por: Landisvalth Lima
Período vai de 1500 a 1601.
- Não forma escola literária.
- Os jesuítas da Companhia de Jesus iniciaram a nossa literatura.
Chegaram em 1549.
- A literatura desenvolvida nesse período é catequética, informativa e de
pouco valor artístico.
- A literatura de informação foi desenvolvida por cronistas e viajantes.
A preocupação básica era com a descrição da terra, da gente e dos costumes do
lugar.
Principais cronistas:
1 – Pero de
Magalhães Gândavo:
Obra principal: História
da província de Santa Cruz a que vulgarmente chamamos Brasil.
A “História da província de Santa Cruz”
Maria Clara
Paixão de Sousa
“A causa principal que me obrigou a lançar
mão da presente história, e sair com ela a luz, foi por não haver até agora
pessoa que a empreendesse, havendo já setenta e tantos anos que esta província
é descoberta”... (Trecho
do "Prólogo ao leitor")
Com essas palavras Pero Magalhães de
Gândavo abre o Prólogo ao leitor da sua História da
Província de Santa Cruz, o primeiro livro inteiramente dedicado ao Brasil
escrito por um autor português.
Esta obra de Gândavo hoje ocupa um
incontestável e merecido lugar de destaque: considerada “a primeira história
do Brasil”, leitura obrigatória para os interessados no período colonial,
foi recentemente objeto de excelentes edições comentadas e diversos trabalhos
acadêmicos. É difícil imaginar, diante disso, que este relato pioneiro tenha
permanecido escondido do mundo durante os trezentos anos que se seguiram à sua
primeira impressão em 1576.
Mas a verdade é que a atenção em torno
da obra de Gândavo só teve início no século XIX, depois da tradução francesa de
Henri Ternaux em 1837 – até então, o livro de Pero de Magalhães havia sido
deixado em relativo esquecimento pelos portugueses, como observa o tradutor em
seu prefácio: “Desgraçadamente, a indiferença dos portugueses e espanhóis,
mesmo para os seus melhores autores, impediu que esta obra fosse outra vez
reimpressa. Tornou-se tão excessivamente rara, que não se encontrariam agora
senão três ou quatro exemplares; não se acha em nenhuma Biblioteca Pública de
Paris, e é raramente citada pelos autores portugueses que têm tratado do Brasil”.
De fato, os séculos XVII e XVIII só viram surgir duas cópias manuscritas –
anônimas – do livro impresso em 1576, que circularam obscuramente entre
aficionados em Portugal.
Duas décadas depois da tradução de
Ternaux, surgem duas novas edições impressas portuguesas da “História”,
as duas no ano de 1858: uma oferecida pela Academia de Ciências, a outra pelo
Instituto Histórico e Geográfico – ambas agora disponíveis em versão digital na
Brasiliana-USP.
O “esquecimento” secular da obra de
Gândavo se insere no contexto geral das discussões sobre o lugar reservado
pelos portugueses às notícias, relatos de viagens e descrições das suas
possessões na América ao longo do século XVI. Interpretado por alguns
historiadores como simples desprezo, e por outros como estratégia diplomática
perspicaz, esse “esquecimento” – ou segredo ? – resultou, de todo modo, na
dificuldade que hoje encontramos na tarefa de contextualizar algumas dessas
obras e seus autores.
É esse certamente o caso da “História”
de Gândavo: pouco se sabe sobre o autor e o contexto da construção de seu
relato, estando hoje em debate até se Pero Magalhães algum dia chegou a colocar
os pés nas terras que descreve no livro. Alguns especialistas consideram mais
provável que Gândavo tenha reunido as informações apresentadas na “História”
ao longo dos anos que antecedem a publicação do texto, quando teria trabalhado
nos arquivos da Torre do Tombo justamente com a tarefa de reunir e traduzir
papéis relativos à ocupação das colônias. Outros, ainda, afirmam que Pero
Magalhães teria estado na verdade na Índia enquanto escrevia a primeira
história do Brasil...
No texto de Gândavo, por outro lado, o
que o leitor vai encontrar são momentos de grande prazer de leitura. A obra é
apresentada por ninguém menos que Luís de Camões, que ofereceu tercetos e
sonetos inéditos para anteceder as páginas em que Magalhães “tece sua breve
história para ilustrar a terra Santa Cruz pouco sabida”. Camões e Gândavo
foram contemporâneos e companheiros em diferentes contextos – entre os quais, o
de compartilharem a mesma oficina tipográfica, de Antonio Gonçalves. A obra de
Gândavo é, na esfera historiográfica, também companheira da obra de Camões, no
seu desejo de elevar e imortalizar os grandes feitos dos portugueses. Na sua “História”,
Gândavo relata as “cousas dignas de grande admiração” que há nesta
província, para “dá-las a perpétua memória, como costumavam os Antigos: aos
quais não escapava coisa alguma que por extenso não reduzissem a história, e
fizessem menção em suas escrituras de coisas menores que estas, as quais hoje
em dia vivem entre nós como sabemos, e viverão eternamente”
E por fim, tenha sido ou não o autor “testemunha
de vista” (como diz ter sido) dos acontecimentos e das cenas dignas de
admiração que relata, uma coisa é certa: o texto de Gândavo é tão vivo, corre
com um estilo tão limpo e fluente, que as imagens que ele desenha com as
palavras se levantam vivas diante dos olhos do leitor: imagens de rios
caudalosos e seus peixes estranhos; imagens de tatus, onças e antas; imagens de
batalhas medonhas e terríveis monstros marinhos... Quase nos sentimos “testemunhas
de vista” nós, que o lemos quase quinhentos anos depois.
(http://www.brasiliana.usp.br)
Em suma:
- Faz um histórico da descoberta do Brasil e de suas primeiras povoações.
- Há descrições das capitanias hereditárias.
- Registra o modo de viver dos habitantes brasileiros na época dos
governos-gerais.
Outra obra do autor: Tratado da terra do Brasil
2 – Gabriel
Soares de Souza:
Colonizador dono de engenho, comerciante,
sertanista e navegador português nascido em Ribatejo, conhecido por ter escrito
Tratado descritivo do Brasil (1587), um tratado que constitui um dos primeiros
e mais extraordinários relatos sobre o Brasil colonial, que contém importantes
dados geográficos, botânicos, etnográficos e lingüísticos, e publicado
postumamente por Varnhagen (1879), em Lisboa.
Membro da expedição naval de Francisco Barreto, que
partira com destino à África, mas acabou por chegar ao Brasil. Estabelecido na
Bahia (1569), montou o engenho Jaguaripe. Voltou a Portugal (1584) para obter
da corte o privilégio de exploração de minérios e pedras preciosas ao longo do
rio São Francisco.
Enquanto aguardava a permissão régia escreveu seu
famoso tratado, dividido em duas partes: Roteiro geral e Memorial das grandezas
da Bahia, descrevendo informações sobre geografia, costumes dos índios,
agricultura, animais e plantas brasileiros.
