José de Alencar, advogado,
jornalista, político, orador, romancista e teatrólogo, nasceu em Mecejana, CE,
em 1o de maio de 1829, e faleceu no Rio de Janeiro, RJ, em 12 de dezembro de
1877. É o patrono da Cadeira n. 23, por escolha de Machado de Assis.
Era filho do padre, depois
senador, José Martiniano de Alencar e de sua prima Ana Josefina de Alencar, com
quem formara uma união socialmente bem aceita, desligando-se bem cedo de
qualquer atividade sacerdotal. E neto, pelo lado paterno, do comerciante
português José Gonçalves dos Santos e de D. Bárbara de Alencar, matrona
pernambucana que se consagraria heroína da revolução de 1817. Ela e o filho
José Martiniano, então seminarista no Crato, passaram quatro anos presos na
Bahia, pela adesão ao movimento revolucionário irrompido em Pernambuco.
As mais distantes
reminiscências da infância do pequeno José mostram-no lendo velhos romances
para a mãe e as tias, em contato com as cenas da vida sertaneja e da natureza
brasileira e sob a influência do sentimento nativista que lhe passava o pai
revolucionário. Entre 1837-38, em companhia dos pais, viajou do Ceará à Bahia,
pelo interior, e as impressões dessa viagem refletir-se-iam mais tarde em sua
obra de ficção. Transferiu-se com a família para o Rio de Janeiro, onde o pai
desenvolveria carreira política e onde freqüentou o Colégio de Instrução
Elementar. Em 1844 vai para São Paulo, onde permanece até 1850, terminando os
preparatórios e cursando Direito, salvo o ano de 1847, em que faz o 3o ano na
Faculdade de Olinda. Formado, começa a advogar no Rio e passa a colaborar no
Correio Mercantil, convidado por Francisco Otaviano de Almeida Rosa, seu colega
de Faculdade, e a escrever para o Jornal do Commercio os folhetins que, em
1874, reuniu sob o título de Ao correr da pena. Redator-chefe do Diário do Rio
de Janeiro em 1855. Filiado ao Partido Conservador, foi eleito várias vezes
deputado geral pelo Ceará; de 1868
a 1870, foi ministro da Justiça. Não conseguiu realizar
a ambição de ser senador, devendo contentar-se com o título do Conselho.
Desgostoso com a política, passou a dedicar-se exclusivamente à literatura.
A sua notoriedade começou com
as Cartas sobre a Confederação dos Tamoios, publicadas em 1856, com o pseudônimo
de Ig, no Diário do Rio de Janeiro, nas quais critica veementemente o poema
épico de Domingos Gonçalves de Magalhães, favorito do Imperador e considerado
então o chefe da literatura brasileira. Estabeleceu-se, entre ele e os amigos
do poeta, apaixonada polêmica de que participou, sob pseudônimo, o próprio
Pedro II. A crítica por ele feita ao poema denota o grau de seus estudos de
teoria literária e suas concepções do que devia caracterizar a literatura
brasileira, para a qual, a seu ver, era inadequado o gênero épico, incompatível
à expressão dos sentimentos e anseios da gente americana e à forma de uma
literatura nascente. Optou, ele próprio, pela ficção, por ser um gênero moderno
e livre.
Casa onde nasceu José de Alencar |
Ainda em 1856, publicou o seu
primeiro romance conhecido: Cinco minutos. Em 1857, revelou-se um escritor mais maduro com
a publicação, em folhetins, de O Guarani, que lhe granjeou grande popularidade. Daí para
frente escreveu romances indianistas, urbanos, regionais, históricos,
romances-poemas de natureza lendária, obras teatrais, poesias, crônicas,
ensaios e polêmicas literárias, escritos políticos e estudos filológicos. A
parte de ficção histórica, testemunho da sua busca de tema nacional para o
romance, concretizou-se em duas direções: os romances de temas propriamente
históricos e os de lendas indígenas. Por estes últimos, José de Alencar
incorporou-se no movimento do indianismo na literatura brasileira do século
XIX, em que a fórmula nacionalista consistia na apropriação da tradição
indígena na ficção, a exemplo do que fez Gonçalves Dias na poesia. Em 1866,
Machado de Assis, em artigo no Diário do Rio de Janeiro, elogiou calorosamente
o romance Iracema, publicado no ano anterior. José de Alencar confessou a
alegria que lhe proporcionou essa crítica em Como e porque sou romancista, onde
apresentou também a sua doutrina estética e poética, dando um testemunho de
quão consciente era a sua atitude em face do fenômeno literário. Machado de
Assis sempre teve José de Alencar na mais alta conta e, ao fundar-se a Academia
Brasileira de Letras, em 1897, escolheu-o como patrono de sua Cadeira.
Sua obra é da mais alta
significação nas letras brasileiras, não só pela seriedade, ciência e
consciência técnica e artesanal com que a escreveu, mas também pelas sugestões
e soluções que ofereceu, facilitando a tarefa da nacionalização da literatura
no Brasil e da consolidação do romance brasileiro, do qual foi o verdadeiro
criador. Sendo a primeira figura das nossas letras, foi chamado "o
patriarca da literatura brasileira". Sua imensa obra causa admiração não
só pela qualidade, como pelo volume, se considerarmos o pouco tempo que José de
Alencar pôde dedicar-lhe numa vida curta. Faleceu no Rio de Janeiro, de
tuberculose, aos 48 anos de idade.
