Marcos José de Souza
Prof. Marcos José de Souza |
Há tempo, principalmente nos últimos 05(cinco)
anos viemos acompanhando, de modo indireto, isto é, sem adentrar no debate,
várias inferências sobre o ensino médio, dentre eles, o ENEM, a demanda –
jovem trabalhador, não-trabalhador, das pequenas, medias e grandes cidades, da
zonas centrais e periféricas, da zona urbana e da zona rural, da rede pública e
da rede privada – o currículo – educação
de tempo integral e o que estudar e como estudar.
É a partir deste ultimo aspecto – o que e como estudar no ensino médio, o
currículo - que declinaremos neste momento, que deveria ter saído em
janeiro, conforme tarefa auto-imposta, a saber, um texto sobre educação a cada
30(trinta) dias, ao menos, durante o ano de 2015, tendo seu início sequencial
em dezembro de 2014.
Estando no Ensino Médio desde o ano de 1997 e
exclusivamente nele desde 2001, sempre nos inquietamos com o comportamento dos
estudantes, jovens, na sua quase totalidade, na faixa etária dos 15 aos 17
anos, portanto, uma fase da vida de início de consolidação dos mais variados
conceitos, morais, sócias, intelectuais, políticos, desse modo, gente que pensa
e tem opinião, por mais que nós professores e professoras, entendamos que são SOMENTE
adolescentes e jovens. Foi a partir desse itinerário de confrontação – mundo
adulto, diplomado e mundo juvenil sempre ansioso por mudanças – que viemos
construindo um novo olhar sobre o que e como ensinar no ensino médio: a
proposta de um currículo por temas, isto é, no lugar das disciplinas, teríamos
cursos variados, tendo por base o conteúdo daquelas matérias de ensino e os conhecimentos
obrigatórios para este nível de ensino, traduzidos na legislação por
competências e habilidades.
Incidente em Antares, Globo. |
Para ilustrar essa ideia passo a expor uma
leitura que fiz do livro Incidente em Antares, de Érico Veríssimo, publicado em
1995, pela editora Globo, São Paulo. O exemplar que li está na 45ª edição. O
livro trata, sinteticamente falando, da “aventura” de 07(sete) cadáveres que
decidem protestar contra o atraso nos próprios sepultamentos. Esse atraso dá-se
por conta da luta dos trabalhadores da cidade de Antares, cidade onde ocorrem
as ações da narrativa.
O início da saga |
Escolhi o capítulo LXXVI para trazer à tona
algumas possibilidades do que denominei de estudo por temas, no lugar das
convencionais disciplinas. Após essa exposição, delinearei outra atividade,
esta já aplicada na escola onde trabalhamos, bem como minha sugestão de
alteração curricular, esta ideia foi indicada no plano de ação, que pode ser
total ou parcial no ano letivo.
Por ora vamos ao trecho do livro aludido acima:
O diálogo
“invocado” por dona Valentina(esposa do juiz Dr. Quintiliano do Vale) apresenta
os sinais de liberdade feminina, quando: ela acende um cigarro na presença do
marido, que sabe do vício, mas não permite ação na presença dele; o ato de
“modificar” o acontecimento – a ressurreição dos sete antarenses – em um conto de fadas (sobre essa iniciativa
de dona Valentina o narrador não nos diz nada sobre como ela fez a mudança de
um fato real – na narrativa, mas surreal para os leitores) e, por fim, quando
surpreende o marido dizendo que ela não é uma dama, conforme a justiça entende,
ao tempo em que convida-o para se despirem das máscaras usadas cotidianamente e
assim falarem a verdade, um para o outro, como dois seres humanos normais.
Destaco ainda o conceito que ela dá para
Justiça, a área de trabalho do marido, chamando de janela que abre e fecha de
acordo com as conveniências do transcurso de um assunto ou episódio real. Isto é, se ele, o juiz, concorda, a janela
do diálogo é aberta, se ele discorda, a janela é fechada.
A edição usada pelo autor do artigo |
O idioma
francês como símbolo de intelectualidade e de modernidade ou ainda de elitismo,
mesmo já perdendo espaço para o idioma inglês, é outro elemento informativo que
o romance revela, significando, sociológica e politicamente, o poder
político-ideológico que eles, os idiomas estrangeiros e de potências econômicas
e militares, exercem em um país “sem comando”, ou até mesmo subserviente a
essas nações.
O trecho a seguir traz uma visão panorâmica da
obra, sem deixar de sugerir um posicionamento do autor desse texto:
O romance
é um manifesto à liberdade, uma denúncia sobre os modos de ocupação de terras
devolutas – e do modo como nasceram muitos latifundiários no Brasil – e à
formação de muitas famílias tradicionais que ocuparam e ainda ocupam o poder
econômico e politico em terras brasilianas, ao tempo em exibe também o
cotidiano desses núcleos sociais.