Nomeado governador e capitão-mor da conquista das
Minas, regressou ao Brasil com 360 colonos, quatro freiras carmelitas e o
governador-geral do Brasil, D. Francisco de Sousa. Chegando à Bahia, empreendeu
uma expedição que percorreu mais de cem léguas do rio São Francisco, mas morreu
de uma febre em pleno sertão, após atingir as nascentes do rio Paraguaçu.
Fonte: http://www.dec.ufcg.edu.br/biografias/
Obra principal: Tratado descritivo do Brasil
Tratado descritivo do Brasil
– Gabriel Soares de Sousa.
- Em Tratado descritivo do Brasil em 1587, de Gabriel Soares de Sousa, há
uma pequena enciclopédia que registra observações sobre a natureza e a gente do
Brasil. A capitania da Bahia aparece com destaque.
- Há preocupação constante do autor com a possibilidade de
aproveitamento, povoamento e exploração da terra brasileira.
- Na obra há referências à expedição costeira de 1501, comandada por Gonçalo
Coelho, para reconhecimento da nova terra.
- O autor cita que a expedição de Cristóvão Jacques encontrou 2 navios
franceses na Bahia de todos os santos e os bombardeou. O nome da baía foi dado
pelo navegador.
- No documento há um relato sobre a capitania de São Vicente, primeira
vila do Brasil e primeira a produzir açúcar. O capitão era Martim Afonso de
Sousa.
- No texto há citações sobre a empreitada de Martim Afonso de Sousa em
direção ao interior do rio da Prata. Nesta investida, várias embarcações foram
perdidas e muitos morreram.
- No texto há referências a Tomé de Sousa, fundador da cidade do
Salvador.
- Há ainda detalhamento de como a cidade do Salvador foi edificada. Casas
foram construídas, muros foram edificados e a artilharia protegia a cidade. Um colégio de Jesuítas
também foi erguido.
- O autor relata a falta de 3 letras no idioma dos Tupinambás, o Tupi: o
F, o L e o R.
- Há relatos também dos índios que, desgostosos, resolvem cometer
suicídio comendo areia.
3 – Padre Fernão Cardim:
Obra principal:
Tratado da terra e da gente
do Brasil
- Registra as frutas nativas
e as trazidas de outros continentes.
- Há o relato de uma estranha arvora que tem água.
- Descreve as árvores que fornecem madeira de qualidade.
- Fala ainda das ervas, dos animais nativos e daqueles que vieram da
Europa.
Fernão Cardim nasceu
em Viana de Alvito, em 1548 ou 1549. Entrou em uma companhia em 1566 de
fevereiro no qual passou 20 anos com o irmão e padre.Na viagem ao Brasil ele
acompanhou o padre visitador Cristóvão de Gouveia,no mesmo navio embarcou o
primeiro governador Felipe II,no qual acompanhou ele passando pela Bahia, Pernambuco,
Rio de Janeiro, São Vicente, chegando até Itanhaí. Viajou com Anchieta
para o sul do Brasil e assistiu as festas do trigésimo aniversario da cidade de
São Paulo. Dois anos depois o visitador Cristóvão voltou a Portugal, mas Fernão
permaneceu. Passou alguns anos no Rio,e depois para a Europa,pois ele foi
eleito procurador da província do Brasil e levou seus manuscritos. Quando
retornou em 1601seu navio foi capturado pelo pirata Frances Francis Cook e seus
manuscritos foram vendidos por Cook que publicou em 1605.
4 – Pero Vaz de
Caminha:
Obra: Carta do achamento do Brasil
A Carta
- Relata ao rei de Portugal o descobrimento.
- Indica que os índios eram pardos e andavam nus.
- As datas sobre a descoberta são precisas.
- O contato entre portugueses e indígenas foi pacífico. Houve até troca
de objetos.
- Registra as duas missas acontecidas em 1º de maio.
- Indica que só uma mulher participou da missa.
- Registra que dois degredados, os primeiros habitantes brancos, foram
aqui deixados.
- Prega a necessidade de difundir a fé cristã entre os indígenas.
- Há clara preocupação comercial com a terra descoberta.
Senhor,
posto que o Capitão-mor desta Vossa frota, e assim os
outros capitães escrevam a Vossa Alteza a notícia do achamento desta Vossa
terra nova, que se agora nesta navegação achou, não deixarei de também dar
disso minha conta a Vossa Alteza, assim como eu melhor puder, ainda que -- para
o bem contar e falar -- o saiba pior que todos fazer!
Todavia tome Vossa Alteza minha ignorância por boa
vontade, a qual bem certo creia que, para aformosentar nem afear, aqui não há
de pôr mais do que aquilo que vi e me pareceu.
Da marinhagem e das singraduras do caminho não darei aqui
conta a Vossa Alteza -- porque o não saberei fazer -- e os pilotos devem ter
este cuidado.
E portanto, Senhor, do que hei de falar começo:
E digo quê:
A partida de Belém foi -- como Vossa Alteza sabe,
segunda-feira 9 de março. E sábado, 14 do dito mês, entre as 8 e 9 horas, nos
achamos entre as Canárias, mais perto da Grande Canária. E ali andamos todo
aquele dia em calma, à vista delas, obra de três a quatro léguas. E domingo, 22
do dito mês, às dez horas mais ou menos, houvemos vista das ilhas de Cabo
Verde, a saber da ilha de São Nicolau, segundo o dito de Pero Escolar, piloto.
Na noite seguinte à segunda-feira amanheceu, se perdeu
da frota Vasco de Ataíde com a sua nau, sem haver tempo forte ou contrário para
poder ser !
Fez o capitão suas diligências para o achar, em umas e
outras partes. Mas... não apareceu mais !
E assim seguimos nosso caminho, por este mar de longo,
até que terça-feira das Oitavas de Páscoa, que foram 21 dias de abril, topamos
alguns sinais de terra, estando da dita Ilha -- segundo os pilotos diziam, obra
de 660 ou 670 léguas -- os quais eram muita quantidade de ervas compridas, a
que os mareantes chamam botelho, e assim mesmo outras a que dão o nome de
rabo-de-asno. E quarta-feira seguinte, pela manhã, topamos aves a que chamam
furabuchos.
Neste mesmo dia, a horas de véspera, houvemos vista de
terra! A saber, primeiramente de um grande monte, muito alto e redondo; e de
outras serras mais baixas ao sul dele; e de terra chã, com grandes arvoredos;
ao qual monte alto o capitão pôs o nome de O Monte Pascoal e à terra A Terra de
Vera Cruz!
Mandou lançar o prumo. Acharam vinte e cinco braças. E
ao sol-posto umas seis léguas da terra, lançamos ancoras, em dezenove braças --
ancoragem limpa. Ali ficamo-nos toda aquela noite. E quinta-feira, pela manhã,
fizemos vela e seguimos em direitura à terra, indo os navios pequenos diante --
por dezessete, dezesseis, quinze, catorze, doze, nove braças -- até meia légua
da terra, onde todos lançamos ancoras, em frente da boca de um rio. E chegaríamos
a esta ancoragem às dez horas, pouco mais ou menos.
