foge.
Gregório de Matos, com medo da prisão, saiu de casa e vagou pela cidade. Foi parar no dique. Lá pensou em Anica de Melo, prostituta e amante. A ela relatou sua vida, principalmente sua estada em Portugal. O poeta seguiu para a residência de Bernadina Ravasco. Ele a levaria para o Recôncavo. Ao saber da prisão do pai, cancelou a viagem. Maria Berco ficou encantada com o poeta.
Gregório se encontra com Gonçalo e Serotino. Fala ao irmão o encontro com Bernardina e sua recusa de ir ao Recôncavo. Mata lê para o Governador as sátiras de Gregório contra ele. No prostíbulo de Anica, Gregório entrega a Gonçalo ravasco as credenciais para entrar no palácio do governador e recuperar os escritos do pai.
Antonio Souza resolve invadir o Colégio dos jesuítas e prende Antonio Brito, João de Couros, Francisco Dias do Amaral, Barros de França, Antonio Rolim, vários jesuítas e estudantes. Também foram presos os capitães de presídio Diogo de Souza, o Torto, e José Sanches Del Poços. Gonçalo Ravasco escapou. Estavam no meio da multidão e assistiram à prisão dos companheiros.  
Gonçalo ravasco conseguiu adentrar no palácio do governo. Esteve a passos de matar, se quisesse, Antonio Souza. O objetivo maior era recuperar os escritos do pai. A empreitada foi um sucesso. Depois, Gonçalo se encontra com Gregório para irem ao palácio do arcebispado. No trajeto, o poeta descobre o marido cego de Maria Berco e surpreende o amigo com revelações picantes.
Gregório de Matos e Gonçalo Ravasco foram encontrar-se com o arcebispo João da Madre Deus. Lá, Gregório relatou o caos em que estava a Bahia e pediu providências. Cobrou ainda um comportamento mais discreto do arcebispo nas visitas ao palácio. Irritado, o arcebispo se retirou. No caminho de volta, relatou seus casos amorosos a Gonçalo. Já com Anica, confessou uma atração por uma moça: Maria Berco.

