Renato Nunes Bittencourt – da Revista
FILOSOFIA Ciência & Vida – edição nº 78.
Como o estudante da era
pós-moderna não é exigido academicamente por sua instituição, ele acaba por
perder qualquer parâmetro avaliativo em sua intelectualidade, enfraquecendo a
sua capacidade de pensar, tornando-se um indivíduo alienado em um espaço
cultural que deveria justamente promover o progresso da sociedade em suas
expressões intelectuais, econômicas e materiais. Saber é uma atribuição
adquirida pelo estudo e impossível de ser comprado. Mas, com os poderes
instituídos do capitalismo, aliado às instituições meramente mercadológicas, a
sociedade reproduz a "ilusão do saber", algo corroborado pela crise
da família.
A Educação passa a assumir a forma de "valor", de algo que pode ser vendido, quando na verdade o que se compra é o diploma, e não o conhecimento. |
Nos tempos do capitalismo tardio,
o sonho pessoal de se formar em um curso universitário se tornou uma
possibilidade franqueada a todo indivíduo capaz de pagar a mensalidade de uma
instituição de ensino; inúmeras facilidades são oferecidas, de modo a se
agregar cada vez mais estudantes nos quadros universitários. Em princípio, tal
mudança de paradigmas seria algo culturalmente excelente, pois mais indivíduos
poderiam se especializar profissionalmente e assim favorecer o desenvolvimento
social. Todavia, grande parte das mudanças de paradigmas acerca da
flexibilização do acesso ao ensino superior ocorre por questões meramente
mercadológicas, pois corporações empresariais, camufladas socialmente como
instituições de ensino, e que fizeram do sistema de ensino um mercado
extremamente lucrativo, um grande negócio movimentador da economia atual.
No mundo pós-moderno, qualquer
pessoa agora pode ter seu diploma, desde que possa pagar pela obtenção do
mesmo. Tal como destaca com precisão o sublime filósofo e educador Paulo Freire
(1921- 1997), no contexto dessa realidade educacional norteada pelo primado
economicista: "O dinheiro é a medida de todas as coisas, e o lucro, seu
objeto principal"¹.
¹ FREIRE, Pedagogia do oprimido, p. 51.
No atual sistema de ensino, criar dificuldades para o aluno significa perder dinheiro. Por isso, os alunos deixaram de conviver com o fantasma da reprovação. |
A estrutura educacional
brasileira está cada vez mais permissiva; o excesso de flexibilidade nos
processos de avaliação do ensino básico favorece o desenvolvimento consentido
de analfabetos funcionais, indivíduos incapazes de compreender o sentido de
textos intelectualmente mais refinados, assim como de expressarem suas próprias
ideias de forma clara e consistente em escritos.
Uma vez ingresso nessa
instituição mantenedora da ideologia da "vida academicamente fácil",
o estudante tende a se considerar para além de qualquer sistema de avaliação,
"para além do bem e do mal", pois a própria instituição educacional
capitaneia meios para que haja o mínimo índice de reprovação nas disciplinas
ofertadas no decorrer da trajetória da graduação. O comunicólogo e escritor
brasileiro Felipe Pena formula o valioso juízo crítico acerca das instituições
universitárias comercialistas: "Nenhuma dessas recusava clientes, como
eram chamados os alunos. Criar dificuldades para o acesso significava perder
dinheiro. Qualquer um passava por provas de múltipla escolha, mesmo que errasse
todas as questões. Para esses casos raros, havia uma segunda chance, feita
rapidamente, antes que o cliente optasse por um concorrente"².
² PENA, Fábrica de diplomas, p. 55.
O filósofo francês Jean-François Lyotard criticou o sistema comercialista do ensino e diz que o saber deve estar, necessariamente, associado à formação do espírito. |
O estudante da instituição de
ensino "comerciária" é tratado como um cliente de empresa que sempre
está com a razão, portanto, ele não pode de modo algum ser reprovado pelo
professor, caso contrário o estudante-cliente procurará outra instituição
universitária para seguir a sua frágil trajetória acadêmica eivada de
resultados intelectuais pífios. O filósofo francês Jean-François Lyotard
(1924-1998) é categórico ao criticar o dispositivo comercialista do ensino:
"O antigo princípio segundo o qual a aquisição do saber é indissociável da
formação (bildung) do espírito, e mesmo da pessoa, cai e cairá cada vez mais em
desuso. Essa relação entre fornecedores e usuários do conhecimento e o próprio
conhecimento tende e tenderá a assumir a forma que os produtores e os
consumidores de mercadorias têm com estas últimas, ou seja, a forma valor. O
saber é e será produzido para ser vendido, e ele é e será consumido para ser
valorizado numa nova produção: nos dois casos, para ser trocado. Ele deixa de
ser para si mesmo seu próprio fim; perde o seu valor de uso"³.