Obras: I Romances urbanos: Cinco minutos (1857); A viuvinha (1860); Lucíola (1862); Diva
(1864); A pata da gazela (1870); Sonhos d’ouro (1872); Senhora (1875);
Encarnação (1893, póstumo). II Romances históricos e/ou indianistas: O Guarani (1857); Iracema (1865); As minas de prata (1865);
Alfarrábios (1873); Ubirajara (1874); Guerra dos mascates (1873). III Romances
regionalistas: O gaúcho (1870); O tronco do ipê (1871); Til (1872); O sertanejo
(1875).
A Viuvinha – Resumo analítico
O
romance começa com o narrador contando como se escrevesse uma carta a uma prima
relatando a história de Jorge e Carolina. Ele, herdeiro de uma grande fortuna
que em sua juventude passa a gastá-la sem nenhuma preocupação. Apaixona-se por
Carolina e começa a ver a vida de um outro ângulo, mas às vésperas do seu
casamento, é surpreendido por um velho amigo de seu pai e seu antigo tutor, o
Sr. Almeida, descobrindo estar desgraçadamente falido, pobre. Para saldar sua
dívida e a honra de seu falecido pai ele toma uma atitude que transformará sua
vida. E no dia do seu casamento Jorge tomado pela culpa e pela vergonha, acaba
se suicidando e deixando Carolina viúva. Passa-se cinco anos e Carolina continua
usando seu traje de viuvez, o que as pessoas do lugar colocam o apelido de
viuvinha, por ser uma moça jovem e muito formosa. Neste momento entra em cena Carlos um homem
que guardava um segredo. Foi falar com o Sr. Almeida onde deixa claro que ele é
o mesmo Jorge que outrora inventou sua morte para poder trabalhar e juntar
dinheiro suficiente para limpar seu nome e do seu pai. Carlos freqüentemente
fica nas sobras embaixo da janela de Carolina, cuidando dela, amando-a em
segredo, até que um dia resolve escrever uma carta onde fala do seu amor e
marca um encontro, sem ela saber de quem se trata. Entra em contradição o seu
pobre coração, se deve ou não ir ao encontro mesmo sabendo que ainda ama
desesperadamente seu marido Jorge. Quando chega ao encontro o desconhecido fala
de seu amor e pede pra ela aceitar a ele. Mas em primeiro lugar Carolina tenta
repudiá-lo dizendo que não o quer, que ainda esta apaixonada pelo seu falecido
marido. Neste momento então Carlos resolve se mostrar a Carolina contando toda
a verdade, e abraça-a e beija e ambos juntos vão celebrar este amor tendo até
que enfim sua noite de núpcias. Pela manhã o Sr. Almeida resolver ir até a casa
de Carolina para contar a ela e sua mãe sobre a volta de Jorge, e enquanto ele
esta falando com a mãe de Carolina, esta a chama e ela dizem que esta esperando
por Jorge, sua mãe acha que Carolina esta enlouquecendo e quando vai até o
quarto da jovem leva um susto quando a vê no corredor de braços dados com o
falecido. O narrador termina contando que ouviu esta história de Carlota que é
vizinha e amiga da viuvinha.
Lucíola – Resumo e análise da Obra
LUCÍOLA é o quinto romance de Alencar e o
primeiro da trilogia que ele denominou de "perfis de mulheres"
(Lucíola, Diva e Senhora). Situa-se entre seus romances urbanos que representam
um levantamento da nossa vida burguesa do século passado mais considerável do
que o levado a efeito por Machado de Assis, na opinião de Heron de Alencar.
Fixam o Rio de Janeiro da época, com a sua fisionomia burguesa e tradicional, com
uma sociedade endinheirada que freqüentava o Teatro Lírico, passeava à tarde na
Rua do Ouvidor e à noite no Passeio Público, morava no Flamengo, em Botafogo ou
Santa Teresa e era protagonista de dramas de amor que iam do simples namoro à
paixão desvairada.
Em todos os romance urbanos, Alencar
aborda o amor como tema central. Ou, para ser mais exato, "aborda a
situação social e familiar da mulher, em face do casamento e do amor"
segundo Heron de Alencar. Mas o amor como o entendia a mentalidade romântica da
época, "um amor sublimado, idealizado, capaz de renúncias, de sacrifícios,
de heroísmos e até de crimes, mas redimindo-se pela própria força acrisoladora
de sua intensidade e de sua paixão." (Oscar Mendes, in José de Alencar -
romances urbanos, Rio de Janeiro, Agir, 1965, Col. Nossos Clássicos - p.10).
Baseando-se na enorme
aceitação de Alencar junto ao público, Antônio Cândido comprova a existência de
pelo menos dois Alencares:
"o Alencar dos rapazes,
heróico, altissonante, criando heróis como Peri, Ubirajara, Estácio Correia (As
Minas de Prata), Manuel Canho (O Gaúcho), Arnaldo Louredo (O Sertanejo).
o Alencar das
mocinhas, gracioso, às vezes pelintra, outras, quase trágico, criador de
mulheres cândidas e de moços impecavelmente bons, que dançam aos olhos do
leitor uma branda quadrilha, ao compasso do dever e da consciência, mais fortes
que a paixão. As regras desse jogo bem conduzido exigem inicialmente um
obstáculo, que ameace a união dos namorados, sem contudo destruí-la. Todavia,
há pelo menos um terceiro Alencar, o que se poderia chamar dos adultos, formado
por uma série de elementos pouco heróicos e pouco elegantes, mas detonadores
dum senso artístico e humano que dá contorno aquilino a alguns dos seus perfis
de homem e de mulher. Este Alencar, difuso pelos outros livros, se contém mais
visivelmente em Senhora e, sobretudo, LUCÍOLA, únicos livros, em que a mulher e
o homem se defrontam num plano de igualdade, dotados de peso específico e capaz
daquele amadurecimento interior inexistente nos outros bonecos e bonecas."