A vingança

Antonio Brito é torturado na cela dos tormentos e jogado na enxovia com João de Couros, Diogo de Souza e outros. Durante tortura, dá o nome de sete dos oitos encapuzados do crime do alcaide: Ele, Luiz Bonicho (vereador), Donato Serotino (mestre de esgrima), João de Couros, Diogo de Souza (o Torto), Manuel Dias (escrivão) e Moura Rolim (primo de Gregório de Matos). Antonio Teles, o novo alcaide, leva os nomes ao Braço de Prata. A suspeita do oitavo nome cai sobre Gonçalo Ravasco. O alcaide-mor quer vingar-se e deseja fazer uma carnificina. Antonio Souza não quer mortes, mas manda fazer prisões, ordena torturas e devassas. Gonçalo Ravasco, Maria Berco e Gregório de Matos estão na lista.
Antonio Teles visita Bernardo Ravasco na enxovia e mostra-se vingativo. Bernardina é chamada no palácio. O governador faz a proposta de soltar Bernardo Ravasco se ela dissesse onde estava o irmão. Bernadina procura Vieira e fala da proposta. Vieira sabe que o governador quer prender os dois e pede a Luiz Bonicho para, em Portugal, entregar cartas aos poderosos. Também escreve uma carta ao judeu Roque da Costa Barreto, ex-governador do Brasil, relatando os fatos e pedindo ajuda. Vieira pede ainda ao padre José Soares avisar a Gregório sobre as intenções do governador. Gonçalo deveria ser avisado.
O Blasfemo havia sido solto. Era colega de enxovia de Bernardo Ravasco. Ao sair de lá foi visitar Luiz Bonicho e Serotino. Disse-lhes que estavam ameaçados de prisão. Maria Berco maltratava o seu corpo com um chicote. Pensava em Gregório e no anel que roubou. Os soldados do governador invadiram  o quarto de Gregório e assustou Anica de Melo. Gregório, depois de ver a destruição que fizeram em seu quarto, amou uma negra novata do prostíbulo. Depois, leu poesias para ela.
Bernardina Ravasco pede a Maria Berco para procurar Gonçalo Ravasco e propor que ele se entregasse para liberar o pai. Maria berco não o encontra e vai à procura de Gregório de Matos. Contrário à troca, Gregório promete encontrar Gonçalo e pedir-lhe que fale com Bernardina. O poeta conversa com Gonçalo e o aconselha a não aceitar a proposta do governador. Para ele, Vieira é o principal alvo do Braço de Prata. Em sua casa, Maria Berco é levada presa na frente do marido.
Padre Vieira vai à procura de Samuel da Fonseca. Lá o rabino lembra os préstimos do padre jesuíta ao povo judeu. Vieira pede-lhe ajuda e Samuel promete fazer o possível para o processo da morte do alcaide sair das mãos de Palma e ir para as do desembargador João da Rocha Pita, que apuraria o crime com isenção. O rabino diz ainda que seria uma boa ajuda para a destituição do Braço de Prata. Gregório de Matos está com Anica de Melo. Ele faz um relato de sua vida e pergunta a Gregório sobre por que o chamam de “o judeu brasileiro”. Gregório faz uma retrospectiva do apoio de Vieira ao comércio internacional, que beneficiava os judeus, sua coragem ao enfrentar a Inquisição, suas missões secretas e diplomáticas, sua luta para livrar os índios da escravidão, sua prisão em Lisboa e os encontros que teve com o padre quando estava em Portugal.
Luiz Bonicho se prepara para ir á Europa. Vendeu todos os seus bens e agora sonha com um tempo em Lisboa e outro em Paris. Serotino chega disfarçado e Bonicho comunica-lhe a morte de Blasfemo. O corpo foi encontrado no Rio Vermelho. Fora executado. Enquanto isso, Vieira relembra, na quinta do Tanque, os tempos na corte. Bernardina Ravasco pede a Gregório um bom advogado para defender Maria Berco. Ele promete providenciar. Quando Gregório de matos se ausenta da casa dos ravascos, Bernadina e presa e jogada na enxovia onde estavam mulheres e familiares de outros presos.
Enquanto Vieira anda pela cidade refletindo sobre seus opositores e seguidores, Samuel da Fonseca faz sua parte. No palácio, o governador recebe os desembargadores Palma e Góis, acompanhados do alcaide Teles. Fica sabendo da suspeição de Palma. Vieira obtinha sua primeira vitória e o governador manda segui-lo. Antonio Teles pede ao governador para agir por conta própria. Quer fazer tudo ao seu modo e assumiria as responsabilidades. O Braço de Prata aceita. Vieira consegue visitar Bernardo Ravasco na enxovia. O padre mente ao irmão sobre a sobrinha. Disse que ele estava num engenho. Falou-lhe sobre o processo, as suspeição do Palma e a nomeação do Rocha Pita para o caso. Bernardo ficou esperançoso e falou a Vieira sobre a prisão de Maria Berco. Vieira contou-lhe sobre o roubo do anel. O Alcaide e o Gordo tentavam ouvir a conversa dos irmãos e se escondem quando o padre sai. O escrivão Manoel Dias vai ao encontro da amante, a negra Ursula do Congo. Confessa que não tem dinheiro para ir a Portugal. Padre Vieira vai providenciar tudo. Percebe que há policias por perto e pede a Ursula que não o denunciasse se fosse presa. Enquanto isso, Padre Vieira fazia visitas e era seguido pelo Gordo. Luiz Bonicho e Donato Serotino confabulam. Luiz está com cartas de Vieira para levar a autoridades em Lisboa e teme que o acusador passe a acusado.
Ana Miranda
Gregório de Matos vê a cidade da Bahia, cenário de seus versos satíricos e vai ao encontro de Samuel da Fonseca. Entrega-lhe os manuscritos de Bernardo Ravasco. Pede para seja levado para a Holanda e publicado. Samuel oferece também os seus préstimos para publicar os escritos do poeta. Gregório não quer. Diz ser um poeta que escreve para os que não sabem ler.
Manuel Dias pensava em Ursula do Congo. Estava ao lado da esposa Aldonça e pensava nos problemas: vistas de pessoas e morcegos no esconderijo. Era um péssimo sinal. Enquanto amava a esposa, O Gordo e Antonio Teles chegava ao local matando as escravas. Em seguida mataram o escrivão e a esposa, deixando apenas uma criança soluçando entre os mortos.Não esqueceram também de decepar a mão de Manuel Dias. Gregório visita Anica de Melo e fala da morte de Manuel Dias. Anica está desconfiada do seu amor por outra mulher. Gregório nega, Anica chora e depois se amam. Anica arranjou um esconderijo para Gregório no armazém de Vicente Laso, numa rua deserta. Para lá foram. Gregório usava uma cabeleira, presente de Anica. Como o local ficava perto da praia, Gregório ficou ao lado de Anica sentados nas pedras. Pensava em Maria Berco e sabia que quando mais visitasse Anica mais a magoaria.
Gonçalo Ravasco foi se despedir do tio. Vieira já não tinha certeza do sucesso da empreitada. Havia perdido muitos parentes em naufrágios e temia pelo sobrinho. Aconselhou-o a não ir. Gonçalo tentou acalmá-lo. Tudo daria certo. Viajaria com outros homens prejudicados pelos Menezes. Vieira pediu que falasse com o príncipe e relatasse o que ocorria na Bahia. Luiz Bonicho e Donato Serotino prepararam-se para a viagem à Europa. No embarque, encontraram o Gordo e vários policiais. Correram pelas ruas estreitas. Serotino acabou morto no meio da rua e Luiz Bonicho, mesmo oferecendo toda sua fortuna ao Gordo, teve sua mão decepada pelo Alcaide. Eles não encontraram as cartas de Vieira. Como o vereador havia desmaiado, o Gordo preocupou-se com as jóias. Bonicho recobrou os sentidos e atirou no Gordo, matando-o. Conseguiu adentrar no navio com o braço enrolado num pano. No mesmo navio viajava, como clandestino, Gonçalo Ravasco. João da Madre deus visita o governador e pede por fim ao processo contra Padre Vieira e Gregório de Matos. Governador rechaça ambos. João da Madre Deus procurou Gregório de Matos e exigiu que ele tivesse um comportamento condizente com o cargo que ocupava e que passasse a trabalhar, já que só aparecia na Sé para receber o salário. Gregório afirmou que estava sendo perseguido pelo Braço de Prata e negou-se a mudar o comportamento. Anica vai levar a Gregório a notícia da morte de Manuel Dias e fala também das fugas de Gonçalo e Bonicho. Fala também que Maria Berco será enforcada e que Bernardina Continua presa. Antonio Teles vai ao governador e fala do sucesso de sua empreitada. O governador não vê sucesso. As cartas de Vieira não foram encontradas, Bonicho e Gonçalo estão indo a Portugal e Rocha Pita vai comandar o processo. Ele afirma que vai retomar o comando.

