MARINA DELLA VALLE – da Folha de
São Paulo
Os poetas Ted Hughes e Sylvia Plath, recém-casados em 1956 |
O suicídio da poeta
norte-americana Sylvia Plath, aos 30 anos, em 11 de fevereiro de 1963, deu
início a uma questão que acabou por gerar, ao longo dos anos, uma verdadeira
indústria de publicações biográficas: quem era, na verdade, Sylvia Plath? Cinquenta
anos depois, foram tantas disputas e livros sobre a vida e a morte da poeta que
é tempo de mudar a questão ao ler algo sobre ela: Plath era de quem? É o que
sugere um dos lançamentos mais interessantes relacionados com a data:
"Claiming Sylvia Plath" (reivindicando Sylvia Plath, Cambridge
Scholars, 370 págs., US$ 74,99), da norueguesa Marianne Egeland. Professora da
Universidade de Oslo, Egeland analisou as publicações sobre Plath escritas
entre 1960 e 2010 para traçar a recepção da poeta por diferentes grupos de
leitores: feministas, críticos, biógrafos, psicólogos e amigos. Isso porque
poucos autores tiveram vida e legado tão debatidos como Plath. As causas de seu
suicídio, o papel do marido, o poeta inglês Ted Hughes (1930-1998), em sua
morte, e as origens dos poemas vociferantes publicadas em seu livro póstumo,
"Ariel", geraram um turbilhão de análises. Mais que isso: tais
disputas pintaram diferentes figuras da poeta. "Fiquei surpresa não só com
a quantidade de 'Sylvias' contrastantes, mas com o tanto que comentaristas
acreditam que suas versões são as únicas corretas", disse Egeland à Folha.
Um ponto interessante colocado pela autora é que Plath acabou sendo usada como
um argumento pelos diferente segmentos que escreveram sobre ela, moldando sua
figura de acordo com os interesses de cada visão. E é possível, afinal, saber
quem foi a verdadeira Sylvia Plath? "Essa decisão fica ao encargo de cada
leitor. Mas talvez seja prudente lembrar que hoje ela está escondida sob
múltiplas camadas de opiniões e interpretações", afirma Egeland. "Claiming
Plath" não é necessariamente uma leitura fácil, principalmente para
iniciantes no universo da poeta, mas pode ser um bom guia para quem começa, já
que situa --e explica-- as diferentes visões alardeadas como a
"verdadeira" face de Plath. Para Egeland, há mais um efeito desejado:
"Espero que haja um aumento das questões éticas envolvidas na maneira como
ela foi reivindicada por seus leitores".
MUITAS VIDAS
Com os 50 anos da morte de Plath,
era inevitável que surgissem novas biografias, ainda que o assunto pareça
completamente esgotado. A mais completa é "American Isis" (St.
Martin's Press, 336 págs., US$ 29,99), de Carl Rollyson, professor de
jornalismo do Baruch College, da City University de Nova York. Na introdução,
Rollyson compara Plath a outra loura trágica: Marilyn Monroe, também biografada
por ele. A comparação inicial pode soar disparatada, mas Rollyson é um biógrafo
experiente, que busca mostrar diferentes lados de Plath, como sua sexualidade e
o interesse por cultura popular. Assim como Monroe, consagrada como símbolo
sexual, ela buscava leituras como James Joyce. "Quis mostrar que Plath não
era apenas uma ótima poeta, mas era ótima em vários aspectos", diz
Rollyson. Ele é o primeiro biógrafo a utilizar uma série de cartas entre Ted e
sua irmã Olwyn Hughes, liberadas anos após a morte do poeta, em 1998. O autor,
ao jogar novas luzes em uma história revista tantas vezes, não deixa de avaliar
as maneiras como ela foi contada antes. O último capítulo é sobre as biografias
de Plath e suas disparidades. "Sem saber como essas biografias foram
escritas, o leitor fica sem referência." O afã de publicações (que começou
com o relançamento de "Bell Jar", que também completa 50 anos, pela
Faber) não se repetiu no Brasil. Os "Diários de Sylvia Plath",
editados por Karen V. Kukil, ganharam nova edição (trad. de Celso Nogueira,
Globo Livros, 836 págs. R$ 79). "Ariel", em sua versão
"restaurada" (da maneira como a poeta o deixou antes de morrer),
traduzido por Rodrigo Garcia Lopes e Maria Cristina Glenz de Macedo, será
republicado pela Verus neste ano, sem conexão com os 50 anos da morte de Plath.
Assim, o leitor brasileiro fica com a opção de ler o que a própria Plath tinha
a dizer, tanto para si mesmo, no caso dos diários, como para o mundo, no caso
de "Ariel".