(in Formação da Literatura Brasileira, 4ª ed., São Paulo, Martins, 1971, 2º
vol. P.222).
O AMOR DE LÚCIA E PAULO
Paulo Silva, o
personagem-narrador, é um rapaz de 25 anos, pernambucano, recém-chegado ao Rio
de Janeiro, em 1855, com a intenção de aí se estabelecer.
No dia mesmo de sua chegada à
corte (Rio de Janeiro), após o jantar, sai em companhia de um amigo para
conhecer a cidade. Na rua das Mangueiras vê passar em um carro uma jovem muito
bela. Um imprevisto faz parar o carro, dando a Paulo a oportunidade de
repará-la melhor. Dia após, em companhia de outro amigo, o Dr. Sá, Paulo
participa da festa de N. Senhora da Glória, quando lhe aparece a linda moça.
Informando-se do amigo, fica sabendo tratar-se de Lúcia, a prostituta mais
bela, requintada e disputada da cidade. Mas ele se impressiona com a
"expressão cândida do rosto e a graciosa modéstia do gesto, ainda mesmo
quando os lábios dessa mulher revelam a cortesã franca e impudente."
Mais ou menos um mês após sua
chegada, Paulo vai à procura de Lúcia, levado, é claro pelo desejo de possuir
aquela linda mulher. Após longa e agradável conversa, acaba se surpreendendo
com o "casto e ingênuo perfume que respirava de toda a sua pessoa". A
um mínimo lance de seus seios, "ela se enrubesceu como uma menina e fechou
o roupão" discretamente. E ele, que fora quente de desejos, agora, na rua,
se acha ridículo por não haver ousado mais. Além do que, o Dr. Sá lhe
confirmara que "Lúcia é a mais alegre companheira que pode haver para uma
noite, ou mesmo alguns dias de extravagância."
No dia seguinte Paulo está de volta
à casa da heroína. Ao seu primeiro ataque, Lúcia se opõe com duas lágrima nos
olhos. Supondo ser fingimento, mostra-se aborrecido e ela reage atirando-se
completamente nua em seus braços, já que era isso que Paulo queria. Mas no auge
do prazer do sexo, Paulo percebe algo diferente nas carícias de Lúcia: mesmo no
clímax do gozo, parece que ela sofria. Sente, na hora, um imenso dó, ao que ela
corresponde cinicamente: "- Que importa? Contanto que tenha gozado de
minha mocidade! De que serve a velhice às mulheres como eu?" Ele quer
pagar-lhe, ela rejeita com um meigo aperto de mão. E ele retira-se realmente
confuso com "a singularidade daquela cortesã, que ora levava a impudência
até o cinismo, ora esquecia-se do seu papel no simples e modesto recato de uma
senhora".
E as informações que lhe
chegam a seu respeito são as piores. O Cunha diz que ela é "a mais bonita
mulher do Rio e também a mais caprichosa e excêntrica. Ninguém a compreende.
"Nunca fica muito tempo com o mesmo amante, "pois não admite que
ninguém adquira direitos sobre ela." Além do mais, é avarenta. Vende tudo
o que ganha. Até roupas. Para Paulo, no entanto, ela parece ser ao contrário de
tudo isso. Afinal, ela finge para ele ou já o ama? Paulo fica em dúvida atroz.
Por aqueles dias, numa
ceia em casa do Sá, com pessoas (Lúcia, Paulo, Sr. Couto, Laura, Nina,
Rochinha, etc...) maldosamente convidadas para transformar a ceia em bacanal,
Lúcia desfila toda nua, imitando as poses lascivas dos quadros que estavam nas
paredes, ante os olhares voluptuosos dos presentes. Depois, em lágrimas, nos
jardins da casa, ela se explica a Paulo. Fez aquilo por desespero, pois ele
havia zombado dela momentos antes: "se o Senhor não zombasse de mim, não o
teria feito por coisa alguma deste mundo..."E depois porque teria sido uma
decepção total, afinal o que Sá pretendia era mostrar a seu amigo Paulo quem
era Lúcia. "Não foi para isso que se deu essa ceia?! - explicou Lúcia. E
os dois se amaram profundamente, lá mesmo no jardim, á luz da lua, até de
madrugada.
Decorridos alguns dias, Paulo de
certo modo passa a morar com Lúcia, e, apesar das prevenções e restrições, mais
e mais se liga a ela por afeto. Lúcia, por sua vez, já ama Paulo e se entrega e
ele como a um dono e senhor. Há momentos de atritos entre ambos. Passageiros, e
todos causados pelo egoísmo e incompreensão de Paulo que não entende as
profundas transformações que o seu afeto operou nela. E a tal ponto , que ela
não suportaria mais a idéia de se lhe entregar na cama, pois sente por ele um
amor muito puro e profundo. E ele, levado mais por desejo que por afeto, não
consegue aceitar esse comportamento sublime.