A devassa

Começam as investigações sobre a morte do alcaide. Na relação, o desembargador Rocha Pita começa a colher depoimentos. O primeiro a depor é o desembargador Manoel da Costa Palma. Seu depoimento é amplamente favorável ao governador. Antonio Souza Menezes pede a Mata que investigue o ponto fraco de Rocha Pita. Achava que todo homem é corruptível. Vários depoimentos se sucedem. Vieira manda seus procuradores depor no Tribunal da Relação. Há dificuldades em encontrar os verdadeiros culpados, mas Rocha Pita sabe da impopularidade do governador. O meirinho Manoel do Porto, auxiliar de Rocha Pita, sugere perdão para todos. Decidido, Rocha Pita quer aprofundar as investigações e marca uma audiência com o Braço de Prata.
No palácio, Rocha Pita se queixa ao governador das prisões efetuadas. Fazia ver ao governador que ele não podia prender todos os inimigos pelo crime do alcaide. Gentil, o Braço de Prata lhe oferece facilidades para ter acesso a toda documentação do palácio. Enquanto isso, Manoel do Porto descobre documentos da aquisição de propriedades em nome de parentes do governador.
Gregório de Matos leu o processo de Maria Berco. Estava condenada à forca. Sabia que era inocente. Procurou Rocha Pita e pediu por Maria. A questão ficou resolvida. João Berco pediria clemência ao governador. Gregório prometeu pagar a fiança. Assim foi feito. Imediatamente, Gregório de Matos foi procurar Bernadina Ravasco. Já fora da prisão, encontrava-se doente. Gregório lhe informou sobre o processo de Maria Berco e sobre a fiança. Pediu-lhe o dinheiro. Não tinha, mas aconselhou-o a procurar Samuel da Fonseca, o judeu. Gregório foi ao Matoim em busca do judeu, acompanhado com o filho de Samuel, Gaspar da Fonseca. No caminho, depois das recordações do poeta sobre as mulheres de sua vida, foram atacadas por homens do governador. Salvaram-se mergulhando no rio Matoim. No destino, Samuel da Fonseca conseguiu o dinheiro. No dia seguinte, o da audiência, Gregório já aguardava João Berco para pagar a fiança e soltar a esposa. Como não aparecia, o poeta tentou encontrá-lo. Foi até a morada dele. Estava morto e com uma mão decepada.
Gregório vai procurar Anica de Melo. Seu lupanar estava sendo vigiado. Gregório marcou encontro na taberna da rua de baixo. Sobe da devassa feita na propriedade de Anica. Procuravam o poeta. Enquanto isso, o estudante Gaspar Fonseca era detido no porto. Num baú que levava estavam os escritos de Bernardo Ravasco. O Braço de Prata os queimou folha por folha. Samuel da Fonseca foi surpreendido quando encontraram o corpo do filho roído pelos peixes. Gregório procurou Rocha Pita e pediu mais uma vez por Maria Berco. Achava que o caso estava perdido. Com o dinheiro que seria da fiança, religiosos visitaram a prisão para dar conforto aos presos e Maria Berco foi solta e mandada para a casa de Samuel da Fonseca, no Matoim.
Salvador no século XVII
Padre Vieira queimava em febre, mas continuava em atividade. Alimentava-se entre os pobres quando padre José Soares comunicou-lhe a soltura de Bernardo Ravasco e a expatriação feita pelo governador. Mesmo assim, o irmão de Vieira estava escondido no convento de Santa Teresa. Rocha Pita também mandou suspender a devassa e soltar outros suspeitos presos indevidamente. Tal comportamento causou revolta a Teles de Menezes. O alcaide não se conformou e, numa reunião no palácio, ameaçou o Braço de Prata. Gregório de Matos, depois de passar a noite com Anica de Melo, comunica-lhe que vai para o Recôncavo.