E dali avistamos homens que andavam pela praia, uns
sete ou oito, segundo disseram os navios pequenos que chegaram primeiro.
Então lançamos fora os batéis e esquifes. E logo
vieram todos os capitães das naus a esta nau do Capitão-mor. E ali falaram. E o
Capitão mandou em terra a Nicolau Coelho para ver aquele rio. E tanto que ele
começou a ir-se para lá, acudiram pela praia homens aos dois e aos três, de
maneira que, quando o batel chegou à boca do rio, já lá estavam dezoito ou
vinte.
Pardos, nus, sem
coisa alguma que lhes cobrisse suas vergonhas. Traziam arcos nas mãos, e suas
setas. Vinham todos rijamente em direção ao batel. E Nicolau Coelho lhes fez
sinal que pousassem os arcos. E eles os depuseram. Mas não pôde deles haver
fala nem entendimento que aproveitasse, por o mar quebrar na costa. Somente
arremessou-lhe um barrete vermelho e uma carapuça de linho que levava na
cabeça, e um sombreiro preto. E um deles lhe arremessou um sombreiro de penas
de ave, compridas, com uma copazinha de penas vermelhas e pardas, como de
papagaio. E outro lhe deu um ramal grande de continhas brancas, miúdas que
querem parecer de aljôfar, as quais peças creio que o Capitão manda a Vossa
Alteza. E com isto se volveu às naus por ser tarde e não poder haver deles mais
fala, por causa do mar.
À noite seguinte ventou tanto sueste com chuvaceiros
que fez caçar as naus. E especialmente a Capitaina. E sexta pela manhã, às oito
horas, pouco mais ou menos, por conselho dos pilotos, mandou o Capitão levantar
ancoras e fazer vela. E fomos de longo da costa, com os batéis e esquifes
amarrados na popa, em direção norte, para ver se achávamos alguma abrigada e
bom pouso, onde nós ficássemos, para tomar água e lenha. Não por nos já minguar,
mas por nos prevenirmos aqui. E quando fizemos vela estariam já na praia
assentados perto do rio obra de sessenta ou setenta homens que se haviam
juntado ali aos poucos. Fomos ao longo, e mandou o Capitão aos navios pequenos
que fossem mais chegados à terra e, se achassem pouso seguro para as naus, que
amainassem.
E velejando nós pela costa, na distância de dez léguas
do sítio onde tínhamos levantado ferro, acharam os ditos navios pequenos um
recife com um porto dentro, muito bom e muito seguro, com uma mui larga
entrada. E meteram-se dentro e amainaram. E as naus foram-se chegando, atrás
deles. E um pouco antes de sol-pôsto amainaram também, talvez a uma légua do
recife, e ancoraram a onze braças.
E estando Afonso Lopez, nosso piloto, em um daqueles
navios pequenos, foi, por mandado do Capitão, por ser homem vivo e destro para
isso, meter-se logo no esquife a sondar o porto dentro. E tomou dois daqueles
homens da terra que estavam numa almadia: mancebos e de bons corpos. Um deles
trazia um arco, e seis ou sete setas. E na praia andavam muitos com seus arcos
e setas; mas não os aproveitou. Logo, já de noite, levou-os à Capitaina, onde
foram recebidos com muito prazer e festa.
A feição deles é serem pardos, um tanto avermelhados,
de bons rostos e bons narizes, bem feitos. Andam nus, sem cobertura alguma. Nem
fazem mais caso de encobrir ou deixa de encobrir suas vergonhas do que de
mostrar a cara. Acerca disso são de grande inocência. Ambos traziam o beiço de
baixo furado e metido nele um osso verdadeiro, de comprimento de uma mão
travessa, e da grossura de um fuso de algodão, agudo na ponta como um furador.
Metem-nos pela parte de dentro do beiço; e a parte que lhes fica entre o beiço
e os dentes é feita a modo de roque de xadrez. E trazem-no ali encaixado de
sorte que não os magoa, nem lhes põe estorvo no falar, nem no comer e beber.
Os cabelos deles são corredios. E andavam tosquiados,
de tosquia alta antes do que sobre-pente, de boa grandeza, rapados todavia por
cima das orelhas. E um deles trazia por baixo da solapa, de fonte a fonte, na
parte detrás, uma espécie de cabeleira, de penas de ave amarela, que seria do
comprimento de um coto, mui basta e mui cerrada, que lhe cobria o toutiço e as
orelhas. E andava pegada aos cabelos, pena por pena, com uma confeição branda
como, de maneira tal que a cabeleira era mui redonda e mui basta, e mui igual,
e não fazia míngua mais lavagem para a levantar.
O Capitão, quando eles vieram, estava sentado em uma
cadeira, aos pés uma alcatifa por estrado; e bem vestido, com um colar de ouro,
mui grande, ao pescoço. E Sancho de Tovar, e Simão de Miranda, e Nicolau
Coelho, e Aires Corrêa, e nós outros que aqui na nau com ele íamos, sentados no
chão, nessa alcatifa. Acenderam-se tochas. E eles entraram. Mas nem sinal de
cortesia fizeram, nem de falar ao Capitão; nem a alguém. Todavia um deles fitou
o colar do Capitão, e começou a fazer acenos com a mão em direção à terra, e
depois para o colar, como se quisesse dizer-nos que havia ouro na terra. E
também olhou para um castiçal de prata e assim mesmo acenava para a terra e
novamente para o castiçal, como se lá também houvesse prata!
Mostraram-lhes um papagaio pardo que o Capitão traz
consigo; tomaram-no logo na mão e acenaram para a terra, como se os houvesse
ali.
Mostraram-lhes um carneiro; não fizeram caso dele.
Mostraram-lhes uma galinha; quase tiveram medo dela, e
não lhe queriam pôr a mão. Depois lhe pegaram, mas como espantados.
5 – Pero Lopes
de Souza:
Navegador português nascido em Lisboa (1497), autor do
famoso Diário da navegação de Pero Lopes
de Sousa (1530-1532) que se tornou o mais importante relato sobre a
expedição de seu irmão ao Brasil, no início do século XVI. Irmão mais velho de
Martim Afonso de Sousa, o acompanhou como piloto e imediato na expedição enviada
ao Brasil pelo rei D. João III (1530) e explorou o estuário do rio da Prata
(1531). Na volta a Portugal (1532), aprisionou nas costas de Pernambuco, dois
navios franceses, o que aumentar seu prestígio junto à corte. Em Portugal
escreveu um roteiro de sua viagem ao Brasil, o Diário da navegação de Pero
Lopes de Sousa, descoberto pelo historiador Francisco Adolfo de Varnhagem e
publicado em Lisboa (1839). Além de conter a sua biografia e a do irmão, a obra
narra, entre outros episódios, a fundação das vilas de São Vicente e
Piratininga. As elucidações e notas tratam do descobrimento do Rio de Janeiro,
do rio da Prata e da ilha de Fernando de Noronha. Em sua última viagem, partiu
como capitão-mor de uma esquadra de seis navios, o navegador zarpou novamente
de Lisboa (1539) rumo à Índia, porém na viagem de retorno, no mesmo ano,
naufragou com a nau Galega em São Lourenço, perto de Madagascar, e desapareceu
para sempre.