As más línguas já comentam que
Paulo, além de viver à custa de Lúcia, ainda a proíbe de freqüentar a
sociedade. Lúcia que já então procurava viver mais retraída dispõe-se a voltar
à vida mundana apenas para salvar-lhe a reputação. Mas Paulo - complicado,
sádico, estúpido e chato - não compreende.
Lúcia já não vibra como outrora.
Mesmo quando excitada por Paulo. É a doença que já se faz sentir. Paulo não
entende essa frieza e por vezes se exaspera. Ela sofre calada pois reconhece
que "o amor para uma mulher como eu seria a mais terrível punição que Deus
poderia infligir-lhe!". O grande sentimento que os unia, arrefece, dando
lugar a uma amizade simplesmente.
O comportamento de Lúcia é cada vez mais
sublime e heróico. Já não existe mais nada da antiga cortesã. E Paulo, por fim,
entende essa nobreza de caráter e compreende o porquê das suas recusas. Ela lhe
recusava o corpo porque o amava em espírito. E também porque já está doente. Paulo
promete respeitá-la de ora em diante.
Lúcia um dia lhe revela todo o seu
passado. Chamava-se Maria da Glória. Era uma menina feliz de 14 anos e morava
com os pais, quando, em 1850, sobreveio a terrível febre amarela. Seus pais, os
três irmãos, uma tia caíram de cama, Ela ficou só. No auge do desespero,
resolveu pedir ajuda a um vizinho rico, Sr. Couto, que em troca de algumas
moedas de ouro tirou-lhe a inocência. "o dinheiro ganho com a minha
vergonha salvou a vida de meu pai e trouxe-nos um raio de esperança." Seu
pai, porém, sabendo da origem do dinheiro, e supondo ter a filha um amante, a
expulsou de casa. Sozinha, sem ter aonde ir, foi acolhida por uma mulher,
Jesuína, que, quinze dias depois, à conduziu à prostituição, estipulando pela
beleza de seu corpo um alto preço. O dinheiro, ela o usava para cuidar do que
restava da família: "e eu tive o supremo alívio de comprar com a minha
desgraça a vida de meus pais e de minha irmã".
Uma colega de infortúnio foi morar com
ela. Chamava-se Lúcia. Tornaram-se amigas. Lúcia morreu pouco depois. No
atestado de óbito, a heroína fez constar que a falecida se chamava Maria da
Glória, adotando para si o nome da amiga morta. "Morri pois para o mundo e
para minha família. Meus pais choravam sua filha morta; mas já não se
envergonhavam de sua filha prostituída." E todo dinheiro que ganhava,
destinava-o à preparação de um dote para sua irmã, Ana, a qual passou a manter
num colégio interno depois da morte dos pais.
Agora Paulo compreende ainda melhor
as atitudes misteriosas e contraditórias que Lúcia tomava como cortesã. É que
esse gênero de vida lhe parecia sórdido e abjeto. Ela suportava como a um
martírio, uma autopunição, uma maneira de reparar o seu pecado. Conhecido se
passado heróico, ele passa a sentir por Lúcia uma grande ternura e um amor
sincero.
Seguem-se dias tranqüilos. Lúcia
muda-se para uma casinha modesta e Ana mora com ela. "isto não pode durar
muito! É impossível!" É o pressentimento da morte. Lúcia tenta convencer Paulo
a se casar com Ana, que já o ama também. Seria uma maneira de perpetuar o amor
de ambos, já que ela se julga indigna do puro amor conjugal. Paulo rejeita com
veemência em nome do amor que não sente por Ana.
Lúcia aborta o filho que esperava de
Paulo. Ela se recusa a tomar remédio para expelir o feto morto, dizendo
"Sua mãe lhe servirá de túmulo". E já no leito de morte, recebe o
juramento de Paulo prometendo-lhe cuidar de Ana como sua filha. E morre
docemente nos braços de seu amado, indo amá-lo por toda a eternidade.
Senhora, obra-prima de Alencar ao lado de Iracema, narra em
terceira pessoa a hist6ria de Aurélia Camargo, que vive com sua mãe viúva e um
irmão num subúrbio do Rio de Janeiro.
Aurélia
apaixona-se por Fernando Seixas e este por ela, de modo que contra- tam
casamento. Seixas, porém, abandona-a por outra mulher por causa do dote desta.
Aurélia continua apaixonada por Seixas. Uma herança inesperada, em nome de
Aurélia, dá à moça a oportunidade de reconquistar o amado, mas também, de se vingar.
Aurélia, que ainda não tem 21 anos, propõe a Seixas -através de seu tio
e tutor, Lemos - um casamento com uma moça de grande dote, contra-recibo.
Impõe, no entanto, que ele aceite a proposta sem conhecer a identidade da
noiva. Seixas, endividado, aceita. Ao saber que é com Aurélia que vai casar,
fica enormemente feliz. Mas, na noite de núpcias, Aurélia lhe revela a verdade:
"eu, uma mulher traída; o senhor, um homem vendido" e, mostrando-lhe
o recibo, expulsa-o do quarto.
A partir dai, o relacionamento
entre eles se torna hipócrita. Diante de estranhos, representam um casal
perfeito. A sós, Aurélia o trata como se fosse sua propriedade e Seixas
aceita-se como tal até que, um pouco pelo trabalho, um pouco por sorte,
consegue juntar o dinheiro que deve a Aurélia, ficando, assim, resgatado.
Finalmente, depois disso, os dois jogam-se nos braços um do outro, vivendo
felizes para sempre.
O livro se divide em quatro
partes:, O Preço, Quitação, Posse e Resgate.