A queda

Na Praia Grande, no Recôncavo, Gregório de Matos pensava na vida e sentia falta da cidade da Bahia. Vivendo sendo posses e alimentado pelas negras, pelo álcool e peixe, não conseguia esquecer Maria Berco. Foi ao engenho de João da Fonseca e ela ainda se recuperava dos maltratos da enxovia. Não pôde vê-la, mas ouviu um relato minucioso das questões comerciais da agricultura da região. A Bahia trabalhava para enriquecer a Europa.
Certo dia, Gregório recebeu a visita de Samuel da Fonseca. Disse-lhe que Maria Berco queria vê-lo na igreja do seu engenho. Gregório foi vê-la. Usava um véu para esconder as cicatrizes. O poeta a pediu em casamento. Ela marcou um encontro em Salvador. Depois que Maria se afastou, Gregório ouviu uma viola animar a praia. Havia negras por lá. Era o lugar dele.
Antonio de Souza Menezes recebe a visita de um mensageiro do Rei de Portugal. Trazia dois comunicados. Bernardo Ravasco seria readmitido como secretário e deveria ser imediatamente posto em liberdade. O outro comunicado era a demissão do próprio governador. Foi Tomás Pinto Brandão quem comunicou o fato ao Gregório. Agora poderia voltar a Salvador. Foi levar a notícia a dom Samuel. Lá, apareceram Eusébio de Matos, padre e irmão de Gregório, e Bernardo Ravasco, ainda com as marcas da prisão. As notícias não eram boas. Vieira não estava nas graças do Rei e todos os processos continuavam. Além disso, o padre estava muito doente. Dois cometas pairavam nos céus da Bahia e marcaram o fim do governo do Braço de Prata.