Diário da navegação, em suma:
- Documenta
dia-a-dia os acontecimentos da expedição comandada por Martin Afonso de Sousa,
seu irmão.
- É um texto
técnico com o registro freqüente de referências náuticas.
- O início do
relato é de 12 de março de 1531.
- Registra o
encontro com Diogo Álvares Correia, o Caramuru, na Bahia.
- Relata que a
expedição passou 91 dias na baía da Guanabara.
- Registra o
encontro com a figura do Bacharel, provavelmente um dos degredados deixados por
Cabral, encontrada em Cananeia, ao sul de São Vicente.
- O relato do texto
vai até o dia 28 do mês de setembro de 1531.
6 – O Piloto Anônimo
A Relação do piloto anônimo é, ao lado das
cartas de Pero Vaz de Caminha e de Mestre João, um dos três testemunhos diretos
do descobrimento do Brasil. Depois da Carta de Caminha, relata o momento
inicial da construção da imagem do nativo pelo portugueses (vide "Brasiliana
da Biblioteca Nacional", Rio de Janeiro, 2001, página 26). O relato
foi publicado, em italiano, na coletânea de viagens organizada por Fracanzano
da Montalboddo e intitulada: "Paesi Novamente Retrovati et Novo Mondo de
Alberico Vesputio Florentino Intitulato" (Vicenza, 1507, folhas 58 a 77,
capítulos 63 a 83).
Diz a Brasiliana da Biblioteca Nacional",
Rio de Janeiro, 2001, página 26:
"A política de sigilo, verdadeira ou falsa, do
governo português referentemente ao Brasil gerou uma perda irreparável,
representada no diminuto número de obras que noticiavam a existência da ilha de
Vera Cruz, conforme constatou Francisco Leite de Faria (1972, Moçambique) ao
lembrar que ´os impressos publicados em Portugal, no século XVI, respeitante
exclusivamente ao Brasil, são poucos, raros e preciosos.´" A própria Carta
de Caminha só seria publicada pelo Padre Manuel Aires de Casal em sua "Corografia
brasílica", pela Imprensa Régia, no Rio de Janeiro, em 1817!
Montalboddo diz ter traduzido um original em português
do qual nunca se achou o paradeiro. A primeira versão em português data de
1812, de autoria de Trigoso de Aragão Morato. Trata-se de uma retroversão,
vinda a público na "Coleção de Notícias para a História e Geografia das
Nações Ultramarinas". Baseia-se numa versão italiana publicada por Giovan
Battista Ramusio, em 1550, com o título "Navigationi del Capitano Pedro
Alvares Cabral Scrita per un Piloto Portoghese et Tradotta di Lingua Portoghese
in Italiana" (In: "Primo Volume della Navigationi et
Viaggi...").
Giovan Battista Ramusio é o primeiro a atribuir a um
piloto a autoria da relação (cujo significado aqui é o de "relato")
mas é pouco provável que o autor desempenhasse esse ofício. A própria narrativa
quase desautoriza a suposição, desprovida das observações de natureza técnica
comuns em diários escritos por pilotos de navio.
Alguns historiadores creem que Giovanni Matteo
Cretico, núncio em Lisboa, seria o autor, tendo compilado ou traduzido uma
narrativa anônima, remetendo-a, em seguida, ao cronista de Veneza, Domenico
Malipiero. Daí a edição italiana de 1507. Há restrições a essa suposição, pois
o núncio não dominava a língua portuguesa, sendo-lhe impossível compilar ou
traduzir um texto. Mais plausível é a hipótese de William Greenlee, que, depois
de promover cuidadoso levantamento dos homens alfabetizados que retornaram com
a armada cabralina, asseverou ser o autor João de Sá, escrivão da armada.
Incertezas à parte, a "Relação..." é um
documento importante para os que querem conhecer a empresa marítima de Cabral.
No que se refere ao descobrimento, a narrativa pouco acrescenta à Carta de Pero
Vaz de Caminha (da qual o autor, aliás, morreu em Calecute). Nada mais nos dá a
conhecer sobre a viagem entre Cabo Verde e a costa do Brasil, sobre as
características dos nativos ou sobre os primeiros contatos com eles. Limita-se
a confirmar o que, de forma mais colorida, descrevem as outras duas testemunhas
do acontecimento.
O interessante do relato é continuar com a armada de
Pedro Álvares Cabral e narrar suas desventuras. Trata-se do único testemunho
direto sobre a segunda viagem dos portugueses à costa da Índia, viagem
importante para realizar o que Vasco da Gama não conseguira em 1497 e 1498:
estabelecer relações comerciais permanentes com a cidade de Calicute e firmar
presença na região. Cabral, quando retornou a Lisboa, foi recebido mais como o
responsável por um desastre político e comercial do que como o audaz
descobridor de uma rica e promissora terra.
Assim sendo, conclui o autor de "Brasiliana da
Biblioteca Nacional", página 33, evocando o Relato do Piloto Anônimo e
a "Copia de una littera del Re de Portogallo" etc. mencionada no
verbete sobre Pedro Álvares Cabral: ´O fato de as duas primeiras fontes
impressas sobre a viagem da armada de Pedro Álvares Cabral terem sido
divulgadas no estrangeiro anonimamente contribuiu para o conhecimento
imperfeito desse evento histórico que abre o Atlântico Sul à expansão do
capitalismo e inaugura o advento da idade moderna. Essa primeira coletânea de
viagens organizada por Montalboddo logo no início do século XVI teve grande
fortuna editorial no século XVI e, com reedições e traduções, chegando a 35
diferentes impressões, conforme demonstrou Francisco Leite de Faria.´
(Wikipédia).
Relação da viagem de Pedro Álvares Cabral – Piloto
anônimo
- Relato de autor
desconhecido, publicado alguns anos após a descoberta.
- Datas diferentes das existentes na carta de Pero Vaz de Caminha. Aqui o
Brasil foi descoberto dia 24 de abril de 1500.
- Indica que a primeira missa foi realizada na praia, dia 26 de abril.
- Trata da vida indígena, inclusive relatando a pesca de um peixe do
tamanho de um tonel.
- Registra que os índios consolavam os degredados quando foram deixados
no Brasil.
- Relata que Cabral mandou uma embarcação para levar a carta de Caminha
ao Rei de Portugal.