³ LYOTARD, A condição pós-moderna, p. 45.
Quando ocorre uma reprovação, a
culpa é do professor, quando o aluno não compreende o conteúdo da disciplina, a
culpa é do professor, e assim sucessivamente, circunstância que evidencia o
espírito de ressentimento entranhado nessa tipologia estudantil. No sistema
comercialista de ensino, o professor é vítima constante de assédio moral e
pressões institucionais para que possa satisfazer incondicionalmente os
caprichos infantis dos alunos, cada vez mais narcotizados pela infame lógica
monetária do "pagou, passou". De acordo com o crítico social
estadunidense Christopher Lasch (1932-1994), "a expansão da Educação, que
tinha por objetivo tornar as massas mais críticas com relação à autoridade
estabelecida, encorajou um certo cinismo diante das declarações oficiais, mas
também transformou as massas em ávidas consumidoras da publicidade e da
propaganda, que a deixaram em um estado crônico de insatisfação e
incerteza"4. O professor se tornou o inimigo das mentalidades obtusas.
Cada vez mais são constantes casos em que alunos descarregam as suas
frustrações existenciais nos professores, por meio de injúrias ou mesmo
agressões físicas, sem que medidas corretivas adequadas sejam adotadas para
proporcionar o estabelecimento do respeito para com a classe docente.
4 LASCH, Refúgio num mundo sem coração, p. 215.
O espaço educacional, que deveria
promover o progresso do saber e a conscientização cidadã dos indivíduos, se
converte em um local de conflito e exclusão. Talvez a crise da organização
familiar seja uma das possíveis causas para a degradação do tecido social e sua
inerente manifestação na conturbada realidade estudantil da contemporaneidade.
Os valores morais e o senso de cidadania devem ser ensinados em especial pela
família, cabendo a um estabelecimento de ensino transmitir os conteúdos
pedagógicos de cada disciplina e reforçar, mediante a convivência pública
cotidiana, a consciência cidadã. A estrutura familiar tradicional não é mais capaz
de promover em seus jovens o desenvolvimento rigoroso do respeito, do senso de
responsabilidade, da autonomia, postulando-se para os professores tal papel que
caberia aos pais, alienados das suas funções basilares. O filósofo francês
Gilles Lipovetsky (1944) salienta que "os pais, negligentemente,
descarregam a própria culpa nos professores; não fiscalizam o comportamento dos
filhos, cada vez mais embrutecidos diante da televisão; e não são mais capazes
de incutir respeito"5.
5 LIPOVETSKY, A sociedade pós-moralista, p. 143.
O ritmo vertiginoso do sistema de
trabalho em nossa sociedade capitalista e o despreparo familiar impedem que os
filhos recebam a educação conveniente em seus lares, de modo que os pais
projetam para a instituição escolar a responsabilidade pela educação total dos
filhos, imiscuindo-se de seu dever primordial. Nessas condições, cabe ao
docente a tarefa de inculcar nos estudantes valores que concerniam aos
estamentos familiares. Conforme argumenta a comunicóloga Paula Sibilia, "o
desabamento das antigas hierarquias no seio familiar e escolar, essa
indistinção gradual entre os papéis de pais e filhos ou professores e alunos, é
sem dúvida um aspecto importante na dissolução das etapas da vida organizada
pela modernidade"6.
6 SIBILIA, Redes ou paredes, p. 111.
Não se trata de defender a
retomada do ideário da autoridade absoluta do professor, pois tal dispositivo
se caracteriza como supressor de toda capacidade de diálogo entre docente e
discente, mas sim de se revalorizar a figura do professor em uma dinâmica
social, cultural, política e econômica pautada pela desvalorização de todo pensamento
crítico e emancipador.
O clientelismo economicista é,
sem dúvida, potencialmente sedutor sobre as individualidades ávidas pelo
consumo fácil e todo o prazer efêmero daí resultante. Para a crítica literária
argentina Beatriz Sarlo (1942), "quando a administração educacional perde
poder e recursos, os grandes ministros da Educação são, na verdade, os gerentes
e programadores do mercado, cujos valores não incentivam o surgimento de uma
sociedade de cidadãos iguais e sim o de uma rede de consumidores fiéis"7.