O destino

Gregório de Matos teve paz durante o governo de Antonio Luiz de Souza, o marques de Minas, mas desistiu de Maria Berco. Casou-se com Maria de Povos, uma negra pobre. Com ele teve um filho chamado Gonçalo, em homenagem ao filho de Bernardo Ravasco. Quando assumiu o governo Antonio Luiz da Câmara Coutinho, o Tucano, as sátiras de Gregório voltaram com carga total. Abandonou a mulher, vivia em patuscadas. O sobrinho do Tucano assumiu o governo. Era João de Lencaster, amigo do poeta. Foi encarregado de matar Gregório. Traído por Gonçalo Ravasco, o poeta foi preso e mandado para a ilha de madre de Deus. Em seguida, foi deportado para Angola. Lá, meteu numa sublevação de militares. Como colaborou com o governador daquela colônia, foi perdoado e mandado de volta ao Brasil. Estava proibido de viver na Bahia. Passou a viver da advocacia e morar no convento de Nossa Senhora da Penha, no Recife. Lá foi enterrado, vitimado por uma febre. Estava com cinqüenta e nove anos. A capela foi demolida e não há vestígios mais do poeta. Sua poesia foi registrada em livro, a pedido do próprio governador Lencaster. Pessoas de toda a Bahia traziam de cor ou nas mãos os poemas que mais representavam a vida naquele século.
Padre Antonio Vieira não cessou de escrever e publicar seus Sermões, mesmo estando cego de um olho. José Soares o auxiliava. Chegou a ser nomeado visitador geral das Missões. Defendeu a província do comércio desvantajoso com a Europa, defendeu os índios da escravidão, pregava a criação da moeda provincial. Ficou completamente cego e parcialmente surdo em 1696, mas ainda ditava cartas para José Soares. Quando não mais pôde, despediu-se da nobreza portuguesa. Em 1697, logo após uma visita de um soldado de frota, enviado pelo coroa, morria na quinta do Tanque assistido por José Soares e pelo reitor do Colégio da Bahia, Padre Andreoni.
Bernardo Ravasco morreu dois dias depois do irmão. Fora inocentado em 1687 no caso da morte do alcaide. Seus livros nunca foram encontrados, mas deixou numerosa obra poética em português e castelhano.
Gonçalo Ravasco assumiu o cargo de Secretário de Estado em lugar do pai. Após trair Gregório de Matos, tinha constantes pesadelos. Foi secretário exemplar.
José Soares morreu aos setenta e quatro anos. Dizia, quinze dias antes de morrer, que Vieira o havia chamado. Um dia, mandou anunciar a sua própria morte. Após recitadas as preces, veio a falecer.
João de Araújo Góis, o seu colega o desembargador Palma e o arcebispo João da Madre Deus foram vítimas da peste que sepultou a maior parte da população da Bahia, a partir de 1686.
Antonio de Souza Menezes, o Braço de Prata, foi nomeado, em Portugal, governador de Campo Maior. Viveu o resto de sua vida atormentado pelo rancor a Vieira e pelo arrependimento de um pecado nunca revelado.
O alcaide Teles obteve o perdão no governo de Lencaster e descobriu que a rivalidade entre Ravascos e Menezes tinha uma causa: Bernardina Ravasco.
Antonio de Brito ficou homiziado até 1692, quando obteve perdão do rei dom Pedro II, após interferência de Vieira e do papa Inocêncio XII.
Samuel da Fonseca mudou para Amsterdã. Casou-se com a filha de um rabino e logo ficou viúvo. Vendeu tudo que tinha e dedicou-se a imprimir livros. Morreu em 1698, na Holanda.
Luiz Bonicho chegou vivo a Lisboa. Lá tentou colocar uma mão de prata, mas estava sem recursos. Lutou na coroa pelo deposição do Braço de Prata e alistou-se numa tripulação de capitania destinada à Índia, em 1692. A viagem foi um fracasso. Dos quase seiscentos homens, só oitenta e quatro chegaram vivos. Sobreviveu, mas foi acometido de escorbuto e febre. Abandonado em Goa, foi para o golfo Pérsico e virou pirata. Nas lutas, perdeu uma perna. Rico, retornou a Portugal em 1698. Depois seguiu para Paris, de onde não se teve mais notícias suas. Só boatos.
Anica de Melo recebeu sua casa de volta e continuou com seu prostíbulo. Gregório sempre a visitava, mesmo casado. Apaixonada, quando soube do degredo do poeta, seguiu para Angola. O navio foi atacado por corsários holandeses e ela morreu afogada. Gregório nunca soube de sua morte.
Maria Berco esperou Gregório em vão. Sofreu muito quando do casamento com a viúva Maria de povos e no nascimento do filho dele. Rica e sem aceitar nenhum casamento proposto, viajou para Portugal no mesmo navio que levava o ex-governador Antonio Luiz da Câmara Coutinho. Em Lisboa passou a defender os judeus. Foi indiciada no tribunal da Santa Inquisição. Foi excomungada, teve seus bens seqüestrados e foi deportada para a ilha de São Tomé. Morreu na mesma ilha. Estava pobre e o rosto desconfigurado. Nunca esqueceu Gregório de Matos.
O molecote que ajudou os conspiradores na morte do alcaide nunca foi descoberto. Gregório de Matos afirmou certa época que ele foi um dos negros revoltosos que levantou as espadas contra os desembargadores. Foi enforcado e esquartejado.
Enquanto isso, a Bahia cresceu sem perder a marca da terra do prazer e do pecado. Continua encantando a todos e será a eterna cidade do Boca do Inferno.