- Faz todo o relato da viagem, inclusive o retorno a Portugal.
- Registra o texto que apenas seis naus retornaram da viagem.
- No retorno, encontraram a expedição de Américo Vespúcio – que faria a
1ª expedição ao Brasil, em 1501.
Trecho para leitura:
Dos papagaios da terra há pouco descoberta
Não vimos neste lugar nem ferro nem outros metais. Os homens da terra cortam a madeira com pedras. Pássaros há muitos e de variados tipos, especialmente papagaios, os quais podem ser de muitas cores e alcançar o tamanho de uma galinha. Há outras aves igualmente belas, cujas plumagens são usadas pelos homens da terra para fazer os chapéus e barretes que usam. A terra é abundante em árvores de diferentes tipos e tem uma água excelente, além de inhames e algodão. Não vimos nenhum animal.
O lugar é grande e não sabemos se é ilha ou terra firme, porém, por sua grandeza supomos tratar-se de terra firme. O clima é muito bom. Os homens da terra, que são grandes pescadores, confeccionam umas redes e pescam variados tipos de peixe. Vimos um exemplar por eles pescado que tinha o tamanho de um tonel, mas era mais comprido e mais redondo, sem dentes e com a cabeça semelhante à de um porco. Seus olhos eram pequenos e suas orelhas, longas como um braço e largas como meio braço.
Por baixo do corpo, esse peixe tinha dois furos e sua cauda era do comprimento e da largura de um braço. Pés não se viam em nenhum lugar. A sua pele tinha pêlos como a do porco e era da grossura de um dedo. A sua carne era branca e gorda como a do porco.
Durante os dias em que estivemos ancorados, o capitão fez saber ao nosso sereníssimo rei do achamento desta terra e deixou nela dois bandidos, condenados à morte, que trazíamos na armada com esse propósito. O capitão prontamente despachou um pequeno navio de mantimentos, que acompanhava as 12 naus da esquadra, com cartas para o rei, relatando tudo quanto se tinha visto e descoberto. A seguir, desembarcou, mandou fazer uma grande cruz de madeira e determinou que a fixassem no solo. Os dois bandidos que tinham ficado no lugar puseram-se a chorar quando da partida, sendo consolados pelos homens da terra, que demonstraram ter piedade deles.
7 – Andre Thevet
Franciscano,
explorador e escritor francês nascido em Angoulême, hoje uma comuna francesa
situada no departamento de Charente, na região Poitou-Charentes, cosmógrafo da
expedição do calvinista Nicolas Durand
de Villegaignon (1510-1571) que viajou ao Brasil na missão para
fundar a França Antártica (1556), objetivando implantar uma colônia
francesa no território brasileiro para abrigar protestantes perseguidos e abrir
espaço para a exploração mercantil. Cosmógrafo de quatro reis, de Henrique II a Henrique III, era capelão de Catarina de Médicis, quando resolveu acompanhar Villegaignon em sua aventura de
colonização francesa no Brasil (1555). Esteve no Rio de Janeiro por menos três
meses consecutivos (1555-1556), pois ficou doente e teve de ser repatriado.
Escritor prolífico, a brevíssima estada não o impediu de escrever sobre vários
aspectos da natureza e dos povos americanos e recebeu o real privilégio para
publicação da obra Les singularitez de la France Antarctique, autrement
nommee Amerique, & de plusieurs terres et isles decouvertes de nostre temps.
Lançado em Paris (1558) com grande sucesso, a obra foi traduzida e publicada em
italiano (1561) e em inglês (1568). Com a ajuda dos índios locais, ferrenhos
inimigos dos portugueses, os franceses permaneceram no Rio de Janeiro até serem
expulsos (1567) pelo Governador-Geral Mem
de Sá (1500-1572) e seu sobrinho
Estácio de Sá (1520-1567). Na obra descreveu as suas impressões acerca
dos primeiros tempos da tentativa francesa de fundação, na América do Sul, na
baía de Guanabara, de uma colônia denominada como França Antártica. Foi
ele quem criou a expressão França Antártica (1557) e posteriormente
culpou os huguenotes, como eram chamados os calvinistas franceses, pelo
fracasso da colônia. Esse ataque envolveu uma grande polêmica religiosa com o
calvinista Jean de Léry (1534-1611),
justificando a obra deste último Histoire d'un voyage faict en la terre du
Brésil, autrement dite Amérique (1578), sobre a mesma aventura. Também
escreveu La Cosmographie Universelle, Paris (1575). Foi também guarda
das curiosidades reais, abade de Masdion, em Sanitonge, e morreu em Paris, aos
88 anos. Escreveu, em português atualizado, ... Ostras agarravam-se às
raízes das árvores de mangue, formando verdadeiros cachos. Estas raízes eram
cortadas pelos indígenas quando em maré baixa, que preferiam as ostras menores
do manguezal às maiores do mar por serem aquelas mais saborosas e sadias e
estas causadoras de febres... Ele assegurava em seus escritos que os
selvagens da América não viviam nos campos e florestas como animais e nem
tinham seus corpos recobertos de pêlos, como ursos, cervos ou leões, afirmando
seguramente que a aparência dos nativos era exatamente o oposto do que os
pintores do Velho Mundo pincelavam os selvagens ameríndios. Seus escritos e
ilustrações comprovavam a existência de homens com corpos lisos e bem
cuidados.
Obra:
As singularidades da França Antártida
- Descreve a América como descoberta por Vespúcio e vê seus habitantes
como estranhos, selvagens, sem lei e sem religião.
- Descreva uma árvore frutífera chamada Pacoveira, na verdade se trata da
bananeira.
- Descreve como os índios fazem orifícios no corpo, inclusive furando os
lábios com planta aguçada.
- Mostra como as mulheres gostavam de pintar o rosto de preto quando em
visita a doentes.
8 – Jean de Léry
Missionário protestante francês nascido em 1534, em La
Margelle, na região de Yonne, e falecido em 1613, em L'Isle, na Suíça. Durante
a sua vida publicou duas obras sobre a sua estadia no Brasil e mais duas sobre
Sancerre, em que descreve a história e cerco da cidade.
O jovem Jean de Léry embarca em 1556, como missionário para a recém-criada colónia francesa de Fort-Coligny, na baía de Guanabara, Rio de Janeiro, Brasil. Aqui, Nicolas Durand de Villegaignon fundara a França Antártica, mas como católico que era, não acolheu bem os missionários protestantes e expulsou-os da colónia. Após dois meses a viver na companhia dos índios Tupinambás, Jean de Léry e alguns dos seus companheiros decidiram regressar a França. Os que teimaram em ficar em Fort-Coligny acabaram por ser massacrados às ordens de Villegaignon.