7 SARLO, Tempo presente, p. 101-102.
NO BRASIL, mais de 25% da população entre
15 e 64 anos são analfabetos funcionais,
segundo levantamento do Indicador de
Alfabetismo Funcional (Inaf). Em relação
aos estudantes de nível superior, o Inaf
aponta que 38% não dominam habilidades
básicas de leitura e escrita, o que reflete o
expressivo crescimento de universidades
de baixa qualidade
Contra todas as ideologias
comerciárias do ensino, eis a pertinência do pensamento de Karl Marx
(1818-1883), cuja perspicácia desagrada as mentalidades obtusas dos compradores
de diplomas e sua inerente corrupção educacional: "Sou feio, mas posso
comprar para mim a mais bela mulher. Portanto, não sou feio, pois o efeito da
fealdade, sua força repelente, é anulado pelo dinheiro"8. Poderíamos
reescrever o texto da seguinte maneira: "Sou um analfabeto funcional,
intelectualmente inepto, mas posso comprar para mim o mais belo diploma, marcado
com o carimbo da lama. Portanto, minha nulidade existencial é anulada pelo
poder do dinheiro, logo sou inteligente e um bom administrador da minha vida e
dos meus negócios".
8 MARX, Manuscritos econômico-filosóficos, p. 154.
Ao invés de favorecermos o
desenvolvimento de uma sociedade democrática regida pela criticidade,
transformamos a massa humana em um rebanho de consumidores felizes, pois que
plenamente "integrados" aos ditames do sistema capitalista,
gerando-se, assim, a redução intelectual do estudante ao estado de infantilismo
narcísico, como uma criança que tudo quer instantaneamente. Paula Sibilia
aponta que "na oferta educacional contemporânea busca-se oferecer um
serviço adequado a cada perfil de público, proporcionando-lhe recursos para que
cada um possa triunfar nas árduas disputas de mercado. Isso não é para todos,
como a lei, mas tem uma distribuição desigual como o dinheiro: todos os
consumidores querem ser distintos e únicos, singulares, capazes de competir com
os demais para se destacar com suas vantagens diferenciadas, num mundo globalizado
no qual impera um capitalismo cada vez mais jovial, embora também feroz"9.
9 SIBILIA, Redes ou paredes, p. 132.
LEVANTAMENTO realizado em dezembro de 2012
pelo Ministério da Educação detectou que 27% dos
cursos superiores do pais tiveram notas 1 e 2,
em uma escala que vai até cinco. Das 2.136
instituições avaliadas, nove receberam a nota 1
e 536, nota 2. Somente 27 alcançaram a
avaliação máxima em que 15 são
públicas e 12 particulares
Como o estudante da era
pós-moderna não é exigido academicamente por sua instituição, ele acaba por
perder qualquer parâmetro avaliativo em sua intelectualidade, enfraquecendo a
sua capacidade de pensar, tornando-se um indivíduo alienado em um espaço
cultural que deveria justamente promover o progresso da sociedade em suas
expressões intelectuais, econômicas e materiais. Eis a derrocada do projeto iluminista
e da sua proposta de emancipação do homem perante toda forma de dominação
externa como a formulada por Kant (1724-1804): "Esclarecimento
[Aufklärung] é a saída do homem de sua menoridade, da qual ele próprio é
culpado. A menoridade é a incapacidade de fazer uso de seu entendimento sem a
direção de outro indivíduo. O homem é o próprio culpado dessa menoridade se a
causa dele não se encontra na falta de entendimento, mas na falta de decisão e
coragem de servir- se de si mesmo sem a direção de outrem. Sapere Aude! Tem
coragem de fazer uso de teu próprio entendimento, tal é o lema do Esclarecimento
[Aufklärung]"10.
10 KANT, "Resposta à pergunta: que é Esclarecimento?" In: Textos seletos, p. 63-64.
O ensino universitário privado
adepto da lógica comercialista tende, assim, a prejudicar o amadurecimento
existencial do estudante, pois este, bestificado pela permissividade dos seus
progenitores e preservado pela lógica bonachona do capital, perde todo senso de
responsabilidade perante o mundo, tornando-se, então, incapaz de se
responsabilizar por seus atos estúpidos. Adorno e Horkheimer, ao descreverem a
sociedade administrada capitalista veiculadora da Indústria Cultural, destacam
que "quanto mais a realidade social se afastava da consciência cultivada,
tanto mais esta se via submetida a um processo de reificação. A Cultura
converteu-se totalmente numa mercadoria difundida como uma informação, sem
penetrar nos indivíduos dela informados. O pensamento perde o fôlego e
limita-se à apreensão do fatual isolado. Rejeitam-se as relações conceituais
porque são um esforço incômodo e inútil"11.