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

A mulher que mudou o próprio cérebro


por André Bernardo da revista GALILEU
Curando-se, psicóloga canadense criou método contra a dificuldade de aprender
Cabeça boa: Após criar sozinha exercícios que reverteram
sua dificuldade de aprender, Barbara passou a ajudar crianças
com o mesmo problema
Que horas são? A educadora canadense Barbara Arrowsmith-Young, 61, só conseguiu responder a essa pergunta perto dos 30 anos. Problemas neurológicos a impediam de ler, escrever e calcular como qualquer criança de sua idade. Ela até sabia que o ponteiro pequeno marcava as horas e o grande, os minutos, mas não entendia a relação entre eles. No colégio, aprendeu a conviver com xingamentos como preguiçosa, bagunceira e retardada. “Cresci em um mundo confuso e incompreensível porque uma parte importantíssima do meu cérebro não funcionava como deveria”, afirma Barbara, que acaba de lançar The Woman Who Changed Her Brain (A Mulher que Mudou seu Cérebro, ainda inédito no Brasil).
Foram necessários dias e noites decorando matérias e torcendo para que fosse aquilo que ia cair na prova, mas ela não só conseguiu terminar a escola como fez faculdade e mestrado em psicologia, virando uma especialista no seu problema. Tornou-se autora de um método de condicionamento para o cérebro que hoje ajuda diversas crianças com déficit cognitivo como ela. “Sempre tive certeza do que queria ser quando crescesse.”
Sua vida começou a mudar quando, na faculdade, um ex-colega de turma sugeriu que ela lesse os livros do neuropsicólogo russo Alexander Luria. Um deles, O Homem com um Mundo Estilhaçado, narrava a história de um soldado que havia levado um tiro na cabeça e acordou com estranhos sintomas: não sabia responder se um elefante era maior do que uma formiga, por exemplo. A bala havia atingido 3 importantes áreas do cérebro do soldado: a que processa os sinais visuais, a que responde pelo som e pela linguagem e a que coordena as relações espaciais e integra as informações de diferentes sentidos — as mesmas que não funcionavam bem no cérebro de Barbara.
O que era promissor ficou ainda melhor quando Barbara se deparou com o estudo do psicólogo americano Mark Rosenzweig. Ele provou que ratos de laboratório que vivem em ambientes estimulantes aprendem mais do que os confinados em jaulas vazias. “Por 400 anos, a ciência acreditou que a anatomia do cérebro era imutável. Hoje, sabemos que é possível reorganizá-lo, mesmo quando danificado”, diz o psiquiatra canadense Norman Doidge, autor de O Cérebro que se Transforma. É a chamada neuroplasticidade. “São as mudanças que ocorrem quando fazemos novas sinapses, fortalecemos conexões pré-existentes e formamos novos neurônios em resposta aos estímulos externos”, afirma o neurologista Augusto Buchweitz, da PUC-RS.
A partir dessa ideia é que Barbara lançou-se no desafio de transformar seu próprio cérebro. O primeiro passo foi aprender a ver as horas. Para isso, desenhou relógios com diferentes horários em dezenas de cartões e se forçava, por tentativa e erro, a dizer que horas eram. No verso, estava a resposta. À medida que ia acertando, o exercício dificultava, com ponteiros para segundos e décimos de segundo. Depois de 4 anos de práticas diárias (uma média de 10 horas por dia ), Barbara conseguiu não só acertar as horas, como interpretar textos e fazer cálculos. “Comecei então a criar exercícios para estimular outras partes do meu cérebro”, diz. Foi assim que ela passou a estudar alfabetos, memorizar poemas e usar tapa-olhos (saiba mais no box abaixo).
Barbara acabou inventando uma técnica para ajudar pessoas com problemas semelhantes ao dela. A fundação Arrowsmith School, criada por ela em 1980, em Toronto, já atendeu mais de 4 mil estudantes — com diagnósticos de dislexia, hiperatividade ou déficit de atenção. Muitos foram para a faculdade e tiveram sucesso profissional. Ela não se esquece do menino que, aos 13 anos, não sabia ler nem escrever, e hoje trabalha no mercado financeiro. Apesar da eficácia não ter sido comprovada cientificamente, o programa já foi adotado em 40 escolas dos EUA, Canadá e Austrália. Mas o maior orgulho de Barbara é ajudar crianças que, como ela, poderiam ter se sentido incapazes por toda a vida. “Meu objetivo é abrir um mundo de possibilidades para essas pessoas.”

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Bella, nascida para ser vampira