Ubirajara
Romance indianista
1. edição publicada em 1875 por B.L.Garnier
Pré-Cabralino
Ubirajara, é um romance que narra a história de um índio guerreiro, que por sua força e garra conquistava tudo que queria. O autor, começa a narração falando das nações indígenas existentes na época, e que Ubirajara era irmão de Iracema. Sua primeira atividade foi a caça, e como obtinha muito sucesso nesta atividade, recebeu o nome de Jaguaré, tipo de onça feroz que não deixava escapar suas presas.
Ubirajara, é um romance que narra a história de um índio guerreiro, que por sua força e garra conquistava tudo que queria. O autor, começa a narração falando das nações indígenas existentes na época, e que Ubirajara era irmão de Iracema. Sua primeira atividade foi a caça, e como obtinha muito sucesso nesta atividade, recebeu o nome de Jaguaré, tipo de onça feroz que não deixava escapar suas presas.
Era admirado por todos, e as virgens disputavam o seu
amor, mas havia uma moça que se chamava Jandira, que fora prometida para ele
seu nome Jandira, tinha o significado "Jandaíra" relativo a um tipo
de abelha.
Um dia, Jaguaré, estava caçando e encontrou outra
virgem muito bela, que pertencia a tribo Tupi, e logo apaixonou-se por ela, seu
nome era Araci, que significa estrela do dia. Ela também gostou dele e lançou
um desafio para a sua conquista: aquele que fosse melhor guerreiro teria o seu
amor. Jaguaré, aceitou o desafio, e quando se preparava para a luta, encontrou
um guerreiro da tribo tupi e travou com ele uma luta que durou muitas horas,
porém Jaguaré, saiu vencedor e levou seu inimigo preso para ser morto no tempo
certo. Todos da tribo Araguaia, festejaram a vitória de Jaguaré.
Depois ele voltou para lutar pela Araci, na tribo dos
Tocantins. Lá foi recebido com honras, como qualquer hóspede, os anciões
deram-lhe o nome de Jurandi, que significa aquele que veio da luz ou trazer
luz.
Logo ele viu Araci, e ambos ficaram encantados;
Jurandi revelou a seu pai que queria a virgem por esposa, e foi lançado as
provas de coragem entre todos os pretendentes e Jurandi venceu todas e obteve o
consentimento do pai, mas quando Jurandi, revelou sua verdadeira identidade,
tudo ficou complicado, porque o guerreiro inimigo que era seu prisioneiro, era
o irmão de Araci. Foi aí que a luta seria maior. Ubirajara, voltou à sua tribo,
libertou o prisioneiro, e convocou a todos os guerreiros de seu povo para
atacar os Tocantins, mas quando eles se preparavam para a batalha, souberam que
os tabuias, estavam em guerra com os Tocantins e ofereceram ajuda aos
araguaias, porém Ubirajara mandou um recado que não precisava de nenhum aliado
para vencer aos dois grupos.
Na guerra dos tapuias com os Tocantins, resultou na
morte do maior guerreiro dos tapuias e o chefe dos Tocantins perdeu a visão.
Quando os araguaias, chegaram na tribo tupi, Ubirajara pediu ao guerreiro cego
que lançasse seu arco e duas cetas se cruzaram no espaço e a paz foi feita
entre as duas tribos, e assim Araci, foi com o seu marido para as núpcias em
sua cabana, ela rompeu a liga da virgindade e colocou-a no braço do marido.
Estendeu a rede nupcial e foi buscar Jandira, que fora dada a ela por escrava
pelo Ubirajara, e deu ao marido como esposa, as duas se tornaram esposas do
maior guerreiro Araguaia Tocantins.
A união dessas duas nações resultou no surgimento de
uma nova nação que recebeu o nome de ubirajara, eles dominaram o deserto, por
muito tempo.
Iracema
Lenda criada por Alencar, Iracema explica poeticamente
as origens de sua terra natal. A "virgem dos lábios de mel" tornou-se
símbolo do Ceará , e o filho, Moacir nascido de seus amores com o
colonizador branco Martim representa o primeiro cearense, fruto da
integração das duas raças.
A figura de Martim Soares Moreno é histórica,
assim como a de Potí, o índio que o ajuda, conhecido em nossa história
como Felipe Camarão.
O enredo é simples : Iracema , a virgem
tabajara consagrada a Tupã, apaixona-se por Martim, guerreiro
branco inimigo dos tabajaras. Por esse amor abandona sua tribo, tornando-se
esposa do inimigo de seu povo. Quando mais tarde percebe que Martim sente
saudades de sua terra e talvez de alguma mulher, começa a sofrer. Nasce-lhe o
filho, Moacir, enquanto Martim está lutando em outras regiões. Ao voltar, ele
encontra Iracema prestes a morrer. Parte, então com o filho para outras terras.
Destaca-se, nesta obra , a linguagem bem elaborada de
Alencar. O estilo é artisticamente simples, procurando recriar a poesia natural
da fala indígena, plena de comparações e personificações, o que dá ao livro as
características de um verdadeiro poema.
Este capítulo mostra o momento em que Iracema encontra
Martim pela primeira vez. Ele estava no Brasil, em missão guerreira (conquistar
terras para a Coroa Portuguesa) e perdeu-se nas matas, acabando por chegar nos
campos dos tabajaras, a a quem ele estava combatendo.
Além, muito além daquela serra, que ainda azula no
horizonte, nasceu Iracema, da graúna, e mais longos que seu talhe de palmeira.