O jovem Jean de Léry embarca em 1556, como missionário para a recém-criada colónia francesa de Fort-Coligny, na baía de Guanabara, Rio de Janeiro, Brasil. Aqui, Nicolas Durand de Villegaignon fundara a França Antártica, mas como católico que era, não acolheu bem os missionários protestantes e expulsou-os da colónia. Após dois meses a viver na companhia dos índios Tupinambás, Jean de Léry e alguns dos seus companheiros decidiram regressar a França. Os que teimaram em ficar em Fort-Coligny acabaram por ser massacrados às ordens de Villegaignon.
A viagem de regresso foi atribulada e a chegada a solo
francês não foi melhor. Sem suspeitarem de nada, os missionários levavam
consigo uma carta, em que Villegaignon ordenava a prisão e execução imediata
destes. Mas as autoridades francesas, igualmente protestantes, ignoraram a
ordem.
Jean de Léry estava em Sancerre quando se deu o
Massacre de São Bartolomeu, a 24 de agosto de 1572, em que os católicos
perseguiram ferozmente os protestantes. O cerco à cidade foi prolongado e Léry
ensinou aos seus companheiros alguns truques de sobrevivência que aprendera com
os Tupinambás do Brasil. Desta experiência nasceram os seus dois livros: História Memorável do Cerco de
Sancerre e História Memorável da Cidade de
Sancerre publicados dois anos
depois. Contudo, a fama de Léry enquanto escritor deve-se ao seu livro História de uma Viagem às Terras do
Brasil, onde relata as experiências vividas e registadas no seu diário de
bordo. Foi publicado somente em 1578 depois de vários contratempos. Viveu os
seus últimos anos de vida como pastor em Genebra.
Viagem à terra do Brasil – Jean de Léry
- Registra que as tribos nunca passavam mais de 6 meses em um lugar.
- Mostra que os índios teciam suas redes de dormir.
- Indica a bebida preferida pelos índios: o cauim.
- Registra que as mulheres choravam ao receber os visitantes.
- O autor teve um desentendimento com um Tupinambá, mas não houve briga.
9 – Hanz Staden
Hans Staden em duas viagens ao Brasil e uma breve comparação com a
carta de Pero Vaz de Caminha
(por Felipe Aguiar Chimicatti)
Assim, Senhor, a inocência desta gente é tal,
que a de Adão não seria maior, quanto a vergonha
Pero Vaz de Caminha
que a de Adão não seria maior, quanto a vergonha
Pero Vaz de Caminha
A literatura de viagem adormece sob um caráter
essencialmente revelador: Quer ela nos contar o que o viajante assistiu,
projetando em nosso imaginário o aparecimento descritivo de uma realidade
diversa, vista através de um olhar particular. O assistir, no entanto, não
passa de literatura centrada na impressão pessoal: As narrativas seguem,
invariavelmente, pontos de vista. Quando os peninsulares europeus se lançaram
ao oceano em busca de especiarias, tinham em mente a menor das idéias do que
encontrariam. Estes dois relatos – o de Staden e o de Caminha - dizem muito a
respeito do estranhamento eurocêntrico da descoberta das Américas. “Ali por
então não houve mais fala nem entendimento com eles, por a barberia [barbárie]
deles ser tamanha que se não entendia nem ouvia ninguém” (Folha 3 da carta
de Pero Vaz de Caminha). Mas esse estranhamento segue lógicas diferenciadas:
Hans Staden ficou preso em uma tribo de antropófagos, vendo-os em suas
cerimônias comer a carne humana assada; Pero Vaz de Caminha viu os índios a
partir de um escopo mais naturalista, menos amedrontador, embora ambos os
tratassem em formas subjugadas, de acordo com a mentalidade da época. Para
Staden há formidável justificativa para tanto: a eminência de ser devorado.
A narrativa de um alemão
Hans Staden era um mercenário alemão que empreendeu
duas viagens ao Brasil – a primeira em 1548, passando por Pernambuco e Paraíba,
e a segunda em 1550, passando ela ilha Santa Catarina, dirigindo-se,
posteriormente, a capitania de São Vicente, atual Estado de São Paulo. Suas
rotas consistiram em séries incríveis de naufrágios e motins, até ser capturado
pelos indígenas. Permaneceu nove meses com eles, sempre na eminência de ser
comido. Seu relato é premido de receio e assombro, sempre se referindo aos
índios enquanto selvagens. Entretanto, é num navio francês que Staden volta à
Europa, antes, claro, de barganhar inteligentemente sua liberdade junto aos
índios Tupinambás. O livro é um relato surpreendente, sem demasiada amplitude
científica, e com vários intertítulos ilustrando os vários capítulos: “Como
comeram Jerônimo, o segundo dos dois cristãos assados; Como os selvagens foram
à guerra e me levaram com eles, e o quê ocorreu durante a expedição”. Há
ainda fascinantes xilogravuras como ilustrações do tempo de cativeiro de Hans
Staden. Essas obras foram feitos por ele ou, quando muito, sobre sua
supervisão. A esclarecedora introdução de Eduardo Bueno que figura na obra da
L&PM traz ainda diversas informações valiosas para a maior compreensão,
dentre elas à relação da obra com a ocasião do seu lançamento na Europa. A
recepção do texto de Staden no antigo continente atingiu escalas formidáveis,
sendo traduzido para o Latim, Holandês, Flamengo, Inglês e Francês, e, já no
século XVIII contava com 70 edições. Teria ela influenciado sobremaneira o
movimento modernista de 1922 em sua acepção antropofágica. A obra teria sido
apresentada a Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral e Raul Bopp por Paulo Prado,
sobrinho do milionário Eduardo Prado, que havia adquirido um exemplar original
em um antiquário parisiense. O quadro Abaporu de Tarsila (em
tupi-guarani comedor de gente) tem inspiração no então relato antropofágico.
Até mesmo o Cinema Novo, sob direção de Nelson Pereira dos Santos, compôs uma
obra cinematográfica inspirada no relato de Staden: o filme de 1971
chamado Como Era Gostoso meu Francês, filmado na mesma Ubatuba que
Hans Staden se viu aprisionado há quase 500 anos atrás. Existe, entretanto, uma
obra cinematográfica mais recente, lançada no ano de 1999, do diretor Luís
Alberto Pereira, chamada Hans Staden.
Cândido Portinari e Monteiro Lobato também nutriram
admiração pelo relato do alemão, compondo a partir dele obras que refiguraram a
narrativa nos respectivos modos dos artistas; nas artes plásticas e na
literatura. O primeiro título da obra, de notável extensão, era:História
verídica e descrição de uma terra de selvagens, nus e cruéis comedores de seres
humanos, situada no Novo Mundo da América, desconhecida antes e depois de Jesus
Cristo nas terras de Hessen até os dois últimos anos, visto que Hans Staden, de
Homberg, em Hessen, a conheceu por experiência própria, e que agora traz a
público com esta impressão. Como Staden não era intimamente ligado às
letras, pediu ao Dr. Johannes Dryander, professor catedrático de medicina na
Universidade de Marburgo para rever, corrigir e, quando necessário, aperfeiçoar
o original. Este era doutor dedicado à matemática e à cosmografia, sendo ele
extremamente preocupado em relatar a verdade, evocando, inclusive, à linhagem
paterna de Staden – a qual conhecia – para auferir idoneidade.