Com cenas de batalha que arrancam gritos da plateia, Amanhecer – Parte 2  é bom final para a saga
Flavia Guerra – de O Estado de São Paulo.
Se você é daqueles que leram os livros de Stephenie Meyer, que assistiram aos filmes da Saga e ainda aproveitaram o último fim de semana para fazer uma maratona e relembrar tudo que Bella e Edward passaram, então Amanhecer – Parte 2 é para você. Prepare-se para um epílogo digno de novela (com o melhor que uma novela pode ter). Prepare-se também para uma batalha final que, como bem disse Robert Pattinson a esta blogueira que vos escreve, é super ousada, sanguinária e….só um sonho. Ou quase.
Para não estragar a surpresa de quem ainda não leu o livro e de quem leu também, já que há algumas modificações da trama do livro no roteiro, limito-me a dizer: A batalha entre os Volturi e os Cullen e seus aliados (incluindo vampiros das mais diversas origens e países e os lobisomens) é digna de arrancar gritinhos da plateia.  E foi exatamente isso que ocorreu quando a primeira vítima teve sua cabeça decapitada por Aron Volturi (o sempre ótimo Michael Sheen).
A partir deste fato, a guerra começa. E tudo para salvar a cabeça da pequena Renesmee (Mackenzie Foy), que é acidentalmente confundida com uma criança-vampiro pelos Volturi, que havia recebido esta informação de uma das irmãs Denali. Como o maior bem que um vampiro pode ter é sua identidade protegida, e como crianças-vampiros são incapazes de controlar sua sede e de manter segredo, é, por decreto, preciso matar qualquer pequeno vampiro que apareça.
Pense na ira de Bella ao saber que a vida de sua filha corre perigo. A mamãe-vampira se revela uma loba (com perdão do trocadilho) capaz de matar para proteger a cria. A propósito, está na experiência de descobrir como um vampiro vê, ouve e vive um dos maiores prazeres de se assistir a Amanhecer – Parte 2. “Eu queria fazer com que o público sentisse o que a Bella sente, sentisse os cheiros, soubesse como é ter o poder de enxergar pequeníssimos detalhes, insetos, ouvir barulhos…E, claro, ter a sede de sangue que ela tem”, comentou o diretor Bill Condom ao Estado em conversa em Los Angeles há duas semanas.
Muito por isso, o longa começa com cenas picotadas, que mostram em cada detalhe como o veneno está se espalhando pelo sangue de Bella e transformando sua natureza. “Na verdade, não transforma sua natureza, mas aprimora, revela. Ela descobre que já tinha os talentos antes mesmo de se tornar uma vampira”, comento a atriz Kristen Stewart. “Nasci para ser vampira”, diz Bella logo depois de sua primeira caçada ao lado do marido Edward (Robert Pattinson). De fato. Bella já está tão treinada após anos e anos convivendo com os Cullen que é até capaz de controlar sua sede por sangue humano e se contentar com um ‘simplório’ leão da montanha. Único detalhe é que ela faz toda a caçada usando um micro vestido azul justíssimo. “Sei que não é o figurino mais adequado para uma perseguição. E nem sei porque a Bella não reclamou disso”, brincou Kristen.
A imprensa internacional afirmou em várias críticas que Amanhecer – Parte 2 é o melhor longa da saga. Há controvérsias. Ainda que um final seja aguardado há tempos, ainda que as soluções de roteiro sejam acertadas, havia em Amanhecer – Parte 1 um drama maior. Havia a tão aguardada descoberta da sexualidade, a viagem a Paraty (o cenário perfeito para a lua-de-mel), havia a gravidez (quase impossível), a  possibilidade de perder Bella e o bebê que ela esperava, a dúvida do que viria a ser, a luta para salvá-las. Havia uma humanidade no drama de Ed, que, não podendo fazer nada para salvar sua família, tinha de, como bem disse Pattinson, aprender que não podia sempre controlar tudo e esperar o melhor.
Desta vez, os dramas surgem menos íntimos, mas não menos dramáticos. Há a luta de Ed por sua família, a cruzada dos Cullen por aliados para testemunhar em favor da humanidade da pequena Renesmee, há a descoberta da maternidade por Bella. Mas há também mais superficialidade nas atuações e dramas.
Fato é que é um fim merecido para uma saga que fez U$ 2,5 bilhões só em bilheteria, sem contar o lucro obtido com venda de DVDs, livros, brindes etc.
Se este é o fim de fato, o tempo dirá. Há boatos de que Stephenie Meyer poderá escrever uma nova história, que poderá ser filmada daqui a alguns anos. Quando questionados se voltariam a filmar a Saga, todos os atores disseram que sim. Só Kristen ousou dizer que acha que “é o fim para Ed e Bella, pois eles já viveram tanto e novos personagens merecem novas histórias.” Quem sabe não será Renesmee que viverá suas aventuras da próxima vez ao lado de Jacob Black (Taylor Lautner)?  A ver!

domingo, 11 de novembro de 2012

¨¨¨Landisvalth Blog: Veja as melhores fotografias do mês de Outubro

¨¨¨Landisvalth Blog: Veja as melhores fotografias do mês de Outubro:       O Landisvalth Blog vai, a partir deste mês, selecionar as melhores fotografias e publicá-las aqui para os seus leitores. Hoje seleci...