O favo da jati não era doce como seu sorriso; nem a
baunilha recendia no bosque como seu hálito perfumado.
Mais rápida que a ema selvagem a morena virgem corria
o sertão e as matas do Ipu, onde campeava sua guerreira tribo, da grande nação
tabajara. O pé grácil e nu, mal roçando, alisava apenas a verde pelúcia que
vestia a terra com a primeiras águas.
Um dia, ao pino do sol, ela repousava em um claro da
floresta. Banhava-lhe o corpo a sombra da oiticica, mais fresca do que o
orvalho da noite. Os ramos da acácia silvestre esparziam flores sobre os úmidos
cabelos. Escondidos na folhagem os pássaros ameigavam o canto.
Iracema saiu do banho: o aljôfar d'água ainda a
roreja, como à doce mangaba que corou em manhã de chuva. Enquanto repousa,
empluma das penas da garra, as flechas de seu arco e concerta com o sabiá da
mata, pousado no galho próximo, o canto agreste.
A graciosa ará, sua companheira e amiga, brinca junto
dela. Às vezes sobe aos ramos da árvore e de lá chama a virgem pelo nome;
outras remexe o uru de palha matizado, onde traz a selvagem seus perfumes, os
alvos fios do crautá, as agulhas da juçara com que tece a renda, e as tintas de
que matiza o algodão.
Rumor suspeito quebra a doce harmonia da sesta. Ergue
a virgem os olhos, que o sol não deslumbra; sua vista perturba-se.
Diante dela e todo a contemplá-la, está um guerreiro ,
estranho, se é guerreiro e não algum mau espírito da floresta. Tem nas faces o
branco da areias que bordam o mar; nos olhos o azul triste das águas profundas.
Ignotas armas e tecidos ignotos cobrem-lhe o corpo.
Foi rápido como o olhar, o gesto de Iracema. A flecha
embebida no arco partiu. Gotas de sangue borbulham na face do desconhecido.
De primeiro ímpeto, a mão lesta caiu sobre a cruz da
espada ; mas logo sorriu. O moço guerreiro, aprendeu na religião de sua mãe,
onde a mulher é símbolo de ternura e amor. Sofreu mais d'alma que da ferida.
O sentimento que ele pôs nos olhos e no rosto, não o
sei eu. Porém a virgem lançou de si o arco e a uiraçaba , e correu para o
guerreiro , sentida da mágoa que causar.
A mão que rápida ferira, estancou mais rápida e
compassiva o sangue que gotejava. Depois Iracema quebrou a flecha homicida. Deu
a haste ao desconhecido, guardando consigo a ponta farpada.
O guerreiro falou:
- Quebras comigo a flecha da paz?
- Quem te ensinou, guerreiro branco, a linguagem de
meus irmãos? Donde vieste a estas matas, que nunca viram outro guerreiro como
tu?
- Venho de bem longe, filha das florestas. Venho das
terras que teus irmãos já possuíram , e hoje têm os meus.
- Bem - vindo seja o estrangeiro aos campos dos
tabajaras, senhores das aldeias e à cabana de Araquém , pai de Iracema.
Diva, Resumo – prof. Landisvalth Lima
“A G.M.
Envio-lhe outro perfil de
mulher, tirado ao vivo, como o primeiro.
Deste, a senhora pode sem escrúpulo permitir a
leitura à sua neta.”
O trecho acima é o exato
início do romance Diva, de José de Alencar, publicado no ano de
1864, dois anos após Lucíola. G.M é a mesma narratária do relato
de Paulo, o grande amor da vida de Maria da Glória, a cortesã. Ele é, portanto,
o narrador também de Diva, embora o relato não tenha sido vivido
por ele. Paulo narra o que leu nas cartas enviadas a ele por Dr. Amaral, o
outro protagonista de Diva. Ou seja, Paulo é o narrador em 1ª
pessoa, mas não vive a história, é testemunha. É, de fato, também, narratário
em primeiro plano do relato de Dr. Amaral, o personagem-narrador. G.M é, por
fim, narratária de Paulo, em primeiro plano, e narratária de Dr. Amaral, em
segundo plano. Dados técnicos a parte, a narrativa é a história de Emilia
Duarte. Tudo tem início em 1856, quando Emília (Mila ou Duartezinha) tinha 14
anos. “Era uma menina muito feia, mas da fealdade núbil que promete a
donzela esplendores de beleza.
Há. meninas que se fazem
mulheres como as rosas: passam de botão a flor: desabrocham. Outras saem das
faixas como os colibris da gema: enquanto não emplumam são monstrinhos; depois
tornam-se maravilhas ou primores.
Era Emília um colibri
implume; por conseguinte um monstrinho.” Era filha do viúvo Duarte, homem rico. Moravam com
ela Leocádia, tia, e Geraldo, seu irmão. Ficou muito doente e o recém-formado
Dr. Augusto Amaral foi convocado pelo irmão para o tratamento da garota. Tentou
examiná-la. Era intocável.” Ouvi um grito. Senti nos ombros choque tão
brusco e violento, que me repeliu da borda do leito. Sobre este, sentada, de
busto erguido, hirta e horrivelmente pálida, surgira Emília. Os olhos
esbraseados cintilavam na sombra : conchegando ao seio com uma das mãos
crispadas as longas coberturas, com a outra estendida sob as amplas dobras dessa
espécie de túnica, ela apontava para a porta.
