RICARDO BONALUME NETO – da Folha
de São Paulo
O colapso da civilização maia,
da América Central, ocorreu devido a uma modesta queda nos níveis de chuva da
região, suficiente para reduzir drasticamente a população durante um declínio
que durou cerca de 200 anos. É o que afirma um novo estudo dos registros
climáticos antigos. Os dados ajudam a entender como o colapso pôde ocorrer
gradualmente, em vez de acontecer de modo dramático e repentino.A nova pesquisa
contraria a hipótese de que a crise dessa civilização teria começado a partir
de uma seca intensa entre os anos 800 e 1000 da Era Cristã.
MISTÉRIO
O declínio da avançada
civilização maia, que tinha uma forma de escrita e produziu grandes monumentos
de pedra, como palácios e pirâmides, sempre foi algo misterioso para os
arqueólogos. Alguns pesquisadores especularam que o colapso poderia ter sido
causado por guerras ou revoltas de camponeses. Outros têm explicações
ecológicas, como a queda da capacidade do ambiente de sustentar uma população
com água e alimento. Martín Medina-Elizalde, do Centro de Investigação
Científica do Yucatán, México, e Eelco Rohling, da Universidade de Southampton,
Reino Unido, publicaram seus achados na edição desta sexta-feira da revista
americana "Science".
QUÍMICA
Eles usaram a análise de
variantes de elementos químicos em sedimentos em lagos da região da península
de Yucatán e em uma estalagmite (formação rochosa criada pelo gotejar de água e
minerais depositados em cavernas). Ambos são fontes importantes de dados sobre
as chuvas e a evaporação ocorridas no passado. Para Rohling, as reduções na
chuva "representam apenas de 25% a 40% na chuva anual. Mas foram grandes o
bastante para a evaporação se tornar dominante sobre a queda de chuva, e a
disponibilidade de água foi rapidamente reduzida. Os dados sugerem que a principal
causa foi uma redução da atividade de tempestades de verão". A falta de
água afetaria tanto o campo quanto as cidades. O verão era a principal estação
para o cultivo. E o armazenamento de água nas cidades também seria afetado.
Secas em anos subsequentes causariam o abandono de centros urbanos. "Apesar
das evidências sugerindo que a mudança climática não explica completamente os
complexos eventos geográficos e sociopolíticos do período do declínio maia,
registros de paleoclima e evidências arqueológicas sugerem que a época foi
pontuada por uma série de eventos de seca, que provavelmente provocaram
significativas rupturas na sociedade", dizem os autores do estudo. Curiosamente,
segundo eles, a redução de chuva teria sido semelhante àquela que poderá ocorrer
na mesma região, de acordo com estudos atuais, por conta do aquecimento global.
Segundo Medina-Elizalde, "há diferenças, mas o alerta é claro. O que
parece ser uma redução menor na disponibilidade de água pode levar a problemas
importantes e duradouros". Outras regiões no mundo com clima parecido
poderão ter problemas semelhantes. "Hoje temos o benefício dessa
consciência e temos de levá-la em conta."