11 ADORNO e HORKHEIMER, Dialética do Esclarecimento, p. 184.
Percebemos o contínuo
empobrecimento da linguagem no processo de formação dos estudantes egressos das
instituições acadêmicas regidas pela lógica do capital, de modo que essa massa
discente desconhece grande parte do vocabulário da Língua Portuguesa, considerando
inclusive uma afronta intelectual quando um professor utiliza um conjunto de
palavras alheias ao seu limitado mundo semântico. O ingresso em um curso
universitário exige do aluno uma sofisticação de seu vocabulário, mas a sua
pobreza expressiva situa-se no âmbito das conversas informais cotidianas. Quem
lê pouco, pensa pouco e escreve pouco. Isso não é uma premissa lógica, mas um
processo pedagógico natural. Em tempos de niilismo educacional, não é de se
estranhar quando um estudante do curso de Letras afirma não gostar de ler;
seria o mesmo que um estudante de Filosofia dizer que não gosta de pensar.
Percebemos o desinteresse
massificado pela leitura no sistema comerciário de ensino, pois, de modo geral,
o alunado anseia apenas pelo saber técnico para se tornar um profissional
competente, bem situado no mercado de trabalho, e de modo algum um indivíduo
crítico, pensante, que reflita sobre sua própria atividade profissional.
Conforme indaga o filósofo húngaro István Mészáros (1930), "será o
conhecimento o elemento necessário para transformar em realidade o ideal da
emancipação humana, em conjunto com uma firme determinação e dedicação dos
indivíduos para alcançar, de maneira bem-sucedida, a auto emancipação da
humanidade, apesar de todas as adversidades, ou será, pelo contrário, a adoção
pelos indivíduos, em particular, de modos de comportamento dos objetivos
reificados do capital?"12.
12 MÉSZÁROS, A educação para além do capital, p. 47-48.
A espetacularização da sociedade
requer professores com habilidades histriônicas, capazes de seduzirem mentalidades
embotadas pela série de estímulos sensórios com aulas consideradas mais
agradáveis, isto é, mais dinâmicas conforme a lógica vertiginosa do tempo
corrido da contemporaneidade. O filósofo francês Guy Debord (1931-1994) afirma
que "a consciência espectadora, prisioneira de um universo achatado,
limitado pela tela do espetáculo para trás da qual sua própria vida foi
deportada, só conhece os interlocutores fictícios que a entretêm unicamente com
sua mercadoria e com a política de sua mercadoria"13.
13 DEBORD, A sociedade do espetáculo, p.140.
O professor agora se encontra na
necessidade de competir pela atenção do aluno enfocado em seu celular e outros
apetrechos eletrônicos. O imaginário social infelizmente reforça tal
disposição, exigindo do professor a capacidade de se metamorfosear em um
animador de auditório, com a única diferença que, ao invés de haver a
distribuição de prêmios, se anseia pela distribuição indiscriminada de pontos
para satisfação dos alunos. Para Gilles Lipovetsky, como o espaço público se
esvazia emocionalmente por excesso de informações, de solicitações e de
estímulos, o eu perde suas referências e sua unidade por excesso de atenção; o
eu se tornou um conjunto "imbecil"14.
14 LIPOVETSKY, A Era do Vazio, p. 37.
Uma possível solução para a
ruptura radical com esse modelo educacional nitidamente exploratório da
competência profissional do professor seria a criação de cooperativas
educacionais, nas quais todos os docentes possuiriam estatuto profissional
isonômico na divisão dos lucros advindos pela transmissão do saber aos
discentes. O grande empecilho para a emancipação plena do professor da rede
privada na sociedade capitalista é, justamente, o fato de não possuir os meios
de produção, isto é, a estrutura física da instituição pedagógica; todavia, por
meio da conscientização política da classe docente, da participação em uma rede
colaborativa, esse problema poderia ser razoavelmente sanado.