sábado, 3 de novembro de 2012

Memorial de Aires: o último livro de Machado de Assis


Memorial de Aires, romance psicológico e última obra de Machado de Assis, foi publicado em 1908, mesmo ano da morte do escritor. A obra tem por tema os idílios amorosos e as futilidades de personagens pertencentes à elite brasileira do fim do século XIX. A crítica afirma que foi nesta obra que o genial escritor mais expôs os seus valores subjetivos, fugindo um pouco à sua característica mais marcante: a isenção narrativa.
O romance opera um verdadeiro retrocesso na obra machadiana. Nele o romancista retorna à concepção romântica, mitigada pelo ceticismo risonho do conselheiro Aires. Ai se respira a mesma atmosfera dos seus primeiros romances: os seres são de eleição e a vida gira em torno do amor. Distingue-o, porém, e torna-a muito superior àqueles a mestria do ofício, o domínio do instrumento.
Como novidade, traz a forma de diário e o narrador não é onisciente; observa como simples comparsa os personagens principais, procura adivinhar-lhes o íntimo através de suposições próprias ou através de informações alheias.
Como Memórias Póstumas de Brás Cubas, esta obra não tem propriamente um enredo: estrutura-se em forma de um diário escrito pelo Conselheiro Aires, que é o mesmo personagem-narrador da obra anterior do autor, Esaú e Jacó, que pouco age e passa a maior parte da narrativa contemplando placidamente as aventuras amorosas e existenciais dos jovens ao seu redor.
O diário compreende dois anos na vida de um sexagenário que, com sua proverbial mas plácida sabedoria, ilude e engana o leitor com pequenas observações carregadas de perspicácia. Nele o narrador relata, miudamente, sua vida de diplomata aposentado no Rio de Janeiro, de 1888 e 1889. Sucedem-se, nas anotações do conselheiro, episódios envolvendo pessoas de suas relações, leituras do seu tempo de diplomata e reflexões quanto aos acontecimentos políticos. Destaca-se, dando uma certa unidade aos vários fragmentos de que livro é composto, a história de Tristão e Fidélia. Trata-se de um livro concebido em tom íntimo e delicado, às vezes repleto de melancolia.
Nele Machado de Assis pôs muito dos últimos anos de sua vida com Carolina, falecida quatro anos antes da publicação. Não há muito que contar, senão pequenos fatos da vida cotidiana de um casal de velhos. O estilo é de extrema sobriedade, e o autor, já na velhice, pretendeu com este livro prestar um depoimento em favor da vida, ainda que em tom de mal disfarçada tristeza e até mesmo desolação.
Escrito após a morte de Carolina, revela uma visão melancólica da velhice, da solidão e do mundo. D. Carmo, esposa do velho Aguiar, seria a projeção da própria esposa de Machado, já falecida. A ironia e o sarcasmo dos livros anteriores são substituídos por um tom compassivo e melancólico, as personagens são simples e bondosas, muito distantes dos paranóicos e psicóticos dos romances anteriores. Alguns vêem no Memorial de Aires uma obra de retrocesso a concepções romantizadas do mundo; outros tomam o romance como o testamento literário e humano de Machado de Assis.
Machado de Assis
Memorial de Aires é apontado como o romance mais projetado da personalidade de Machado de Assis.
Enredo
O conselheiro acompanha com interesse humano (talvez amoroso) a jovem viúva Fidélia, praticamente adotada por um casal de velhos sem filhos, Dona Carmo e Aguiar. Estes tinham experimentando uma grande decepção quando um rapaz a quem se afeiçoaram, como se fosse seu filho verdadeiro, Tristão, mudara-se para Lisboa com o fim de freqüentar a escola de medicina. Tristão retorna e acaba se casando com Fidélia. Em seguida, para tristeza dos velhos, o jovem casal viaja para Europa.
O romance termina com o Conselheiro Aires acompanhando com discreta piedade a solidão do casal Aguiar e Carmo, no qual muito críticos viram as figuras de Machado e de sua esposa, Carolina.
Trechos da obra
Transcrevemos, a seguir, alguns fragmentos do diário do Conselheiro Aires, que nos remete à solidão do casal Aguiar-D. Carmo, após a partida de Tristão e Fidélia. Observe a dolorosa reflexão sobre a velhice.
29 de agosto
"Assim correram as cousas, a mentira e os efeitos. Os dous procuramos levantar-lhes o ânimo. Eu empreguei algumas reflexões e metáforas, afirmando que eles viriam este ano mesmo ou no princípio do outro; bastava saberem a dor que causava aqui a noticia.
D. Carmo não parecia ouvir-me, nem ele; olhavam para lá, para longe, para onde se perde a vida presente, e tudo de se vai depressa. Aguiar ainda pegou na carta que o Desembargador lhe mostrava, leu para si as palavras de Tristão, que eram aborrecidas em si mesmas, além da nota que o autor intencionalmente lhes pôs. D. Carmo pediu-lha com o gesto, ele meteu-a na carteira. A boa velha não insistiu. Campos e eu saímos pouco depois.
30 de agosto
Praia fora (esqueceu-me notar isto ontem) praia fora viemos falando daquela orfandade às avessas em que os dous velhos ficavam, e eu acrescentei, lembrando-me do marido defunto:
- Desembargador, se os mortos vão depressa, os velhos ainda vão mais depressa que os mortos... Viva a mocidade!
Campos não me entendeu, nem logo, nem completamente. Tive então de lhe dizer que dizer que aludia ao marido defunto, e aos dous velhos deixados pelos dous moços, e conclui que a mocidade tem o direito de viver e amar e separar-se alegremente do extinto e do caduco. Não concordou,- que mostra que ainda então não me entendeu completamente.
Sem data
Há seis ou sete dias que eu não ia ao Flamengo. Agora à tarde lembrou-me lá passar antes de vir para casa. Fui a pé; achei aberta a porta do jardim, entrei e parei logo. "Lá estão eles, " disse comigo.
'Ao fundo, à entrada do saguão, dei com os dous velhos sentados, olhando um para o outro. Aguiar estava encostado ao portal direito, com as mãos sobre os joelhos. D, Carmo, à esquerda, tinha os braços cruzados à cinta. Hesitei entre ir adiante ou desandar o caminho; continuei parado alguns segundos até que recuei pé ante pé. Ao transpor a porta para a rua, vi-lhes no rosto e na atitude uma expressão a que não acho nome certo ou claro; digo o que me pareceu. Queriam ser risonhos e mal se podiam consolar; consolava-os a saudade de si mesmos".
Do portal PASSEIWEB.