O livro é volumoso, mas nem por isso,
cansativo. Apresenta diálogos e narrativas irônicas, bem ao gosto do jovem e do
adolescente, carregados de humor e de muita informação. É uma obra literária
completa: DIVERTE, ENREDA, INFORMA. É um texto necessário ao estudante do
ensino médio, aos curiosos, às curiosas, a quem se dedica a conhecer a
sociedade brasileira, mesmo tendo sido o Rio Grande do Sul, usado como palco por um dos mestres
dos pampas gaúchos, o grande Érico Veríssimo.
Érico Veríssimo |
O curso no ensino médio, tendo por base o livro
INCIDENTE EM ANTARES, como pude relatar nesse pequeno texto, traz elementos da arte
literária, história, política, geografia, religião, biologia, química, tendo a
língua portuguesa como idioma em que foi escrito, entre outras disciplinas que
os profissionais da educação possam enxergar. De posse do livro, a leitura
cotidiana e extra-classe será o objeto
principal de estudo e o total de horas destinado ao curso, deve ser definido
ainda na preparação do ano letivo e, em conjunto com outros temas de cursos, o
horário da turma/classe será preenchido observando-se as determinações,
critérios, princípios, carga horária e outros que a legislação estabelece.
Outros temas para cursos já foram expostos onde
trabalho como, por exemplo, O FUNCIONAMENTO DA CASA DE FARINHA, O BIOMA
CAATINGA, AS FESTAS POPULARES, entre outros, cujo desenvolvimento contempla os
conhecimentos estabelecidos por lei.
Como afirmei anteriormente nesse texto, uma
proposta de ensino por temas foi sugerida em nossa preparação do ano letivo o
qual passo a delinear a seguir em duas possibilidades:
A primeira é a de inclusão paulatinamente e consecutiva,
isto é, neste ano de 2015 os novos estudantes teriam à sua disposição os cursos
temáticos para sua livre matrícula. Porém, em caso de excesso de solicitações
para determinado curso, o professor/a professora responsável fará uma seleção
e, assim, teria o seu quantitativo máximo de estudantes matriculados. Em 2016 e
2017, teremos, assim as turmas de 1ª e de 2ª série em novo formato. Observando
o detalhe que os jovens não estariam vinculados à sua classe de origem, pois
eles estarão livres para matricularem-se em cursos diferentes, assim um rapaz
de 17 anos, em 2017, poderá fazer um curso, por exemplo, Na Trilha d’Os
sertões, com um alguém que esteja recém-saindo do Ensino Fundamental, com 15
anos de idade.
Para formar a quantidade de horas letivas, os
estudantes serão matriculados em outros cujas vagas existem a fim de garantir a
carga-horária mínima tanto do ano letivo, quanto do nível de ensino.
Entendo que desse modo o estudante terá mais
prazer em estudar, pois não teria o desconforto
de ler um romance, calcular o valor de seno, tangente, as guerras púnicas, etc,
etc, etc, isto é, temas inerentes às disciplinas que compõem o quadro
curricular do ensino médio.
A segunda possibilidade é a da oferta
concomitante, isto é, os estudantes fariam a sua opção no 1º ano de ingresso no
ensino médio: ingressar nos cursos temáticos ou na 1ª série por disciplinas.
Não uso propositalmente para esta segunda opção o termo “regular” por entender
que sendo aceito o ensino do currículo por temas, este também passa a ser
regular. Um detalhe importante: não pode haver mudança de matrícula em meio ao
percurso, uma vez matriculado em uma das opções, deverá o estudante ir até o
final dela, pois a diferença de nomenclatura e a quantidade entre si, será
muito grande.
Por fim descrevo em linhas gerais o que
denominei de CINEMA NA ESCOLA. Trata-se de uma semana de aula que consiste em
exibir o mesmo filme em todas as salas de aula, ao mesmo tempo. São 05(cinco)
filmes para a semana, denominada de SEMANA TEMÁTICA, um filme para cada dia. As
primeiras sequências foram escolhidas pelos professores, ainda no ano de 2009,
as demais foram indicadas pelos estudantes, sempre abordando o mesmo tema e
tendo o cinema nacional como lugar de destaque, isto é, a maioria deles é de
filmes brasileiros.
Como um dia de aula qualquer, o sinal é
acionado e todos os estudantes se dirigem para as suas salas. Há um pequeno
intervalo durante a exibição e ao final dele, a merenda é fornecida. Após a
degustação, todos e todas voltam para a classe e o debate sobre o filme é
iniciado. A critério do professor/da professora, alguma atividade é solicitada
após o debate ou até mesmo, alguma pergunta, sobre qualquer um dos filmes é
solicitada em prova escrita, independentemente da disciplina.
Após esse itinerário espero ter contribuído para
a reflexão e o debate deste nível de ensino há tempos carente de profundas
mudanças, em particular, no atendimento aos seus principais atores, os
estudantes, no que diz respeito ao ouvir o que eles e elas querem vivenciar,
ouvir, falar, conflitar, produzir, socializar, aprender...
Em dia de
chuva com muito calor abafado, nuvens carregadas e a perspectiva de muita chuva
para o sertão mocoense (ou seria montealvernense?)