—Atrevido!... clamou o lábio
erriçado de cólera e indignação.”
Apesar da resistência, o
jovem médico não desistiu. Foram noites e dias tormentosos até vencer a
pneumonia. Sua primeira paciente estava salva. Tempos depois, Emília era a
beleza de todas as belezas. “Quando aos dezoito anos ela pôs o remate a esse
primor de escultura viva e poliu a estátua de sua beleza, havia atingido ao
sublime da arte. Podia então, e devia, ter o nobre orgulho do gênio criador.” O médico estava apaixonado, mas Emília era
uma barreira para o seu próprio coração. Para se defender do amor de Amaral, a
garota o desprezava. Quase toda narrativa é uma espécie de caça ao selvagem
coração da mimada Duartezinha e os capítulos se seguem em humilhações e
negativas. Mas Dr. Amaral amava perdidamente. Passam ainda pela história D.
Matilde, tia de Emília, e Julinha, a prima, além dos inúmeros pretendentes da
protagonista. “Cumprimentei-a. Inclinou a fronte, não para corresponder-me,
mas para esquivar-me o rosto. Quando lhe pedi a contradança, creio que ela fez
um grande esforço, porque o seu pescoço de cisne perdeu a doce flexibilidade:
ergueu a cabeça com certa aspereza.
Pôs os olhos em meu rosto, e
correu-me um olhar frio e gelado, que me transiu.
—Não, senhor; disse com a
voz seca e ríspida.
Ainda eu estava imóvel diante dela, quando
chegou-se pressuroso o Barbosinha:
—Já tem par para esta
contradança, D. Emília!
—Ainda não tenho, não
senhor; respondeu ela com a pronúncia clara e vibrante.”
Mas Emília estava longe de
ser uma menina má. Era caridosa, dedicada ao próximo. Seu problema era Dr.
Amaral, porque ela não tinha certeza que o amava. Mila só queria entregar-se a
um amor plenamente verdadeiro. A repulsa chegou ao limite. Não suportando, Augusto
Amaral afasta-se de Emília. “Não me pude mais conter:
—Adeus, D. Emília. Vejo que
minha presença começa a incomodá-la: é tempo de torná,-la mais rara e menos
importuna.
—Ah! já cansou de esperar?
respondeu com um ligeiro riso de mofa.
—Já perdi a esperança,
confesso-lhe. Já; porque enfim compreendo o que se passa em seu espírito.
—Queria que me dissesse
isso! Ficaria sabendo.
—Dir-lhe-ei; por que não? A senhora é de uma
bondade extrema e cuida que eu tenho direito à sua gratidão. Conheceu que eu a
amava, que esse amor era minha felicidade e minha vida. Pareceu-lhe que
recusar-me em troca sua afeição, era o mesmo que recusá-la a um pai, a um
irmão. Quis amar-me, porque é boa; fez todo o possível para isso, mas
debalde... O amor nasce de si mesmo, de repente, sem que o suspeitem. Se ele
viesse quando o chamamos e desaparecesse, à vontade, não era o que é, uma
fatalidade. Iludiu-se, D. Emília. O homem a quem há de amar, a senhora não o
conhece, nem o viu talvez. Quando aparecer, não lhe dará tempo de interrogar-se.
Seu coração palpitará por si mesmo, e a senhora sentirá que ama, sem saber
como, nem quando, começou a amar!
—Talvez isso seja verdade para outras; para
mim asseguro-lhe que não. O amor, como eu sonho e espero, há de ser a minha
vida inteira; portanto parece-me que tenho o direito e até o dever de
conhecê-lo antes de entregar-me a ele sem reserva e para todo o sempre.”
O afastamento acabou por
unir um pouco mais os dois. Emília pediu que Augusto voltasse ao de sempre.
Concordou, desde que ela parasse de dar esperança aos rapazes. Se não os amava,
era desnecessário iludi-los. “Uma noite veio sentar-se a meu lado, e seu
olhar envolveu-me daquela ternura compassiva e protetora, que dava à sua virgem
beleza um perfume de ideal maternidade.
—Como eu o tenho feito
sofrer, não é verdade? me disse ela compungida. Também eu sofro! Que natureza é
a minha? Parece que tenho prazer em me contrariar e afligir a mim mesma. Mas
não me queira mal, Augusto. Eu lhe prometo ser outra daqui em diante; o que
perturbou nossa amizade não sucederá nunca mais.
—Deveras!... Promete repelir
os seus adoradores!
—Eu os afastarei tanto de mim, que nem a
sombra deles se possa interpor entre nós.
—Obrigado, D. Emília!
Obrigado pela senhora, unicamente; não por mim.
—Então isso lhe é indiferente.
—Vem tarde! O mal está feito.”
É claro que Emília nunca
deixou de ser Emília. Ela só mudaria com a certeza de ter um amor perfeito.
Como estamos diante de uma obra romântica, a heroína vencerá. Mila descobre o
amor, não sem antes deixar o amado desesperançado. “—Augusto! Seu amor é um
nobre e santo amor, como eu pedia a Deus que me desse a fortuna de inspirar!...
Responder-lhe com uma dessas afeições banais a que o coração reserva apenas as
horas vagas que deixam o cálculo e a vaidade, seria uma profanação indigna!...
Espero e lhe peço que espere para não causar por engano a sua e minha desgraça;
para não ser obrigada a dizer-lhe um dia:
"Eu me iludi! Esta vida
que lhe dei, não a podia dar, não me pertencia, mas àquele de quem a roubei e agora
a reclama! Trai a um, menti ao outro; falhei meu destino; só me resta
morrer!" Eis porque eu lhe digo que espere.