O professor, hoje, precisa competir pela atenção de seus ouvintes com o telefone celular e outros apetrechos eletrônicos, o que o obriga a ser um "animador de auditório" |
O objetivo central da luta contra
a sociedade mercantilista e sua subsequente alienação cultural em nome da
massificação totalitária da vida humana é a emancipação plena da Educação
desses ditames vulgarmente comercialistas: "Romper com a lógica do capital
na área da Educação equivale, portanto, a substituir as formas onipresentes e
profundamente enraizadas de internalização mistificadora por uma alternativa
concreta abrangente".15 Por conseguinte, a Educação, que poderia ser um
instrumento essencial para a mudança da estrutura excludente do regime
capitalista, torna-se, justamente, instrumento dos seus mais violentos
processos de estigmatização, ao fornecer os "conhecimentos" e o
pessoal necessário para a manutenção da maquinaria produtiva em expansão desse
sistema, gerando, ainda, um sistema ideológico que legitima os interesses
dominantes das grandes corporações empresariais.
15 MÉSZÁROS, A educação para além do capital, p. 47.
Na dimensão opressora do
comercialismo capitalista, a Educação se torna uma mercadoria de grande
rentabilidade, um filão efervescente cuja exploração comercial encontra-se
certamente no seu apogeu. Decorre daí a crise do sistema público de ensino,
pressionado pelas demandas pecuniárias dos especuladores financeiros e dos
empresários educacionais que de modo algum podem aceitar melhorias qualitativas
na dimensão do ensino público: a degradação deste é diretamente proporcional ao
luxo das instituições educacionais privadas; tanto pior, enquanto os
empresários do ensino continuarem ditando as suas regras autoritárias nos
bastidores da Política, essa situação de miséria pedagógica certamente
permanecerá incólume. Não podemos deixar que a flama do saber se converta na
lama da ignorância.
A culpa é de quem?
Na sociedade contemporânea percebe-se a tendência da família fragilizada em suas bases morais transferir a responsabilidade formativa dos jovens para a escola e seus educadores, que ficam assim sobrecarregados em suas funções pedagógicas. Os jovens, cada vez mais infantilizados pela sociedade de consumo, consideram o espaço educacional apenas como um local de lazer, um ponto de encontro social; não se realizam existencialmente em seus estudos cotidianos, considerando a vida estudantil um enfado insuportável. A transformação do estudante em um consumidor que deve ser satisfeito como o cliente preferencial solapa a respeitabilidade pelo professor, imputado como o culpado por todo fracasso pedagógico do estudante desprovido de qualquer senso crítico em sua existência medíocre. De onde a juventude alienada reproduz esse comportamento clientelista? Certamente da sua própria vida domiciliar, graças a inépcia educacional de pais autoritariamente frouxos, preocupados acima de tudo com a manutenção de seu status quo e suas viagens de fim de ano como autogratificação por sua dedicação exaustiva ao mundo do trabalho.
REFERÊNCIAS |
ADORNO, T. e HORKHEIMER, M. Dialética do Esclarecimento: fragmentos filosóficos. Trad. de Guido Antônio de Almeida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985. DEBORD, G. A sociedade do espetáculo - Comentários sobre a sociedade do espetáculo. Trad. de Estela dos Santos Abreu. Rio de Janeiro: Contraponto, 2006. FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980. KANT, I. "Resposta à pergunta: que é Esclarecimento?" In: Textos seletos. Trad. de Raimundo Vier e Floriano de Souza Fernandes, p. 63-71, Petrópolis: Vozes, 2005. LASCH, C. Refúgio num mundo sem coração. A família: santuário ou instituição sitiada? Trad. de Ítalo Tronca e Lúcia Szmrecsanyi. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991. LIPOVETSKY, G. A Era do Vazio - Ensaios sobre o individualismo contemporâneo. Trad. de Theresinha Monteiro Deutsch. Barueri: Manole, 2005. ___________. A sociedade pós-moralista. O crepúsculo do dever e a ética indolor dos novos tempos democráticos. Trad. de Armando Braio Ara. Barueri: Manole, 2005. LYOTARD, J.-F. A condição pós-moderna. Trad. de Ricardo Corrêa Barbosa. Rio de Janeiro: José Olympio, 2002. MARX, K. Manuscritos econômicofilosóficos. Trad. de Jesus Ranieri. São Paulo: Boitempo, 2004. MÉSZÁROS, I. A educação para além do capital. Trad. de Isa Tavares. São Paulo: Boitempo, 2008. PENA, F. Fábrica de diplomas. Rio de Janeiro: Record, 2011. SARLO, B. Tempo presente: notas sobre a mudança de uma cultura. Trad. de Luís Carlos Cabral. Rio de Janeiro: José Olympio, 2005. SIBILIA, P. Redes ou paredes: a escola em tempos de dispersão. Trad. de Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Contraponto, 2012. |