A narrativa de um português
Por detrás de qualquer relato de viagem que remonte
centenas de anos, existe (ou ao menos deveria existir) um estudo filológico
direcionado ao discernimento das nuances idiomáticas da cada época enunciada.
As minúcias de uma língua arcaica podem dizer muitas sobre a sociedade que a
usava; é o caso da Carta de Pero Vaz de Caminha. Na edição da carta da Martin
Claret, o prefácio de Jaime Cortesão toca justo nesse tema, evocando qualidades
do escrito que escancaram processos históricos valiosos. É o relato de Caminha
o documento inaugural do Brasil colônia, repleto de um tom polido, mesmo que
ainda perplexo. A carta foi endereçada ao então rei de Portugal, D. Manuel I, e
nela os índios são vistos por Caminha de maneira bem diversa da ótica de Hans
Staden: São tidos como seres puros propensos à catequização: “(...) não
duvido que eles [os índios], segundo a santa intenção de Vossa Alteza, se hão
de fazer cristãos e crer em nossa santa fé, à qual praza o Nosso Senhor que os
traga, porque, certo, esta gente é boa e de boa simplicidade” (Folha 11 da
carta de Pero Vaz de Caminha). O contato primeiro na costa brasileira, para os
portugueses, foi, portanto, um afável escambo. Os índios ganharam uma série de
presentes e os lusitanos uma graúda porção de terra. Foi realizada ainda uma
cerimônia religiosa na costa, com direito a cruz e participação indígena que,
como consta na carta, empoleirava-se a margem da praia em grupos cada vez mais
volumosos (grupos de centenas de índios iam ver a chegada lusa).
Correr sobre os dois relatos é perceber, por exemplo,
a polivalência dos pontos de vista. É certo que o olhar eurocêntrico cristão
imperou sobre as narrativas de viagem desta época; a Europa estava fundada
sobre a hegemonia da Igreja Católica; e isso se nota fortemente. Agora, a
recepção dos índios aos europeus nem sempre foi à mesma. Ler sobre essas
histórias é, assim, uma digressão ao passado de nós mesmos, aos nossos
processos de formação. Mas o estranhamento dos povos estrangeiros é certamente tão
forte quanto sua recíproca. Ambos os livros
estão disponíveis em versões acessíveis. O livro de Hans Staden foi reimpresso
pela editora L&PM Pocket a um preço de R$ 13 e a carta de
Caminha pode ser lida na íntegra no excelente site da Universidade Federal de
Santa Catarina (UFSC) http://www.cce.ufsc.br/~nupill/literatura/carta.html,
mesmo que sem o prefácio de Jaime Cortesão.
Do portal:
http://jornalplasticobolha.blogspot.com.
Duas viagens ao Brasil – Hans Staden
- O autor foi prisioneiro de índios antropófagos.
- O local de prisão do autor é onde hoje se localiza a cidade de Ubatuba,
em São Paulo.
- Há o relato de índios que estavam casados com até 14 mulheres.
- Os casamentos entre os índios são tratados ainda quando crianças.
- Há o relato detalhado de um ritual antropófago.
A Literatura
Catequética
Principais escritores jesuítas:
1-
Padre Manoel da Nóbrega
(1517-Minho-PT-1570 – Rio de Janeiro)
- Considerado o iniciador de nossa literatura.
Missionário jesuíta português, Padre
Manuel da Nóbrega nasceu em 1517 e morreu no Rio de Janeiro em 1570. Se hoje já
se tem visão crítica do que significou o dito "descobrimento" do
Brasil e o concomitante processo "civilizatório" dos povos que
habitavam essa terra, fatos que se tornam bárbaros aos olhos modernos, não se
pode negar que os textos produzidos naquela época são o melhor testemunho não
apenas dos eventos que deram origem ao que, no futuro, se tornaria o estado
brasileiro, mas que, principalmente, revelam o pensamento político e religioso
que estava na base de todo o colonialismo. Os escritos do Padre Manuel da
Nóbrega formam um marco literário genuinamente produzido no Brasil. Nas cartas
de Nóbrega encontra-se o início da história do povo brasileiro, dentro, é
claro, do ponto de vista de um catequizador. Está ali, por exemplo, a luta
entre cristãos e índios: os primeiros consideravam os segundos como "um
papel branco" onde se podia escrever "as virtudes mais
necessárias". Ainda que Nóbrega não tenha a estatura lírica de José de
Anchieta, seu ‘Diálogo sobre a conversão do gentio’, primeiro texto em prosa escrito
no Brasil, tem grande valor literário.
Diálogos sobre a conversão do gentio
- Primeiro texto de valor literário escrito em solo brasileiro.
- É o diálogo entre Gonçalo Alves e Nogueira sobre a conversão dos índios
ao cristianismo.
- Há discussões em torno da não escravidão indígena.
- O texto prega a idéia de igualdade entre todos, a partir da
evangelização.
Carta ao padre mestre Simão
Rodrigues de Azevedo – Manuel da Nóbrega
- Escrito logo após a chegada dos padres jesuítas à Bahia.
- Relata a situação problemática em torno dos habitantes cristãos que não
confessavam há anos.
- Registra que a nudez dos índios não era o principal problema, mas a
convivência de cristãos com muitas esposas, dando maus exemplos aos nativos.
2 – José de Anchieta
(1534- São Cristóvão de La
Laguña – Tenerife – nas Ilhas Canárias – 1597 – Reritiba – hoje Anchieta – no
Espírito Santo)
· É o nosso principal nome desse período.
· Chegou ao Brasil em 1553.
· É o fundador da cidade de São Paulo.
· Fez poesia lírica, épica, peças de teatro (é considerado o fundador do
teatro no Brasil) e uma gramática em língua tupi.
· Toda sua produção literária foi destinada à catequese dos índios.
Nasceu na ilha de Tenerife, uma das ilhas Canárias
dominadas pela Espanha no final do século XV, a 19 de março de 1534, dia de São
José, motivo de seu nome. Filho de próspera família, tendo por pais Juan de
Anchieta e Mência de Clavijo y Llarena, teve a oportunidade de estudar desde a
mais tenra idade, provavelmente com os dominicanos. Aos quatorze anos iniciou
seus estudos em Coimbra, no renomado Colégio de Artes, orgulho do rei Dom João
III.
Lá recebeu uma educação renascentista, principalmente
filológica e literária.
Com 17 anos de idade ingressou na Companhia de Jesus,
ordem fundada por Inácio de Loyola em 1539 e aprovada por meio da bula Regimini
Militantis Eclesiae em 1540, pelo papa Paulo III. No ano de 1553, no final de
seu noviciado, fez seus primeiros votos como jesuíta. Assim, acabavam seus
temores de não poder permanecer na Ordem por ter sido acometido de uma doença
ósteo-articular logo após seu ingresso.