Calou-se um instante.
—Talvez me iluda!... Há
horas em que duvido ainda como outrora. Quero esperar um ano ainda... Acha
muito? Para decidir de duas existências?... Se daqui a um ano eu conhecer que
não amo, a esta mesma hora, no lugar onde o senhor estiver, eu irei dizer-lhe:
"Deus negou-me a
ventura de amar; mas o senhor me ama; se a minha vida é necessária à sua
felicidade, tome-a; eu lha dou com prazer; eu lhe pertenço, sem amor, mas cheia
de dedicação!" Ouviu, Augusto?... Quer um juramento?
—É inútil! Eu já a não amo!
Fui sincero nesse momento.
Aquele sarcasmo com que Emília respondera à minha suplica, o egoísmo frio que
ela revelara, tinham traspassado minha alma, e escoado o amor até a última
gota... Eu acabava de ver, a nu, o aleijão repulsivo daquele coração de moça.”
Perdida as esperanças,
quando menos o leitor espera, nas últimas páginas, após a última carta, surge a
verdadeira última carta e a confissão do seu amor pleno. “Era quase noite. A
voz de Julinha soou no jardim, chamando a prima. Eu ia dar um último passo para
Emília; hesitei.
—Fuja, senhora!
Ela não se moveu; ficou muda
enquanto os ecos da voz de Julinha continuando a chamá-la ressoavam ao longe.
Quando o silêncio restabeleceu-se, e parecia que a prima se tinha afastado, ela
veio colocar-se em face de mim, e erigindo o talhe e cruzando os braços
afrontou-me com o olhar.
—O senhor é um infame! disse
com arrogância.
Fiz um esforço supremo;
inclinei-me para beijar-lhe a fronte.
Seu hálito abrasado passou
em meu rosto como um sopro de tormenta.
Ela atirara rapidamente para
trás a altiva cabeça, arqueando o talhe; e sua mão fina e nervosa flagelou-me a
face sem piedade, Quando dei acordo de mim, Emília estava a meus pés. Sem
sentir eu lhe travara dos pulsos e a prostrara de joelhos diante de mim, como
se a quisera esmagar. Apesar da minha raiva e da violência com que a molestava,
essa orgulhosa menina não exalava um queixume ; soltei-lhe os braços magoados e
ela caiu com a fronte sobre a areia.
—Criança!... E louca!...
murmurei afastando-me.
Emília arrastou-se de
joelhos pelo chão. Apertou-me convulsa as mãos, erguendo para mim seu divino
semblante que o pranto orvalhava.
—Perdão!... soluçou a voz
maviosa. Perdão, Augusto! Eu te amo!...
Seus lábios úmidos das
lágrimas pousaram rápidos na minha face, onde a sua, mão tinha tocado. E ela
ali estava diante de mim, e sorria submissa e amante.
Fechei os olhos. Corri
espavorido, fugindo como um fantasma a essa visão sinistra.”
A vassalagem amorosa,
praticada por Emília, parece carimbar o final ideal, comovente: —Sim! Eu te
amo!... Eu te amo!...
Eram as notas da celeste
harmonia que seu coração vibrava, como o rouxinol canta na primavera e as
harpas eólias ressoam ao sopro de Deus.
Quando ela desafogou sua
alma desta exuberância da paixão, falei-lhe :
—Mas reflita, Emília. A que
nos levará esse amor?
—Não sei!... respondeu-me
com indefinível candura. O que sei é que te amo!... Tu não és só o árbitro
supremo de minha alma, és o motor de minha vida, meu pensamento e minha
vontade. És tu que deves pensar e querer por mim... Eu?... Eu te pertenço; sou
uma cousa tua. Podes conservá-la ou destruí-la; podes fazer dela tua mulher ou
tua escrava!... É o teu direito e o meu destino. Só o que tu não podes em mim,
é fazer que eu não te ame!...
Enfim, Paulo, eu ainda a
amava!...
Ela é minha mulher.”
Com Diva, José de
Alencar nos oferece o segundo perfil de mulher. O terceiro e último será
Aurélia Camargo, de Senhora, publicado em 1875.
-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x
José de Alencar criou uma literatura nacionalista em que se
evidencia uma maneira de sentir e pensar tipicamente brasileiras. Suas obras
são especialmente bem sucedidas quando o autor transporta a tradição indígena
para a ficção. Tão grande foi a preocupação de José de Alencar em retratar sua
terra e seu povo que muitas das páginas de seus romances relatam mitos, lendas,
tradições, festas religiosas, usos e costumes observados pessoalmente por ele,
com o intuito de, cada vez mais, “abrasileirar” seus textos.
Ao lado da
literatura, José de Alencar foi um político atuante — chegou a ocupar o cargo
de ministro da Justiça do gabinete do visconde de Itaboraí — e foi um prestigiado
deputado do Partido Conservador por quatro legislaturas. Todas as reformas
pelas quais lutou propunham a manutenção do regime monárquico (ver Monarquia)
e da escravatura (ver Escravidão).
Famoso a ponto de ser aclamado por Machado de
Assis como “o chefe da literatura nacional”, José de Alencar morreu aos 48
anos, no Rio de Janeiro, deixando seis filhos, inclusive Mário de Alencar, que
seguiria a carreira de letras do pai.