MARIA CRISTINA FRIAS – da Folha
de São Paulo
A proposta do MEC (Ministério da
Educação) de agrupar as 13 matérias do ensino médio em quatro áreas pode ser
válida, mas demanda apoio e reciclagem de professores. A opinião é da
professora norte-americana Deborah Stipek, ex-reitora da Escola de Educação de
Stanford.
"No mundo real, humanidades
e ciências são interconectadas. Um currículo integrado permite a professores
organizar o ensino em torno de debates grandes e significativos, o que pode ser
mais motivador para estudantes."
Debora Stipek |
O tema da motivação é uma das
especialidades de Stipek, que escreveu, entre outros estudos acadêmicos, o
livro "Motivation to Learn: Integrating Theory and Practice"
("Motivação para Aprender: Integrando Teoria e Prática", ed. Allyn and
Bacon). "Alunos perdem motivação na escola porque não são mais donos de
suas próprias atividades como quando pequenos -fazem agora o que mandam",
diz ela. "Muitas tarefas são frustrantes ou enfadonhas. Em escolas que têm
ensino mais individualizado e enfatizam a aprendizagem pessoal, tende a não
diminuir tanto." Outro objeto de estudos de Stipek é a faixa pré-escolar.
A criança deve ir para a escola o
quanto antes? "Crianças de um e dois anos de idade não vão à pré-escola
nos Estados Unidos. A evidência de benefícios no longo prazo é muito forte para
o início de alguma escolarização aos quatro anos. Aos três, é mais fraca",
afirma. A seguir trechos da entrevista da ex-reitora que participa hoje do 1º
Seminário Internacional do Centro Lemann para o Empreendedorismo e a Inovação
na Educação Brasileira, em São Paulo.
FUSÃO DE MATÉRIAS
É difícil julgar o projeto [do
MEC] sem conhecer os detalhes. Há um valor razoável em um ensino mais
integrado. A eficácia de uma mudança como essa dependerá do apoio que
professores terão. Vão necessitar de oportunidades para ensinar em equipes e
vão precisar de novo treinamento.
EXEMPLOS NO MUNDO
Esse modelo foi experimentado nos
EUA. Por exemplo, alguns estudantes têm o que chamado "horário em
bloco", como humanidades (principalmente história e literatura) durante
uma metade do dia, e matemática e ciências, na outra metade. Em geral, química,
biologia e física são ensinados em anos diferentes, mas muitos estudantes têm
um ano de curso de ciências integrado. Se os professores não conhecem um tópico
que deveriam ensinar (por exemplo, o de química dar biologia e física no ensino
integrado), o melhor é ter um professor "equipe". Nesse caso, três
professores de ciências planejam lições juntos. Um pode dar a parte que é mais
de química, por exemplo. É importante não pedir a um professor ensinar o que
não sabe. Quando qualquer mudança é feita na organização do ensino, professores
têm de ser treinados de novo. Eles precisam de desenvolvimento profissional, o
que inclui apoio e orientação.
Quando colocar na escola?
Temos muito mais evidência de
benefícios no longo prazo para quatro anos de idade do que para três anos. O
que se encontrou é que começar um ano antes, aos três, pouco acrescenta. Crianças
com um ou dois anos não vão à escola nos EUA. Se eles estiverem em um tipo de
"home care fora de casa", é para que os pais possam trabalhar.
PERDA DE MOTIVAÇÃO
Quando pequenas, as crianças são
donas de seu próprio aprendizado. Elas escolhem atividades que lhes interessam
e, se têm dificuldades, podem mudar sem problemas. Na fase escolar, as tarefas
são muitas vezes difíceis (e, por isso, frustrantes) ou muito fáceis (e, então,
enfadonhas). As crianças passam a ser avaliadas. E algumas crianças sentem não
só frustração, mas fracasso. Isso faz o entusiasmo por aprender diminuir. Mas
tenho visto escolas que enfatizam aprendizado pessoal e avaliam de forma que
todas as crianças experimentem sucesso independentemente de nível em relação
aos colegas.
TECNOLOGIA PARA PEQUENOS
Crianças pequenas aprendem com os
sentidos e pelo envolvimento em atividades. Uma boa parte do tempo delas
deveria ser gasto interagindo com pessoas e objetos. Mas tecnologia pode ser
incluída em um programa educacional por breves períodos de tempo. Professores
que a usam precisam ter clareza quanto ao seu objetivo pedagógico (em vez de apenas
manter crianças ocupadas).
DESTINO DE VERBA PÚBLICA
Se tivesse de escolher entre
alocar verba pública para treinamento de professores e investimento em
tecnologia nas escolas, colocaria mais recursos no desenvolvimento profissional
dos docentes. A evidência de pesquisa é muito clara: a qualidade do ensino é o
fator mais importante no desenvolvimento de crianças. Tecnologia pode ser um
instrumento importante, mas como professores a usam é mais importante do que a
própria tecnologia.
ROTINA NA ESCOLA
Ficar sentado muito tempo
preenchendo apostilas e folhas não é apropriado e é uma boa forma de desviar
crianças da escola. Professores eficientes criam oportunidades de aprendizado
em atividades do brincar, como aprender medidas ao fazer biscoitos e a contar
enquanto encenam histórias. Bons professores criam atividades de aprendizado
que estimulam o interesse das crianças e são percebidas como brincadeiras, mas
têm objetivos claros.