Aconselhado pelos médicos de que os ares do Novo Mundo
seriam benéficos para sua recuperação, foi enviado em missão para o domínio
português na América.
Veio ao Brasil com a segunda leva de jesuítas, junto
com a esquadra de Duarte da Costa, segundo governador-geral do Brasil. Em 1554
participou da fundação do colégio da vila de São Paulo de Piratininga, núcleo
da futura cidade que receberia o nome de São Paulo, onde também foi professor.
Exerceu o cargo de provincial entre os anos de 1577 a 1587.
Escreveu cartas, sermões, poesias, a gramática da
língua mais falada na costa brasileira (o tupi) e peças de teatro, tendo sido o
representante do Teatro Jesuítico no Brasil.
Sua obra pode ser considerada como a primeira
manifestação literária em terras brasileiras. Contribuiu, dessa maneira, para a
formação do que viria a ser a cultura brasileira.
De toda a sua obra, destacam-se a Gramática da língua
mais falada na costa do Brasil, De Gestis Mendi de Saa, Poema da Bem-aventurada
Virgem Maria, Mãe de Deus, Teatro de Anchieta e Cartas de Anchieta.
A coleção de Obras Completas do Pe. José de Anchieta é
dividida sob três temáticas: poesia, prosa e obras sobre Anchieta; a publicação
prevê um total de 17 volumes.
José de Anchieta faleceu na cidade de Reritiba (atual
Anchieta) na Capitania do Espírito Santo, em 9 de junho de 1597. Graças ao seu
papel ativo no primeiro século de colonização do Brasil, José de Anchieta
ganhou vários títulos, tais como: “apóstolo do Novo Mundo”, “fundador da cidade
de São Paulo”, “curador de almas e corpos”, “carismático”, “santo”, entre
outros.
Das suas contribuições culturais para o nosso país,
podemos citar as poesias em verso medieval (destaque: Poema à Virgem), os que
misturavam características religiosas e indigenas, a primeira gramática do
tupi-guarani (a cartilha dos nativos), além da fundação de um colégio.
De acordo com o crítico Eduardo Portella, o trabalho
de José de Anchieta deve ser entendido como uma manifestação da cultura medieval
no Brasil, por conta de sua poesia simples e didática, da métrica e do ritmo
por ele usados.
Além de Auto da Pregação Universal, Anchieta é
considerado como sendo o autor de Na Festa de São Lourenço, também chamada de
Mistério de Jesus e de outros autos.
Fonte: www.sampa.art.br
Textos:
A Santa Inês
José de
Anchieta
Cordeirinha linda,
como folga o povo
porque vossa vinda
lhe dá lume novo.
Cordeirinha santa
de Jesus querida
vossa santa vinda
o diabo espanta.
Por isso vos canta,
com prazer, o povo
porque vossa vinda
lhe dá lume novo.
Nossa culpa escura
fugirá depressa
pois vossa cabeça
vem com luz tão pura
Vossa formosura
honra é do povo
porque vossa vinda
lhe dá nume novo.
Poema
à Virgem
Compaixão
da Virgem na morte do filho
Por
que ao profundo sono, alma, tu te abandonas,
e em pesado dormir, tão fundo assim ressonas?
Não te move a aflição dessa mãe toda em pranto,
que a morte tão cruel do filho chora tanto?
O seio que de dor amargado esmorece,
ao ver, ali presente, as chagas que padece?
Onde a vista pousar, tudo o que é de Jesus,
ocorre ao teu olhar vertendo sangue a flux.
Olha como, prostrado ante a face do Pai,
todo o sangue em suor do corpo se lhe esvai.
Olha como a ladrão essas bárbaras hordas
pisam-no e lhe retêm o colo e mãos com cordas.
Olha, perante Anás, como duro soldado
o esbofeteia mau, com punho bem cerrado.
Vê como, ante Caifás, em humildes meneios,
agüenta opróbrios mil, punhos, escarros feios.
Não afasta seu rosto ao que o bate, e se abeira
do que duro lhe arranca a barba e cabeleira.
Olha com que azorrague o carrasco sombrio
retalha do Senhor a meiga carne a frio.
Olha como lhe rasga a cerviz rijo espinho,
e o sangue puro risca a face toda arminho.
Pois não vês que seu corpo, incivilmente leso,
mal susterá ao ombro o desumano peso?
Vê como a dextra má finca em lenho de escravo
as inocentes mãos com aguçado cravo.
Olha como na cruz finca a mão do algoz cego
os inocentes pés com aguçado prego.
Ei-lo, rasgado jaz nesse tronco inimigo,
e c'o sangue a escorrer paga teu furto antigo!
e em pesado dormir, tão fundo assim ressonas?
Não te move a aflição dessa mãe toda em pranto,
que a morte tão cruel do filho chora tanto?
O seio que de dor amargado esmorece,
ao ver, ali presente, as chagas que padece?
Onde a vista pousar, tudo o que é de Jesus,
ocorre ao teu olhar vertendo sangue a flux.
Olha como, prostrado ante a face do Pai,
todo o sangue em suor do corpo se lhe esvai.
Olha como a ladrão essas bárbaras hordas
pisam-no e lhe retêm o colo e mãos com cordas.
Olha, perante Anás, como duro soldado
o esbofeteia mau, com punho bem cerrado.
Vê como, ante Caifás, em humildes meneios,
agüenta opróbrios mil, punhos, escarros feios.
Não afasta seu rosto ao que o bate, e se abeira
do que duro lhe arranca a barba e cabeleira.
Olha com que azorrague o carrasco sombrio
retalha do Senhor a meiga carne a frio.
Olha como lhe rasga a cerviz rijo espinho,
e o sangue puro risca a face toda arminho.
Pois não vês que seu corpo, incivilmente leso,
mal susterá ao ombro o desumano peso?
Vê como a dextra má finca em lenho de escravo
as inocentes mãos com aguçado cravo.
Olha como na cruz finca a mão do algoz cego
os inocentes pés com aguçado prego.
Ei-lo, rasgado jaz nesse tronco inimigo,
e c'o sangue a escorrer paga teu furto antigo!
(...)
A Santa Inês – José de Anchieta
- São poemas de conteúdo bíblico, dedicados à Santa Inês - mártir da Igreja Católica no século IV,
decapitada por se negar a perder a virgindade.
- Os versos são redondilhos e recebe influências populares medievais.
Carta ao Padre Geral – 01.06.1560 – José de Anchieta
- A importância da carta reside nos detalhes sobre a o trabalho intenso
de evangelização feito pelos Jesuítas.
- Indica que os padres também cuidavam do tratamento de doenças dos
índios.
- Percebe-se que muitos nativos não aceitavam as idéias cristãs.
- Registra a prática do aborto e difusão do câncer uterino entre as
índias.